O Doutor fugiu a padrões normais.
Injusto avaliá-lo como um qualquer
      A profissão me ensinou a guardar distância de entrevistados. Em  nome do senso crítico, aprendi desde cedo que jogador não pode ser visto como  amigo, muito menos como ídolo. Esse é sentimento de torcedor. Há exceções -  Sócrates foi uma delas. O Doutor, ou o Magrão, como todos da minha geração o  chamavam, fugiu à regra, quebrou padrões. Dentro de campo foi tão craque como  outros abençoados com o dom de domar a bola. Fora, mostrou-se incomum,  diferente. Suas atitudes e ideias não seguiram parâmetros habituais para os  boleiros. E, por métodos tradicionais, também não poderia ser avaliado. Sócrates  foi único. Injusto tratá-lo como os demais.
Sócrates destoava a partir do visual e do tipo físico. Era  muito magro, mas aguentava caneladas com coragem. Era alto e, para não perder o  equilíbrio, desenvolveu a técnica de dar passes de calcanhar. Era barbudo, numa  época em que raros jogadores por aqui ousavam ir além de bigodes. Não escondia  convicções políticas, num período em que a mão de ferro tratava de calar vozes  dissidentes. Bebia - e o fazia às claras.
Sócrates era boêmio, gostava de conversa de mesa de bar, onde  concedeu entrevistas antológica. Seu universo de interesses passava por  política, filosofia, arte, amor e... futebol, que conhecia como poucos. O jeito  despojado fascinava jovens repórteres dos idos dos anos 1970. Também éramos  barbudos, também queríamos liberdade, também imaginávamos mudar o jornalismo.  Por isso, o víamos como um de nós. Era nosso ídolo, embora fosse pecado  admiti-lo em público.
Acompanhei a carreira dele, do surgimento em Ribeirão Preto,  passando pelo auge na Democracia Corintiana e na seleção, ao declínio no fim dos  anos 1980. Emocionei-me com o gol que marcou contra a Itália, tive vontade de  dar-lhe um abraço após o fatídico 5 de julho de 1982. Me contive, para ser  isento. Naquele dia, lágrimas teimosas me escaparam por causa de uma derrota  esportiva. Agora, brotam porque se foi um grande do futebol, um Brasileiro  especial.
Caramba, me dou conta que éramos coetâneos! Entro na fase em  que se colecionam saudades: John Lennon, George Harrison, Sócrates...
 
 
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