quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

As leis, ora as leis


Sabe-se hoje que partes da Constituição foram enxertadas sem que a Constituinte as aprovasse. A confissão foi feita há algum tempo por Nelson Jobim, autor dos enxertos. Sabe-se hoje que boa parte da Constituição não pode ser aplicada corretamente porque o Congresso Nacional não cuidou de regulamentar o que precisa ser regulamentado. E não é por falta de tempo: para campanhas eleitorais, festas juninas, Carnaval, reuniões de desagravo a criminosos condenados, recesso parlamentar de julho, recesso parlamentar de dezembro, segundas e sextas enforcadas (e as terças já esquecidas), para isso não falta tempo. Agora, iniciamos o ano sem orçamento federal. No lugar, até que o Congresso retorne de suas férias, vai um quebra-galho, um remendo para evitar mais problemas.
O Supremo foi criticadíssimo por exigir que o Congresso cumprisse a lei, analisando os vetos presidenciais pela ordem cronológica. Com isso, inviabilizou-se a tentativa de derrubar o veto da presidente Dilma Rousseff a determinados trechos da lei de distribuição de royalties de petróleo: havia três mil vetos a examinar na frente desse. O presidente do Senado, José Sarney, propôs que os vetos fossem apreciados de baciada, todos de uma vez; mas até no Congresso ficou evidente que isso seria ridículo (e provavelmente cairia nos tribunais).
O Supremo Tribunal Federal, a propósito, também não está isento de culpa: os ministros pedem vista de um processo por determinado número de dias e o devolvem quando querem – até anos depois.
Cheguemos ao nosso tema: os meios de comunicação, aparentemente, acham que esses problemas não são com eles. Ninguém verifica no Supremo se algum processo está emperrado porque alguém está demorando para devolvê-lo, nem verifica no Congresso por que um determinado veto está esquecido, ou pergunta a líderes parlamentares qual o empecilho para que regulamentem artigos da Constituição – que, recorde-se, foi promulgada há 24 anos, tempo suficiente para deixá-la sem qualquer buraco.
O mestre Alberto Dines lembra, neste Observatório, que todos os grandes veículos de comunicação têm repórteres no Congresso, mas repórteres que não fazem a cobertura das atividades cotidianas dos parlamentares. Nem sempre foi assim: quando este colunista foi escalado para cobrir a Assembleia Legislativa de São Paulo, tinha como missão fazer o mesmo que os repórteres congressuais de hoje, acompanhar negociações, tendências, articulações, buscar notícias políticas. Mas havia um repórter – o grande Ricardo Sérgio Mendes, uma fera, mais versado no regimento da Assembleia que qualquer deputado – que fazia uma impecável cobertura do cotidiano. Uma cobertura que incluía, entre outras coisas, a leitura do Diário Oficial, a pesquisa daqueles projetos de lei que incluem, no inciso 7º do parágrafo 4º do artigo 2º da Lei nº 0000000/00, a expressão “não”. É aí que estão as mutretas, e era também aí que o Ricardão acompanhava o andamento do dia a dia legislativo. Como em qualquer assembleia, naquela havia alguns bandidos; e os projetos desses senhores eram examinados com muito carinho.
Custa um pouco mais caro. Mas, se o jornalismo existe para fornecer informação, tem de atender a quem quer informação. Ou limitar-se a discutir fofocas e a insinuar quem dorme com quem.
by blog Observario de Imprensa

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