- Equipe de cientistas termina instalação de equipamentos que permitem envio automático de dados científicos do continente gelado
RIO- Voltou para o país neste fim de semana a equipe de quatro cientistas do Programa Antártico Brasileiro (Proantar), que fez uma expedição de um mês no módulo Criosfera 1, instalado em janeiro do ano passado no ponto mais próximo do Polo Sul já atingido pela ciência nacional, a 2.500 quilômetros da Estação Antártica Comandante Ferraz. A missão da equipe foi cumprida com a instalação de equipamentos que automatizaram o funcionamento do módulo, capaz de enviar informações de interesse científico mesmo quando desabitada.
Nesta visita, os pesquisadores também observaram que a temperatura no auge do inverno polar, entre julho e agosto, chegou a -65 Cº no módulo, a mais baixa já registrada pelo Proantar. A equipe formada por pesquisadores da Uerj, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e do Instituto Nacional de Meteorologia trouxe também dados e amostras de gelo e neve da região, de micropartículas dispersas na atmosfera antártica e de informações que ajudarão no estudo geológico do continente.
O pesquisador Jefferson Cardia Simões, líder do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia da Criosfera, esteve na região durante a instalação do módulo, inaugurado há um ano. Ele explica que, apesar da Estação Comandante Ferraz e o módulo Criosfera 1 ficarem no mesmo continente, as diferenças de condições climáticas e de terreno nas duas regiões são enormes. Se na estação brasileira o inverno é rigoroso, no entorno do Crisfera 1 vive-se o inverno do inverno. “Crio” é o radical grego para “glacial”. A distância entre as duas instalações é o equivalente ao trajeto entre Rio de Janeiro e Belém.
— Se na Estação Comandante Ferraz, -20 Cº é considerado tempo severo, na região onde está o Criosfera 1 é temperatura de um dia bom. A Antártica dos pinguins que se assiste na TV, onde está Comandante Ferraz, é completamente diferente da região do módulo, isolado por uma paisagem branca por todos os lados, com ventos e extremamente seca — descreve Simões.
A hostilidade do ambiente e da paisagem com 900 metros de espessura de gelo estudados pela equipe brasileira se aproxima das de uma expedição espacial. As roupas usadas têm de oferecer mais proteção ao frio que os pesados uniformes militares usados na Estação Comandante Ferraz, incendiada em fevereiro do ano passado. O acesso ao módulo é feito com aviões que, em vez de pneus, têm esquis no trem de pouso. A instalação brasileira tem o tamanho de um contêiner e é movida a energia solar e eólica.
— Aos poucos, estamos nos aproximando do Polo Sul. O Criosfera 1 contém trabalho com importância geopolítica e científica para o Brasil. O próximo objetivo é fazer expedições ainda mais ao sul do planeta, nos aproximando de 86 graus de latitude — ambiciona Simões, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
O módulo é a instalção mais ao sul do planeta de um país latino-americano. São dos Estados Unidos a estação mais próxima do Polo Sul, a Amundsen-Scott, habitada o ano todo, próxima ao limite de 90 º de latitude sul. O módulo brasileiro não hospeda ninguém durante o inverno. Mas se o Criosfera 1 tem orçamento de R$ 800 mil por ano, a estação americana recebe mais de R$ 600 milhões.
O nível de concentração de carbono da atmosfera na região do módulo brasileiro chegou a 395 partes por milhão, próximo ao nível encontrado em outras partes do planeta, o que prova, segundo o cientista, o alcance dos efeitos do aumento de emissões de CO2 pela humanidade. Já se aposta entre os cientistas quando que o módulo vai registrar a marca de 400 partes por milhão, o que deve ocorrer até o fim do ano e será informado em tempo real para o Brasil. No regresso ao país, na primeira semana do ano, foram trazidas amostras de micropartículas que, estudadas no decorrer do ano, podem provar a presença de carbono elementar na atmosfera próxima ao Polo Sul, o que seria outra prova do poder de dispersão da poluição gerada em indústrias, áreas urbanas e incêndios florestais.
by O Globo
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