“A
CPI vai terminar em pizza.” Assim vaticinavam as empresas privadas de comunicação (Globo,
Veja, Estadão, Folha, etc.) desde o início dos
trabalhos da Comissão Parlamentar Mista de
Inquérito (CPMI, ou CPI na sigla consagrada)
que investigou as relações criminosas do bicheiro Carlos Cachoeira com agentes públicos
e privados. Melhor dizendo: assim pregavam,
torciam e assim acabaram por construir esse final. Agiram desta maneira porque, como toda
empresa privada, elas têm seus interesses, que
não são muito diferentes dos interesses das
empresas de transporte, medicamentos, etc.
Ou seja: financeiros, econômicos, políticos,
comerciais, etc. E para defender esses interesses é que a CPI tinha que terminar em pizza.
Pensaram: e se sobrar para nós também? Pois
bem, é na defesa de seus interesses que essas
empresas manipulam a informação.
A CPMI foi constituída para investigar as
práticas criminosas do senhor Carlos Augusto
Ramos, conhecido vulgarmente como Carlinhos Cachoeira. O trabalho durou oito meses
e teve como base as investigações da Polícia
Federal nas denominadas operações Vegas e
Monte Carlo. E, ao contrário do que afirmam
alguns parlamentares, as paralisações do período eleitoral não prejudicaram as investigações,
já que a maior parte dos trabalhos se deu pela
análise de documentos e não de depoimentos.
A análise dos documentos permitiu conhecer
o modus operandi da organização criminosa,
sua relação com agentes públicos, políticos e
fontes de financiamento. Identificou também
profissionais ligados aos meios de comunica-
ção que de alguma forma aderiram à organização ou colaboraram com Carlos Cachoeira.
Como membro da CPMI posso afirmar que o relatório apresentado pelo deputado Odair Cunha (PT-MG) não protegia
ninguém, tampouco jogava sombra sobre
personagens que deveriam continuar a ser
investigados ou mesmo indiciados, como o
governador Marconi Perillo (PSDB-GO) e
vários jornalistas. Ou seja, era o resultado
que a mídia não queria, pois apontava para
um partido queridinho, o PSDB, e levantava
suspeitas sobre o envolvimento da imprensa
“imparcial” com o crime organizado.
Como afirma o relator, as “Operações
Vegas, entre os anos de 2008 e 2009, e Monte Carlo, entre os anos de 2010 e 2012, evidenciaram um espectro de ilicitudes do Senhor Carlos Cachoeira, e seu envolvimento
com o Poder Público do Estado de Goiás,
estendendo-se ao Executivo, Legislativo e
Judiciário, bem como a membros do Ministério Público”. “Os indícios também apontavam para uma rede de espionagem política e
econômica, na qual a organização criminosa
se baseava em comprar informações sigilosas muitas vezes por meio de interceptações
telefônicas clandestinas.”
CPMI desvendou os esquemas da organiza
ção criminosa de Carlinhos Cachoeira. Estabeleceu as relações financeiras entre pessoas
físicas e jurídicas e mostrou a aquisição de
patrimônio a partir da atividade criminosa.
Demonstrou também como “integrantes da
organização se infiltraram no Estado de Goi-
ás e como utilizaram agentes púbicos em benefício próprio ou de seus negócios ilícitos”.
Sei que é estafante para um simples artigo, mas é preciso se debruçar sobre números para demonstrar o alcance das análises
dos documentos e o quão era (ou é?) atuante
a organização criminosa. Foram quebrados
os sigilos bancários de 75 empresas e pessoas físicas, totalizando uma movimentação
de R$ 84.351.961.822,13 entre 2002 e 2012,
sendo R$ 42.053.697.762,31 em créditos e
R$ 42.298.264.059,82 em débitos.
Segundo os dados obtidos, “88,70% das
transações envolvendo cheques não estão
identificadas e as transferências entre contas
não identificadas totalizam R$ 632.068.848,01
em créditos e R$ 852.571.649,98 em débitos.
Por sua vez, as transferências interbancárias
(DOC e TED) não identificadas atingem
o montante de R$ 200.862.131,02 em cré-
ditos e R$ 1.500.933.694,58 em débitos”.
Continua: “No universo do sigilo bancá-
rio, 24,97% dos créditos constantes (ou R$
10.500.180.092,48) não estão identificados,
assim como 38,66% dos débitos (que representam R$ 16.350.963.569,61). São consideradas não identificadas as transações que não
possuem CNPJ ou CPF informados”.
O volume de recursos que passou pelas empresas-fantasmas superou R$ 148
milhões num período de pouco mais de
quatro anos. “Trata-se de um valor considerável, principalmente quando levamos
em consideração que tais empresas não têm
qualquer atividade econômica real. Foram
criadas apenas e tão somente para ocultar
transações financeiras”, conclui o relator.
Dados esses atualizados até o dia 06 de outubro de 2012.
Caro leitor, cara leitora, desculpem-me,
mas são necessários dois comentários: primeiro, o pretenso “mensalão” do PT não chega aos pés do esquema Cachoeira/PSDB-GO;
segundo, se o procurador-geral da República,
Roberto Gurgel, tivesse agido durante a Operação Vegas, conforme solicitado pela Polícia
Federal, parte desses recursos não teriam sido
desviados e provavelmente Marconi Perillo
não teria sido eleito governador, tampouco
Demóstenes Torres (outro queridinho das
empresas privadas de comunicação) eleito
senador em 2010.
O relator conclui que a “organização
criminosa de Carlos Cachoeira construiu um
verdadeiro ‘Triângulo de Ferro’ em Goiás,
com vértices e personagens bem delineados”.
Neste triângulo “merecem destaque a atuação
do próprio Carlos Cachoeira, em um vértice,
da empresa Delta Construções S/A Centro-
-Oeste, em outro, e do senador cassado Demóstenes Torres, em outro. Somam-se a esses
vértices agentes públicos e privados envolvidos, com destaque para integrantes dos escalões políticos do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB)”.
Cachoeira também usava o Poder Legislativo brasileiro, nas figuras de deputados
federais, estaduais e vereadores. Deles obtinha favores para a organização criminosa e
retribuía financiando, com dinheiro oriundo
do crime, suas campanhas eleitorais.
A Delta Construções S/A, ramo Centro-
-Oeste, acabou por se revelar um dos instrumentos de corrupção de agentes públicos e
privados. “As quebras de sigilos bancário e
fiscal revelaram que essa regional da Delta
transferiu vultosa quantidade de recursos financeiros para empresas de fachada controladas por Carlos Cachoeira.”
“Cachoeira mantinha ainda uma intricada rede de escutas clandestinas e arapongagem, por meio da qual obtinha informações
que eram usadas para chantagear e achacar
agentes públicos e privados. Essa rede de
espionagem servia ainda para Cachoeira tomar conhecimento das operações policiais
de combate a jogos de azar e máquinas caça-
-níqueis em Goiás e no entorno do Distrito
Federal, elo financeiro mais forte do contraventor”.
Chamo a atenção para o fato que este
serviço de arapongagem estava à disposição
do jornalista Policarpo Junior, da revista Veja.
Em poder de informações obtidas através de
grampos ilegais, portanto criminosos, Policarpo criava matérias para bater nos governos
do Lula e Dilma, no PT e em seus militantes.
Cachoeira tinha em suas mãos políticos
do porte do ex-senador Demóstenes Torres
(um dos mosqueteiros da revista Veja) e do
governador de Goiás, Marconi Perillo. Tinha
trânsito livre em importantes secretarias e autarquias do Estado de Goiás, assim como no
gabinete do governador. Tinha em suas mão
prefeitos de cidades goianas, vereadores e
deputados estaduais e federais, além da Delta
Construções S.A., ramo Centro-Oeste, responsável pelo depósito de R$ 98.928.491,10,
nas contas de cinco das sete empresas-fantasmas investigadas. Também controlava mais
de uma dezena de jornalistas, incluso o mais
importante jornalista da revista Veja, Policarpo Junior.
Nada me custa fazer duas perguntas:
será que Cachoeira tinha essas pessoas nas
mãos ou ainda as tem? Segunda: por que em
setembro de 2009, quando o inquérito policial
da Operação Vegas detectou o envolvimento
de parlamentares e outras autoridades com
prerrogativa de foro no esquema de explora-
ção de jogos ilegais comandado por Carlos
Cachoeira, o Dr. Roberto Gurgel, procurador-
-geral da República, não ofereceu a denúncia
para iniciar a ação penal? Por que, como se
diz vulgarmente, “sentou” em cima?
Creio que é possível concluir o porquê,
desde o início, as empresas de comunicação
trabalharam para que a CPMI terminasse em
pizza: porque por todos os meios ela chegava aos seus queridinhos ou a alguns dos seus
jornalistas.
A pizza foi ao forno tendo com chefes da
cozinha o PSDB, comandado pelo “ferrenho
combatente” da corrupção, senador Álvaro
Dias, e o PMDB.
*Dr. Rosinha, médico pediatra, é deputado
federal (PT-PR) e vice-presidente brasileiro do
Parlamento do Mercosul
by *Dr. Rosinha, médico pediatra, é deputado
federal (PT-PR) e vice-presidente brasileiro do
Parlamento do Mercosul
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