Imagem: Reprodução/RBSTV
O Julgamento que Virou Reparação
Na última sexta-feira (22), um júri em Passo Fundo absolveu Luan dos Santos e Tatiele Goulart Guimarães, pais do bebê Arthur Goulart dos Santos, morto em 2023 após um engasgo em casa. O casal passou dois anos atrás das grades, acusado injustamente de homicídio qualificado, até que a Justiça finalmente reconheceu: a morte do bebê foi consequência de falhas médicas, não de um crime cometido pelos pais.
A decisão, embora tardia, expôs mais uma vez um modus operandi recorrente no Rio Grande do Sul: transformar vítimas em culpados, queimando-as em vida antes que a verdade venha à tona.
Do Desespero à Prisão
Arthur foi reanimado e levado ao Hospital São Vicente de Paulo, mas dias depois não resistiu. Lesões no corpo, associadas às manobras de socorro, levantaram suspeitas — e rapidamente os pais passaram de desesperados a acusados.
O Conselho Tutelar foi acionado, a Polícia Civil abriu investigação e o Ministério Público denunciou o casal por homicídio qualificado. Em julho, eles foram presos preventivamente.
A Falha Médica Reconhecida
Durante o julgamento, a defesa apresentou contradições nos prontuários e denunciou a negligência hospitalar:
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Demora no atendimento: Arthur ficou da meia-noite ao meio-dia sem acesso a uma vaga de UTI.
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Evolução do quadro: quando finalmente entrou na UTI, já estava com morte encefálica.
A Defensoria Pública foi incisiva: não se tratava de violência familiar, mas de uma sucessão de erros médicos e institucionais. O próprio Ministério Público recuou, pedindo a desclassificação para homicídio culposo. Ao final, os jurados absolveram os pais.
Dois Anos Arrancados
Enquanto aguardavam pelo julgamento, Luan foi enviado para a Penitenciária de Canoas e Tatiele para a de Guaíba. Ela, mãe de outras duas crianças, ficou dois anos sem ver os filhos. O reencontro aconteceu apenas na sala do júri — marcado por lágrimas, dor e alívio.
Luan, recém-libertado, já conseguiu emprego. Sua fala após o julgamento ecoa como denúncia e resistência:
“Isso mostra que somos trabalhadores, cidadãos de bem. Não fizemos mal algum, principalmente ao nosso filho.”
O Padrão Gaúcho: Vítimas Como Réus
Este caso não é isolado. Ele reflete um padrão de violência institucional no Rio Grande do Sul:
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Falhas médicas ou institucionais se transformam em acusação contra cidadãos comuns.
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Famílias em situação de dor são revitimizadas pelo sistema de justiça.
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A lógica é inverter papéis: o Estado falha, mas é a vítima quem paga.
É o que muitos chamam de “queimar em vida” — condenar inocentes antes da sentença, destruindo reputações, lares e futuros.
O Que Fica
A absolvição de Luan e Tatiele não apaga os dois anos de cárcere, nem o trauma de perder um filho em circunstâncias trágicas. Mas expõe, mais uma vez, a engrenagem de um sistema que, em vez de proteger, oprime.
Enquanto não houver responsabilização de verdade — de gestores públicos, serviços de saúde e autoridades que alimentam essa máquina de injustiça —, casos como o deles continuarão a se repetir.
E o modus operandi do RS seguirá firme: transformar vítimas em réus, e réus em exemplos de um Estado que pune quem deveria proteger.
Que sejam mais forte do que um Sistema Estatal completamente podre e consigam seguir adiante.