sábado, 14 de junho de 2025

A Verdade na Era da IA: Como a Desinformação Alimenta um "Ministério da Verdade" Moderno




by  Deise Brandão

Uma história comovente circula há anos na internet: cerca de 200 fazendeiros, em um gesto de solidariedade, teriam ficado em silêncio durante um leilão de terras, permitindo que um jovem, chamado David, recuperasse a fazenda de sua família, perdida em circunstâncias difíceis. A narrativa, que emociona pela demonstração de empatia, é compartilhada em sites, blogs e redes sociais, como o X, onde acumula milhares de curtidas e compartilhamentos.

Mas há um problema: a história, supostamente ocorrida em Nebraska, nos Estados Unidos, não tem registros confiáveis que confirmem sua veracidade, e muito menos que tenha acontecido no Brasil, como alguns posts sugerem. O que parece um conto inspirador pode ser apenas mais um exemplo de como a desinformação se espalha na era digital, alimentando o que muitos temem ser um "Ministério da Verdade" contemporâneo, semelhante ao descrito por George Orwell em 1984.

A força dessas histórias não está nos fatos, mas na carga emocional que carregam — e é justamente isso que as torna tão perigosas quando usadas sem compromisso com a verdade.

A história dos fazendeiros: fato ou ficção?

A narrativa dos 200 fazendeiros aparece em sites como CompreRural (2020), Sabias Palavras (2023) e Jornal Folha Metropolitana (2025), todos apontando que o evento ocorreu em Nebraska, não no Brasil. Segundo o relato, David e seu pai tentavam recuperar uma fazenda de 32 hectares, vendida por um parente com interesses conflitantes. No leilão, os fazendeiros presentes, cientes da história da família, optaram por não dar lances, garantindo que David arrematasse a propriedade.

A história é descrita como um momento de união comunitária, mas carece de detalhes cruciais: o sobrenome de David, a data exata, o local preciso do leilão ou documentos comprobatórios. Discussões no Reddit (r/conspiracy, 2023) sugerem que a história pode ser um conto folclórico, reciclado para gerar engajamento online.

No Brasil, onde leilões de terras são comuns, como os anunciados em sites como Mega Leilões, não há registros de um evento semelhante envolvendo 200 fazendeiros. A repetição da narrativa em blogs e sites sensacionalistas, sem fontes primárias, levanta uma questão: por que uma história tão antiga e sem comprovação continua sendo compartilhada como se fosse recente?

A resposta está no poder da internet — e no papel das inteligências artificiais (IAs) na amplificação de conteúdos.

O ciclo da desinformação: nós alimentamos as IAs

As IAs, como Grok, GPT  não inventam informações do zero. Elas processam dados disponíveis no "mundo virtual" — artigos, posts, vídeos e outros conteúdos públicos. Quando histórias como a dos fazendeiros são compartilhadas em massa, sem checagem, elas se tornam parte do banco de dados que as IAs utilizam para responder perguntas ou gerar conteúdos. Se mentiras ou distorções predominam, as IAs podem, sem querer, reforçar essas narrativas como "verdade", especialmente se ninguém as desmente.

Esse ciclo é perigoso. Como observou um usuário atento nas redes sociais, "nós alimentamos as IAs" com o que publicamos. Se espalharmos desinformação, as IAs a absorvem e a reproduzem, criando um efeito cascata.

Em vez de um “Ministério da Verdade” único e opressor, como em Orwell, temos hoje milhões de microcuradorias descentralizadas, muitas vezes irresponsáveis, decidindo o que ganha ou não visibilidade.

Sites sensacionalistas, como os que republicam a história dos fazendeiros, priorizam engajamento em vez de rigor jornalístico, e o público, muitas vezes, não questiona o que lê.
O caso Marisa Maiô: um alerta sobre criações de IA

Um exemplo recente no Brasil ilustra como a IA pode complicar ainda mais o cenário. A personagem virtual Marisa Maiô, criada por Raony Phillips com ferramentas de IA generativa, como o Veo 3 do Google, tornou-se um fenômeno em 2025, com vídeos que simulam um programa de auditório e atraem milhões de visualizações.

Mas a popularidade da personagem trouxe à tona um debate: a quem pertencem as criações feitas por IA? Phillips, que elaborou os prompts e editou os vídeos, é o criador intelectual, mas a ausência de regulamentação clara no Brasil levanta questões éticas e legais. Se as IAs são treinadas com dados que incluem obras protegidas por direitos autorais, como músicas ou textos, sem permissão, quem é responsável?

A cantora Marisa Monte, em debates na Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) em 2024, defendeu que artistas humanos devem ser protegidos contra o uso não autorizado de suas obras em IAs. O caso de Marisa Maiô, embora distinto, reforça a necessidade de regulamentação para evitar que a tecnologia seja usada de forma irresponsável, amplificando conteúdos sem transparência ou responsabilidade.

Educar para romper o ciclo

A história dos fazendeiros e o sucesso de Marisa Maiô mostram que a tecnologia, por si só, não é o problema. O mau uso, sim. Para evitar a criação de um "Ministério da Verdade" digital, onde narrativas distorcidas prevalecem, é essencial educar o público e adotar práticas responsáveis:

✅ Cheque as fontes: Antes de compartilhar uma história, verifique se ela vem de fontes confiáveis, com dados concretos, como datas, nomes e documentos.
✅ Questione narrativas virais: Histórias emocionantes, como a dos fazendeiros, podem ser inspiradoras, mas também manipulativas. Pergunte: "Isso é fato ou apenas uma história bem contada?"
✅ Exija transparência das IAs: Ferramentas como Grok devem indicar quando uma informação é incerta ou carece de comprovação, como foi feito ao investigar a história dos fazendeiros.
✅ Educação digital: Ensine às próximas gerações como identificar desinformação e usar a tecnologia de forma crítica.

A internet e as IAs são ferramentas poderosas, mas cabe a nós, humanos, usá-las com responsabilidade. Como disse o autor desta matéria, inspirado por um debate nas redes, "estão fazendo mau uso da tecnologia."

Que o silêncio dos fazendeiros, mesmo que fictício, nos inspire não apenas pela solidariedade, mas pela busca da verdade em um mundo cada vez mais conectado — e desafiador. Que esse silêncio — real ou inventado — não seja apenas memória emocional, mas um convite à escuta atenta, crítica e corajosa no ruído ensurdecedor da era digital.

Mistério em Interlagos: O que aconteceu com Adalberto Amarilio dos Santos Júnior?




by Deise Brandão

No dia 3 de junho de 2025, São Paulo foi abalada pela notícia da morte de Adalberto Amarilio dos Santos Júnior, um empresário de 36 anos encontrado sem vida em um buraco de uma obra no Autódromo de Interlagos. O que parecia ser apenas um desaparecimento após um evento de motos transformou-se em um caso policial cheio de mistérios, contradições e hipóteses perturbadoras. Quatro dias após Adalberto ser visto pela última vez, a Polícia Civil de São Paulo trata a morte como homicídio, mas as respostas ainda estão longe de serem claras.

O último dia de Adalberto Adalberto, dono de óticas e apaixonado por esportes de velocidade, chegou ao “Festival Interlagos 2025: Edição Moto” por volta das 12h30 do dia 30 de maio. Imagens de câmeras de segurança o mostram entrando sozinho no evento, vestindo boné, camiseta preta, calça jeans e tênis. À noite, encontrou-se com um amigo, Rafael Aliste, durante o show do rapper Matuê. Por volta das 19h48, ele enviou uma mensagem à esposa, Fernanda Dândalo, dizendo que iria jantar em casa – mensagem que nunca chegou a ser entregue. Após se despedir de Rafael, Adalberto disse que iria ao estacionamento do kartódromo, onde seu carro estava estacionado em uma área não permitida. Ele nunca chegou lá.

O corpo no buraco 
Na manhã de 3 de junho, funcionários de uma obra da prefeitura encontraram o corpo de Adalberto em um buraco de 2 a 3 metros de profundidade, próximo ao kartódromo. Ele estava sem calças, meias ou tênis, usando apenas cueca e um capacete preto, com a aliança de casamento na mão – detalhe que ajudou na identificação. Inicialmente, um trabalhador confundiu o corpo com um boneco, tamanha a cena chocante. A polícia suspeita que o corpo seria concretado no local, já que a área era isolada por tapumes, sugerindo que o autor do crime conhecia bem o ambiente.

As pistas e os mistérios 
A investigação, conduzida pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), aponta para homicídio como a principal hipótese. Um laudo preliminar do Instituto Médico Legal (IML) revelou que Adalberto morreu por asfixia causada por compressão torácica, com escoriações no pescoço sugerindo agressão, possivelmente um golpe de “mata-leão”. A polícia considera que ele pode ter se desentendido com um dos cerca de 70 a 100 seguranças do evento ao tentar acessar uma área restrita para pegar seu carro.

Outra linha de investigação explora a possibilidade de um golpe “Boa Noite, Cinderela”, mas exames toxicológicos descartaram álcool ou drogas no organismo de Adalberto, contradizendo o depoimento de Rafael, que afirmou que ambos consumiram cerveja e maconha. Rafael, aliás, é uma figura central no caso: sua versão apresenta “lacunas e contradições”, segundo a delegada Ivalda Aleixo, o que levou a novas oitivas. Manchas de sangue humano encontradas em quatro pontos do carro de Adalberto – ainda pendentes de análise de DNA – reforçam a suspeita de violência.

Um crime premeditado?
O patrimônio de Adalberto, avaliado em milhões, incluindo uma empresa, uma casa de R$ 2,5 milhões, um apartamento e veículos de alto valor, levantou a hipótese de um crime premeditado. A ausência de dívidas e um incidente em 2024, quando Adalberto e Fernanda foram ameaçados por um vizinho com uma faca, também estão sob escrutínio. Além disso, a polícia apura se Adalberto marcou um encontro após o evento, o que pode ter desencadeado os acontecimentos fatais.

O que falta esclarecer?
 Enquanto aguardam laudos necroscópicos e de DNA, os investigadores tentam reconstruir os últimos passos de Adalberto. A falta de imagens de sua saída do evento e as contradições no depoimento de Rafael mantêm o caso envolto em mistério. Foi um confronto com seguranças? Um golpe premeditado? Ou algo ainda mais complexo? A resposta depende dos próximos passos da investigação, que continua mobilizando a polícia e a atenção do público.

O clamor por justiça 
A morte de Adalberto gerou comoção. Amigos, como o piloto amador Paul Robison, cobraram mais segurança no Autódromo de Interlagos, que surpreendentemente não possui câmeras da prefeitura, dificultando as investigações. Pelas redes sociais, familiares e conhecidos lamentaram a perda e pediram justiça. “Ninguém merece morrer dessa forma”, disse um amigo ao Estadão.

Fontes: Informações compiladas de reportagens da Metrópoles, SBT News, UOL, Folha de S.Paulo, Hugo Gloss, ISTOÉ e Brasil 247, publicadas entre 10 e 13 de junho de 2025.

Quem Sabe Faz a Hora

 


by Deise Brandão

“Quem sabe faz a hora, não espera acontecer.”

Essa frase, eternizada na canção de Geraldo Vandré durante os anos de chumbo, ainda ecoa como um chamado para quem se recusa a ser espectador da própria vida.

Nem sempre temos o tempo ideal. Nem sempre as condições são justas. Mas há uma força que brota quando, mesmo em meio ao caos, escolhemos agir. Fazer. Levantar. Dizer. Criar. Denunciar. Ou, simplesmente, existir com coragem.

Em tempos de espera eterna por justiça, por reconhecimento, por paz, essa máxima é um lembrete: quem sabe, quem sente, quem vive a urgência da transformação, não pode depender de que o mundo “autorize”.

 A hora é agora — porque adiar a própria voz é deixar que outros escrevam a tua história com mãos alheias.

Fazer a hora é sobre romper o silêncio. É sobre colocar o café na mesa mesmo quando o dia amanhece cinza. É gravar o primeiro episódio do podcast mesmo com a câmera improvisada. 

É falar de uma menina desaparecida quando a cidade inteira quer fingir que não viu. É sobre usar o que se tem. O espaço que se tem. A coragem que ainda restou. 

Porque quem sabe que o tempo é cruel com quem espera demais, se levanta.Nem sempre com tudo pronto. Mas sempre com algo verdadeiro para dizer.

quinta-feira, 12 de junho de 2025

Consulta medica sem escuta é diagnóstico falho




by Deise Brandão

Na teoria, o Sistema Único de Saúde (SUS) é um dos maiores e mais abrangentes sistemas de saúde pública do mundo. Na prática, porém, o que chega até o cidadão muitas vezes se distancia do ideal. Não apenas por falta de estrutura ou profissionais — que, sim, enfrentam sobrecarga e condições difíceis — mas, sobretudo, por um esvaziamento do que deveria estar no centro do cuidado: o vínculo humano.

É comum escutar relatos de pessoas que procuraram atendimento por sintomas como tontura, pressão alta ou insônia, e saíram com um punhado de requisições de exames, receitas prontas e nenhuma explicação. Não houve consulta: houve despacho. E isso não é cuidado.

Uma senhora com histórico de pânico pode ser encaminhada a uma tomografia do crânio sem qualquer preparação, sequer uma conversa sobre os porquês, os riscos, os efeitos adversos ou o que se espera investigar. Um homem em crise emocional pode ser medicado sem escuta. Uma jovem com dores persistentes pode ser rotulada como “ansiosa” sem ser examinada. Isso acontece diariamente, em postos de saúde e emergências de todo o país.

A chamada medicina da família deveria representar o oposto disso. Criada com o intuito de garantir atenção primária integral, ela propõe o acompanhamento contínuo e personalizado de cada indivíduo e núcleo familiar. Mas quando o modelo se reduz à burocracia, perde-se a essência: a confiança. E onde não há confiança, não há prevenção, nem cuidado, nem adesão a tratamentos. Há medo, desamparo e afastamento.

Não se trata de atacar médicos — muitos dos quais são guerreiros em meio ao caos, tentando fazer o melhor com o pouco que têm. Mas é necessário reconhecer que o sistema, tal como está, adoece também a relação médico-paciente. Quando o paciente vira número, e o médico vira carimbo, ambos perdem.

Em tempos de prontuários digitais e inteligência artificial, paradoxalmente o que falta é tempo para olhar nos olhos, ouvir uma queixa até o fim, construir uma hipótese com base na história de vida — e não apenas nos marcadores biológicos.

Saúde pública de verdade exige mais do que remédio gratuito e exames agendados.
Exige a coragem de reumanizar o cuidado. De lembrar que nenhum exame de imagem enxerga o que uma boa escuta é capaz de revelar.

Não é mais possível a saúde pública limitar-se a fornecer paliativos mínimos para as consequências, negando-se a combater a causa. Recursos existem — sejam em verbas, impostos — que viram prédios, planilhas, números, estatísticas... e poucos profissionais de fato capacitados para o atendimento na saúde pública, ainda que sejam excelentes em suas áreas.

Saúde pública não é sinônimo de "despachante".

Enquanto isso não for prioridade, seguiremos vivendo uma medicina cada vez mais tecnológica, automática, mecânica, “matemática” — e cada vez menos terapêutica.

12 de Junho: Sobre o Amor que não vira data




by Deise Bandão

Nunca fui boa em comemorar o Dia dos Namorados. Talvez por distração. Talvez por desencaixe. Ou quem sabe por não ter aprendido a esperar flores numa quarta-feira qualquer só porque o calendário mandou.

Já fui casada, ja namorei longo, ja vivi junto, já fiquei por ficar,  já amei outras tantas, e ainda assim não guardo na memória um 12 de junho sequer que tenha ficado marcado como celebração. Nenhum jantar especial, nenhuma foto em moldura, nenhuma lembrança com laço vermelho. Mas isso não quer dizer ausência de amor — quer dizer outra forma de senti-lo.

Tem gente que ama no silêncio do café coado, no cuidado com o cobertor puxado de madrugada, no “me avisa quando chegar”. Tem amor que não precisa de reservas no restaurante, nem de surpresa com balões. Amor que mora na cumplicidade de uma conversa boba, no apoio que ninguém vê, na escolha de ficar mesmo quando tudo pede pra ir.

Hoje, 12 de junho, celebro todos os afetos que nunca foram postados, todos os companheirismos que não deram certo nem no inicio ou meio e que se encaminhou para o fim. Celebro os aprendizados, as pausas, os términos que me ensinaram sobre recomeços — inclusive comigo mesma.

Celebro, enfim, a maturidade de entender que o amor mais importante talvez não seja o que a gente encontra, mas o que a gente cultiva dentro, com o tempo e com verdade. 

Se você tem alguém, que seja leve.
Se está só, que seja inteiro.
E se não tiver motivos pra comemorar hoje — tá tudo bem também. 

Nem todo amor precisa virar data, notícia,  selfie ou  like. Mas todos precisam ser sentidos e vivenciados. 

quarta-feira, 11 de junho de 2025

O bobo da corte: o único homem que podia rir do rei — e sobreviver

             

by Deise Brandão

Em uma época em que uma simples palavra errada podia custar a cabeça… existia um homem que zombava do rei, debochava dos nobres e ainda era bem pago por isso.

Ele se vestia com roupas coloridas, usava um chapéu com guizos e fazia todos rirem… Mas o que poucos sabem é que, por trás do riso, o bobo da corte era uma figura política, estratégica — e muitas vezes temida.

Na Idade Média, o bobo da corte não era apenas um palhaço. Era uma das poucas pessoas com liberdade para falar o que quisesse dentro de um castelo.

Seu papel ia muito além da diversão: ele fazia críticas sociais mascaradas de piada, expunha a hipocrisia da nobreza e até aconselhava reis em decisões importantes — tudo isso usando o riso como escudo.

Mas cuidado: se a piada fosse longe demais… o final podia ser trágico.

Muitos bobos desapareceram sem deixar rastro ao atravessar a tênue linha entre a ousadia e a insolência.

Vivendo entre o luxo e o perigo, esses homens (e às vezes mulheres) tinham acesso aos banquetes, aos salões reais e às conversas mais secretas. Era comum que fossem treinados em música, teatro, poesia e até acrobacias — verdadeiros artistas da sobrevivência.

Um dos mais famosos foi Triboulet, o bobo que serviu dois reis franceses. Dizem que ele era tão inteligente quanto insolente. Quando irritou Francisco I, o rei decidiu executá-lo. Mas, em um gesto de “bondade”, permitiu que Triboulet escolhesse a forma como morreria. A resposta foi brilhante: "Quero morrer de velhice."

O rei não apenas riu — como o perdoou.

Hoje, o bobo da corte virou símbolo de irreverência, coragem e crítica social.
Naquela época, ele era o espelho que mostrava aos poderosos aquilo que ninguém mais ousava dizer. E fazia isso… sorrindo.

domingo, 8 de junho de 2025

O Efeito Dunning-Kruger: Por que quem menos sabe costuma achar que sabe mais?

    "O que sabemos é uma gota, o que ignoramos é um oceano."

 A frase de Isaac Newton, dita há séculos, talvez nunca tenha feito tanto sentido quanto agora. Vivemos na era da informação – e da desinformação. E, mesmo com tanto conteúdo acessível, o conhecimento profundo continua sendo um desafio. Pior: quanto menos sabemos sobre um assunto, maior a chance de acharmos que sabemos demais. Essa percepção enganosa tem nome e sobrenome: efeito Dunning-Kruger.

by Deise Brandão



Afinal, o que é o efeito Dunning-Kruger?
Trata-se de um viés cognitivo identificado pelos psicólogos David Dunning e Justin Kruger. Eles observaram que pessoas com pouca habilidade ou conhecimento em determinada área tendem a superestimar suas capacidades, enquanto especialistas reais frequentemente subestimam o próprio saber. Em outras palavras: quem mais sabe costuma duvidar de si, e quem menos sabe, confia demais no próprio julgamento.

O estudo original, publicado em 1999 no Journal of Personality and Social Psychology, consistiu em testes de lógica e gramática. Após responderem, os participantes avaliavam seu próprio desempenho. O resultado? Os piores colocados se achavam os melhores. Já os mais preparados tinham uma visão mais crítica (e realista) de si mesmos.
 
Onde esse fenômeno aparece?

Você com certeza já esbarrou com o Dunning-Kruger por aí – talvez até sem saber. Está nas redes sociais, nos grupos de WhatsApp, nos debates sobre política, saúde, futebol ou qualquer outro tema. São os “especialistas de internet”, que nunca estudaram medicina, mas questionam médicos; ou os que nunca pisaram numa universidade, mas se sentem aptos a ensinar professores.

    Exemplos do dia a dia não faltam:
  • A pessoa que viu algumas séries policiais e acha que entende de Direito Penal.
  • O fã de futebol que acredita saber mais do que técnicos profissionais.
  • A criança que estudou pouco e acha que tirou 10, enquanto a mais aplicada se julga insuficiente.
Tudo isso tem a ver com o chamado erro de calibração – tanto de quem sabe pouco quanto de quem sabe muito. É preciso ter uma visão abrangente de um tema para perceber o quanto ainda não se sabe sobre ele. E isso exige estudo, humildade e autocrítica.
 
 As consequências de achar que sabe tudo

Embora pareça inofensivo à primeira vista, o efeito Dunning-Kruger pode gerar consequências sérias:
  • Ignorância progressiva: a pessoa deixa de buscar conhecimento porque acredita já dominar o assunto.
  • Constrangimentos sociais: falações fora de contexto e com falsa autoridade.
  • Decepções e fracassos: quando a realidade confronta a falsa autoconfiança.
  • Sensação de injustiça: o sujeito acredita que merece reconhecimento que não condiz com seu preparo.
E o outro lado? A síndrome do impostor

Na outra ponta do espectro está quem sabe muito, mas duvida de si. É a chamada síndrome do impostor, comum sobretudo entre mulheres no ambiente corporativo. A pessoa acredita que não merece suas conquistas, teme ser "descoberta como fraude", evita promoções e oportunidades, e, muitas vezes, se sobrecarrega tentando compensar uma suposta falta de competência.

Esse sentimento pode levar à autossabotagem e até a quadros de Burnout – problema grave de saúde mental, cada vez mais comum no Brasil.

Curiosamente, essas pessoas muitas vezes se comparam àquelas acometidas pelo efeito Dunning-Kruger, aumentando ainda mais sua insegurança.
 
Como evitar cair na armadilha?
  • Embora ninguém esteja imune, há caminhos para evitar ou amenizar os efeitos:
  • Busque conhecimento constante: aprender exige tempo, dedicação e humildade. Ninguém se torna expert de um dia para o outro.
  • Aceite que não saber tudo é normal: reconhecer seus limites é sinal de inteligência, não de fraqueza.
  • Peça feedback sincero: ouça pessoas em quem confia e esteja aberto a críticas construtivas.
  • Desconfie da autoconfiança exagerada – principalmente quando ela surge sem base sólida. 
 A gota e o oceano

Saber que somos apenas uma gota num oceano de conhecimento não é desanimador – é libertador. A consciência da nossa ignorância é o primeiro passo rumo ao verdadeiro saber. Não se trata de se sentir pequeno, mas de manter a sede por aprender.

Evitar o efeito Dunning-Kruger e combater a síndrome do impostor são movimentos complementares. Ambos passam por autoconhecimento, estudo constante e, principalmente, empatia: entender que todos estamos aprendendo. Sempre.

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