quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

Caso Marielle: Saiba quem é Domingos Brazão, dono de trajetória política recheada de polêmicas e processos

Político já foi alvo de suspeitas de corrupção, pela qual foi afastado e depois reconduzido ao cargo de conselheiro do TCE-RJ, fraude, improbidade administrativa, compra de votos e até homicídio
Por O GLOBO — Rio de Janeiro

01/10/2023 07h33 Atualizado há um dia

Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) Domingos Brazão — Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo

Vereador, deputado estadual por cinco mandatos consecutivos (1999-2015) e conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do (TCR-RJ), Domingos Brazão, de 58 anos, coleciona polêmicas e processos ao longo de seus mais de 25 anos de vida pública. Contra ele já foram levantadas suspeitas de corrupção, pela qual foi afastado e depois reconduzido ao cargo de conselheiro do TCE-RJ, fraude, improbidade administrativa, compra de votos e até homicídio. Seu nome volta agora aos holofotes a partir da delação do ex-PM Élcio Queiroz, preso suspeito de envolvimento no assassinato, em 2018, da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes, conforme revelou, neste domingo, o colunista Bernardo Mello Franco, do GLOBO.

Quem é Domingos Brazão?
Em março, a 13ª Câmara de Direito Privado determinou o retorno de Brazão ao TCE-RJ por 2 votos a 1. A decisão colocou fim ao processo que pedia a anulação da nomeação dele ao cargo, para o qual foi eleito, em 2015, com o voto da maioria dos seus pares na Assembleia Legislativa (Alerj). O ex-deputado estava afastado desde 2017, quando ele e outros quatro conselheiros chegaram a ser presos temporariamente como parte da Operação Quinto do Ouro, um dos desdobramentos da Operação Lava-Jato no Rio.

Por que Domingos Brazão foi afastado do cargo de conselheiro do TCE-RJ?
A investigação apurava suspeitas de fraude e corrupção no tribunal. Os conselheiros presos foram acusados de receber vantagens indevidas em diversas oportunidades. Houve até menção a uma mesada de R$ 70 mil, para cada, que seria paga pela Federação das empresas de transporte de passageiros do Estado do Rio (Fetranspor). Na denúncia do MPF, Brazão é classificado como a “pessoa que sempre evitou deixar rastros, em relação aos seus contatos e recebimentos ilícitos, buscando justificá-los com eventuais verbas em dinheiro vivo 'supostamente' advindas de suas empresas, bem como realizando diversas medidas de contrainteligência, com vistas a dificultar qualquer investigação sobre seus atos”.

Na investigação, dados obtidos junto ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) mostram movimentações atípicas em várias de suas contas e uma evolução patrimonial de 27% entre 2014 e 2016, período que abrange sua saída da Alerj e entrada no TCE-RJ.

Qual é a relação entre Domingos Brazão e o caso Marielle?
A primeira vez em que Domingos Brazão se viu envolvido nas investigações do assassinato de Marielle foi após o depoimento do policial militar Rodrigo Jorge Ferreira, o Ferreirinha, que acusou o então vereador Marcello Siciliano (PHS) e o miliciano Orlando Curicica como sendo os mandantes do crime. A Polícia Federal desconfiou e concluiu, após investigação, que Ferreirinha e sua advogada, Camila Nogueira, faziam parte de organização criminosa cujo objetivo era atrapalhar as investigações sobre a morte da vereadora.

A Procuradoria Geral da República pediu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) que Brazão fosse investigado por suspeita de ter utilizado um policial federal aposentado, que era funcionário de seu gabinete no TCE-RJ, para levar Ferreirinha ao falso testemunho. A investigação apontou ainda indícios de ligação do conselheiro com o grupo conhecido como Escritório do Crime, que estaria envolvido na morte da vereadora. O interesse de Brazão e seu clã seria prejudicar Siciliano, que estaria decido a disputar influência na Zona Oeste, região que tradicionalmente seria domínio de sua família. Em 2018, O GLOBO mostrou que tanto o grupo de Brazão quanto o de Siciliano apresentaram projetos de lei que poderiam favorecer a expansão de construções irregulares na Zona Oeste. Marielle vinha atuando em projetos de regularização fundiária na área, o que poderia estar incomodando o grupo.

Por que Domingos Brazão foi denunciado por obstrução de Justiça?
Em março deste ano, a Justiça do Rio rejeitou a denúncia contra Domingos Brazão pelo crime de obstrução de Justiça. A decisão foi do juiz Andre Ricardo de Franciscis Ramos, da 28ª Vara Criminal, que seguiu o pedido do MPRJ. A denúncia havia sido apresentada ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 17 de setembro de 2019 por Raquel Dodge, em seu último dia como procuradora-geral da República. A procuradora denunciou cinco pessoas por embaraço a investigação de organização criminosa (obstrução de justiça); favorecimento pessoal; imputar falsamente, sob pretexto de colaboração com a Justiça, a prática de infração penal a pessoa que sabe ser inocente; e falsidade ideológica. Em 2020, o caso foi para Tribunal de Justiça do Rio porque o ministro Raul Araújo, relator do caso no STJ, declinou da competência.

Brazão sempre teve na Zona Oeste seu reduto eleitoral, especialmente em Jacarepaguá, bairro onde nasceu. Em 2011, chegou a ter o mandato cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio (TRE-RJ) por suposta compra de votos por meio do Centro de Ação Social Gente Solidária, ONG vinculada ao deputado e onde ocorreria prática de assistencialismo, de acordo com a acusação. Com liminar conseguida no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ele conseguiu manter o mandato.

Antes, em 2004, uma gravação indicara envolvimento de Brazão e do ex-deputado Alessandro Calazans com a máfia dos combustíveis. O caso envolvia licenças ambientais da Feema para funcionamento de postos de gasolina. Em 2014, a radialista e então deputada estadual Cidinha Campos processou Domingos Brazão por ameaça. Durante uma discussão pública, Brazão teria dito que "já matou vagabundo, mas vagabunda ainda não", fazendo referência à deputada.

O homicídio ao qual Brazão fez referência teria ocorrido quando ele era jovem. Segundo o ex-deputado, ele foi absolvido porque o caso foi entendido como legítima defesa. "Matei, sim, uma pessoa. Mas isso tem mais de 30 anos, quando eu tinha 22 anos. Foi um marginal que tinha ido a minha rua, em minha casa, no dia do meu aniversário, afrontar a mim e a minha família. A Justiça me deu razão", contou Brazão à época da briga com Cidinha Campos.

Caso Marielle: Saiba o que há sobre Brazão na investigação


Documentos apreendidos pela Polícia Federal apontam indícios de ligação da família de Domingos Brazão com o responsável por vazamento de operação, em 2019, contra os executores da vereadora
Por Vera Araújo — Rio de Janeiro

01/10/2023 15h35 Atualizado há 3 meses

Conselheiro afastado do Tribunal de Contas do Rio (TCE-RJ) desde 2017, Domingos Brazão — Foto: Arquivo
Uma das principais linhas de investigação seguida pela Polícia Federal e pelo Ministério Público do Rio (MPRJ) para se chegar ao mandante da execução da vereadora Marielle Franco (PSOL) vem se fortalecendo a cada passo que a polícia dá. Documentos apreendidos no apartamento de Jomar Duarte Bittencourt Junior, o Jomarzinho, em 24 de julho, revelam vínculos dele com a família do conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) Domingos Brazão. Jomarzinho é apontado como um dos responsáveis pelo vazamento de informações sobre uma operação em 2019 contra envolvidos no caso. Em julho deste ano, a Polícia Federal cumpriu mandando de busca e apreensão em seu apartamento.

Jomarzinho com Lúcia Brazão, irmã do conselheiro Domingos Brazão, na Câmara dos Vereadores — Foto: Reprodução

Jomarzinho aparece, por exemplo, numa foto com Lúcia Brazão, irmã do conselheiro, na Câmara dos Vereadores. No rodapé da fotografia, há ainda os retratos de outros dois irmãos, Chiquinho e Pedro Brazão, com a data de 2 de agosto do ano passado, quando ambos foram agraciados com a medalha Pedro Ernesto, a maior comenda da Casa. À época, eles eram deputados federal e estadual, respectivamente. No dia da solenidade, Domingos e Jomarzinho estavam presentes.

A busca e apreensão no apartamento de Jomarzinho, na Barra da Tijuca, foi autorizada pelo juiz da 4ª Vara Criminal, Gustavo Kalil, onde tramita o Caso Marielle e Anderson, por ele ser citado na delação premiada do ex-PM Élcio de Queiroz. O delator confessou ser o motorista da emboscada à parlamentar e ao motorista dela, Anderson Gomes, em 14 de março de 2018. Segundo o colaborador, Jomarzinho foi um dos responsáveis por vazar informações sobre a Operação Lume, cujo objetivo era justamente o de prender os executores do duplo homicídio. Desconfiados do vazamento na época, o MP e a Polícia Civil anteciparam a ação que culminou com as prisões de Lessa e Élcio.
Segundo as investigações da PF e do Grupo de Atuação Especializada no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MPRJ, em 11 de março de 2019, portanto, véspera do dia marcado para a prisão do também ex-policial militar Ronnie Lessa, Jomarzinho mandou uma mensagem sobre a operação para o sargento da PM Maurício da Conceição dos Santos Júnior, o Mauricinho. O destinatário final do alerta era Lessa. O ex-policial sempre considerou Mauricinho seu sobrinho.

De acordo com as análises de dados telemáticos nos celulares e computadores dos envolvidos, os agentes e promotores descobriram a troca de mensagens entre eles pelo WhatsApp. Jomarzinho diz: “Recebi um informe agora, que vai ter operação Marielle amanhã”. O PM responde: “Putz, vou tentar chamar ele aqui”. Poucos minutos depois, Mauricinho questiona uma terceira pessoa, o ex-bombeiro Maxwell Simões Corrêa, o Suel, preso no fim do mês passado, também acusado de participação na morte da parlamentar: “Já falou?”, e recebe a confirmação, seguida da mensagem “doido para isso acabar logo”. Jomarzinho demonstra preocupação e comenta: “Pelo que me falaram, vão até prender Brazão...”.

As buscas e apreensões nas casas de Jomarzinho e Mauricinho ocorreram em 24 de julho, mesma data em que Suel foi preso, acusado de ter “picotado” o Cobalt usado na emboscada às vítimas, ou seja, destruído o veículo, peça por peça. O ex-bombeiro já havia sido condenado anteriormente por obstrução à Justiça, por ajudar a esconder armas do amigo Lessa.

Edimilson da Silva Oliveira, o Macalé, sargento reformado da PM, apontado na delação premiada do ex-PM Élcio de Queiroz, como a pessoa que contratou o também ex-policial militar Ronnie Lessa para executar a parlamentar, é um dos listados no relatório da CPI das Milícias. Élcio, assim como o compadre Lessa, são réus no homicídio de Marielle e Anderson. No documento produzido em 2008, Macalé é apontado como integrante da milícia que atua em Oswaldo Cruz, na Zona Norte, reduto do então deputado Domingos Brazão e o vereador Chiquinho Brazão, que são irmãos. Macalé foi assassinado em 2021, em Campo Grande.

Mais ligações com a família Brazão

As ligações com a família Brazão não param por aí. Os agentes da PF e os promotores do Gaeco encontraram ainda no apartamento de Jomarzinho, um crachá dele, lotado na vice-presidência da Companhia Estadual de Habitação do Estado do Rio de Janeiro (Cehab-RJ). O órgão, segundo fontes de estado, é feudo de três políticos, entre eles, Domingos Brazão. O suposto afilhado do conselheiro trabalhou de novembro 2020 até julho 2021, gestão de Roberto Peçanha Fernandes como diretor-presidente da Cehab-RJ, outro apadrinhado por Domingos.

Aliás, Peçanha concedeu uma gratificação de encargos especiais a Jomarzinho de R$ 1.170,58, conforme portaria assinada em 11 de junho de 2021, além dos pagamentos pelo cargo de confiança e o próprio salário como assessor da diretoria. O documento também foi apreendido na casa dele, assim como três celulares de última geração e cinco fotos de evento da Medalha Pedro Ernesto.

O vínculo de Peçanha com os Brazão chegou a ser noticiado pelo RJTV em dezembro do ano passado, num suposto esquema que ficou conhecido como “farra do asfalto”. Na época, ele estava como diretor de obras e conservação regional do Departamento de Estradas de Rodagem (DER). O MPRJ instaurou um procedimento investigatório para apurar irregularidades na compra de concreto pelo DER. Os contratos entre o estado e uma empresa, no valor de R$ 50 milhões, indicava que concreto era para tapar buracos, mas a denúncia informava que não houve estudo e o material era jogado em várias ruas. O gestor do contrato era Peçanha e já havia sido pago R$ 8 milhões.

O poder dos Domingos

Domingos Brazão, de 57 anos, começou na política em 1996 como vereador pelo antigo MDB (Movimento Democrático Brasileiro). Dois anos depois, ele passou a ser deputado estadual, saindo da Alerj para ser conselheiro do TCE, em 2015, depois de seu quinto mandato na Casa. Na época, quatro deputados do PSOL, encabeçados pelo deputado Marcelo Freixo, que levou Marielle para a política, foram contra a nomeação. A maioria, porém, aprovou que Domingos ocupasse uma cadeira no tribunal.

Dois anos após nomeado, houve a operação Quinto do Ouro, um desdobramento da Lava Jato. Domingos Brazão e outros quatro conselheiros, alvos da ação, foram presos pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal (MPF), suspeitos de comandarem um esquema de desvio de verbas públicas. Os cinco ficaram presos por cerca de duas semanas.

Antes de voltar ao conselho do TCE, no fim de 2018, Domingos passou a ser investigado pela Polícia Federal como suspeito de ser o mandante do assassinato de Marielle e Anderson. Na época, o delegado federal Leandro Almada, responsável por apurar o trabalho da Polícia Civil do Rio sobre o caso, chegou a cogitar essa possibilidade na chamada “investigação da investigação”. A polícia estadual apontava o miliciano Orlando Oliveira de Araújo, o Orlando da Curicica, como executor, e o então vereador Marcello Siciliano (PHS), o mandante. Num relatório de cerca de 600 páginas, Almada conclui que foi montada uma farsa para incriminar principalmente o miliciano, que estava preso no presídio federal de Mossoró, no Rio Grande do Norte. Para isso, uma falsa testemunha — um policial militar rival de Curicica— foi plantada por três delegados da Polícia Federal, que sequer estavam investigando o caso. Atualmente, Almada é o superintendente da PF do Rio e comanda as investigações do duplo homicídio.

Numa análise do mapa de votação, Almada comparou os redutos eleitorais de Marielle, Chiquinho Brazão e Siciliano. Ele percebeu que havia mais rivalidade entre os dois primeiros no cenário territorial político na época. Apesar de ser mais novo que os irmãos, Domingos sempre foi uma espécie de protetor deles. Além de conselheiro, Domingos é empresário, dono de postos de gasolina, principalmente em Jacarepaguá, reduto eleitoral da família. João Francisco e Manoel Inácio Brazão são conhecidos como Chiquinho e Pedro, ambos filiados ao União Brasil.

A PF chegou a cumprir oito mandados de busca e apreensão, incluindo as casas do conselheiro, num condomínio de luxo da Barra da Tijuca, e de seu assessor no TCE, Gilberto Ribeiro da Costa, um ex-agente da Polícia Federal. O suposto motivo do crime, por enquanto, ainda não está claro, embora não se descarte a rivalidade política entre os Brazão e Marielle.

Em setembro de 2019, a então procuradora-geral da República Raquel Dodge pediu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para "apurar indícios de autoria intelectual de Domingos Brazão" no homicídio de Marielle. Houve uma tentativa de federalizar as investigações do caso Marielle, passando o inquérito para o MPF e a Polícia Federal. No entanto, a promotora de justiça Simone Sibílio, encarregada do inquérito, defendeu, diante dos ministros do STJ, que a investigação estava em andamento e que dependia de quebras telemáticas para a elucidação do duplo homicídio. A Corte decidiu manter o caso na esfera estadual. Atualmente, após um acordo no início do ano, coube ao MPRJ e a PF descobrirem quem mandou matar a vereadora e seu motorista.

Domingos Brazão retornou ao cargo em março deste ano. Ele sempre negou envolvimento no crime. O advogado dele, Ubiratan Guedes, disse que apenas Jomarzinho pode esclarecer o diálogo dele com o PM Mauricinho, para entender o motivo de ele ter citado o nome de Brazão na conversa. Segundo Guedes, seu cliente está à disposição da Justiça para prestar os esclarecimentos. Os demais citados ou seus advogados foram procurados pelo GLOBO, mas ainda não responderam sobre os rumos das investigações

Caso deveria ter sido federalizado o quanto antes', diz Raquel Dodge sobre assassinato de Marielle e indícios sobre Brazão

 Ex-procuradora-geral da República, à frente do cargo na época do assassinato da vereadora, diz que novas suspeitas sobre Domingos Brazão não a surpreenderam
Por Mariana Muniz O GLOBO — Rio de Janeiro

02/10/2023 04h01 Atualizado há 3 meses

A ex-procuradora Geral da República Raquel Dodge, durante evento em agosto de 2019 — Foto: José Cruz/Agência Brasil

As novas suspeitas contra o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) Domingos Brazão não surpreenderam a ex-procuradora-geral da República Raquel Dodge, que ocupava o posto na época do assassinato da vereadora Marielle Franco, em março de 2018. Neste domingo, a coluna de Bernardo Mello Franco mostrou que o inquérito que apura o assassinato da vereadora e do motorista Anderson Gomes saiu do Rio de Janeiro e foi enviado ao STJ diante do surgimento de novas suspeitas sobre Brazão.

Ao GLOBO, a subprocuradora-geral da República, que denunciou Brazão ao STJ em 2019 por tentativa de embaraçar as investigações no caso Marielle, afirma que já naquela época havia indícios da participação do conselheiro do TCE-RJ no crime contra a vereadora.

— Naquela época já havia indícios de que ele (Brazão) participara do crime em si. E eu suspeito que agora é o que está voltando ao STJ — afirma.

De acordo com Dodge, com esse fato novo, o STJ irá, ao lado da Procuradoria-Geral da República (PGR), analisar os elementos apresentados para saber se, de fato, o caso deverá permanecer sob a competência da Corte.

Segundo o colunista Bernardo Mello Franco, Brazão voltou à mira da Justiça após a delação premiada do ex-PM Élcio Queiroz. Num trecho que já veio a público, ele confessou ter dirigido o carro usado no ataque e confirmou que Ronnie Lessa foi o autor dos disparos.

A Constituição Federal estipula que membros dos tribunais de contas dos estados sejam processados pelo STJ. Mas o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) determina que essa prerrogativa deve valer apenas quando os eventuais crimes tiverem sido cometidos no exercício do cargo. Por isso é que o tribunal irá decidir, ainda, se o caso deverá seguir sob a sua tutela — ou se deverá seguir para a primeira instância, como ocorreu com a denúncia apresentada por Dodge.

Em 21 de março deste ano, após o caso sair do STJ, a Justiça do Rio de Janeiro rejeitou a denúncia contra o conselheiro do Tribunal de Contas pelo crime de obstrução de Justiça na investigação das mortes da vereadora e do motorista. A decisão foi do juiz Andre Ricardo de Franciscis Ramos, da 28ª Vara Criminal.

— Quando estive à frente da PGR, tomei duas providências em relação ao caso Marielle: uma em decorrência de competência por prerrogativa de função, no caso do conselheiro do TCE, e outra em razão da federalização, por meio do incidente de deslocamento de competência. Na ocasião, a minha compreensão era a de que o sistema de Justiça do Rio de Janeiro não estava conseguindo processar e julgar o caso e, por isso, a federalização, ou seja, a ida para a Justiça Federal, era o melhor caminho — aponta.

A solicitação de Dodge, para a federalização, no entanto, foi negada pela Terceira Seção do STJ em maio de 2020. Na época, a relatora do caso, ministra Laurita Vaz, defendeu a manutenção do caso sob a competência da Justiça estadual, da Polícia Civil e do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ). Para ela, não era possível verificar “desídia” ou “desinteresse” por parte das autoridades estaduais nas investigações para solucionar o crime.

Quando o crime completou cinco anos, em março deste ano, o ministro da Justiça, Flávio Dino, anunciou a entrada da Polícia Federal nas investigações sobre o assassinato de Marielle e Anderson. A medida, no entanto, não configura formalmente a federalização, mas sim, segundo esclarece a ex-PGR, uma competência natural da PF para atuar em casos de repercussão nacional, mesmo que em se tratando de um crime “estadual”. A disposição está no artigo 144 da Constituição.

Passados cinco anos do crime ainda sem respostas, a subprocuradora-geral segue entendendo que a federalização da investigação sobre o assassinato de Marielle e Anderson teria sido a melhor solução.

— Minha avaliação segue a argumentação que defendi no incidente de deslocamento de competência perante o STJ. Esse caso deveria ter sido federalizado quanto antes. A federalização era a melhor saída para esse caso e a evidência era muito simples. Toda às vezes que comissionamos à Polícia Federal para atuar, o caso avançou — disse.

Dodge relata que enquanto esteve à frente da PGR enfrentou diversos obstáculos para obter acesso à investigação do caso Marielle e Anderson, mesmo tendo sido ela a requisitar os inquéritos. Após cinco anos dos assassinatos, e ainda sem uma conclusão sobre quem mandou matar a vereadora, a ex-PGR se diz “pessoalmente muito frustrada”.

— Eu pessoalmente fico muito frustrada. O crime contra Marielle foi e é um crime contra a democracia. Não assassinaram uma vereadora qualquer, ela era uma mulher que tinha uma pauta muto clara e eu mandei imediatamente preparar a portaria da federalização por isso. Minha ida ao Rio (no dia seguinte ao crime), como PGR, sinalizou muito claramente a importância do caso — relata.

O pedido de federalização do caso Marielle feito por Dodge ocorreu às vésperas do final de seu mandato à frente da PGR, em 2019. Segundo a subprocuradora, em razão das inúmeras dificuldades de acesso que ela teve aos documentos, o que incluiu uma fraude via Correios.

— Não se pode assassinar deputados, parlamentares e ao assassinar Marielle estavam assassinando e calando uma parte da população. Naquele dia percebi ser disso que se tratava. Não ver esse crime esclarecido, para mim, é uma evidência de que as forças que operam tudo isso estão prevalecendo — afirma.

Citado no relatório da CPI das Milícias, Brazão é chefe de um clã que inclui o deputado federal Chiquinho Brazão, o deputado estadual Manoel Brazão e o vereador Waldir Brazão, um agregado que adotou o sobrenome para fins eleitorais.

Eleita vereadora do Rio de Janeiro pelo PSOL em 2016, com 46 mil votos (a quinta candidata mais bem votada do município), Marielle Franco teve o mandato interrompido por 13 tiros na noite de 14 de março de 2018, num atentado que vitimou também seu motorista Anderson Gomes

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