14/06/2014 – por Mila Correa
Mulheres já ouvem muita asneira, né? Então, mulheres (e homens) com deficiência ouvem uns tipos de asneiras que muita gente nem imagina que é asneira.
E sai por aí falando achando que tá sendo gentil e educado, anjo imaculado cercado de boas intenções, mas geralmente tá sendo um chato desnecessário e ofensivo.
A seguir, algumas delas que, pfvrrr, vamos aprender pra não sair repetindo por aí:
“Nossa, mas você nem parece que é deficiente”:
Mil desculpas amigo eu perdi a aula que ensinava como faz para parecer ter uma deficiência, eu só fui lá, adquiri o pacote deficiência master e assinei a lista, não li o manual e estou aquém de suas expectativas. Caso não tenha reparado, deficiência pode ser física, auditiva, visual, até mesmo invisível (pessoas colostomizadas, por exemplo) e não dá para colocar as pessoas organizadas em prateleiras, por rótulos, porque, sempre bom lembrar, elas não são geléias. Até quem é, como eu, cadeirante, pode ser assim por causa de uma lesão medular, doença congênita, amputação, ou seja não dá pra achar que, por eu estar na cadeira de rodas, sou igual a prima da vizinha que também está.
A próxima Asneira é muito próxima da primeira e andam juntas.
“Tão linda e na cadeira de rodas ” *geralmente vem com carinha de pena*
Cara, eu sei que colocaram em sua cabeça que só mulher com os atributos x são bonitas, mas SURPRESA! Mulheres de todos os tamanhos, corpos, cores e jeitos podem ser bonitas, não precisa se espantar se a deficiência não “”””usurpou”””” minha beleza. O que me leva à próxima questão.
“Nossa mas você com essa deficiência e é tão feliz”
A deficiência NÃO é uma usurpadora de felicidade, não é um dementador. É um aspecto importante, sim, mas eu sou o que sou hoje por causa da minha deficiência, apesar da minha deficiência, graças à minha deficiência. Quando alguém fala essa besteira o que parece é “acho tão, mas tão horrível que a pessoa tenha uma deficiência que eu só posso supor que ela seja infeliz.” Minha deficiência é algo que jamais deve ser ignorado ou minimizado, mas também não é o fim do mundo, sosseguem aí.
“O que você tem?”
Pergunta geralmente feita por estranhos, pessoas que nem bom dia te deram ainda. Não me importo de falar sobre o que tenho, aliás, quem se aproxima de mim saberá com pouco tempo o que tenho, não escondo. O problema é quando a pessoa, antes de te reconhecer como ser humano, acha que tá num freak show e você tá ali pra entretê-lo com alguma história épica sobre porque ficou numa cadeira de rodas. Eu, particularmente, minto. Já falei que sofri desde um ataque de morcegos sugadores de sangue até um experimento com mentos e coca cola que não deu certo. Sabem como é, temos que dar o que o público deseja, aventura, emoção. Mas o mais legal foi quando respondi a um gatinho que me encarou a noite toda numa festa, me fazendo achar que tava afim, pra chegar e falar imediatamente “o que você tem?” e eu responder “Um babaca na minha frente”.
“Você é um exemplo!”
Muito legal também é ouvir um “nossa fico impressionada como você estuda (ou trabalha ou insira aqui qualquer outra coisa) como uma pessoa normal. Você é um exemplo. “Não, eu não sou exemplo de nada, não quero ser exemplo de nada. Sobre isso, vale ir mais além no debate e assistir a palestra maravilhosa de Stella Young sobre: “Eu não sou sua inspiração, muito obrigada”
Eu apenas faço o meu trabalho, eu não preciso de palmas, eu agradeceria só se me dessem mais acessibilidade pra eu fazer minhas coisas com cada vez mais autonomia e liberdade. Talvez assim não se espantassem tanto, porque teria cada dia mais gente com deficiência exercendo as mais variadas funções. E a vida tá aí, né pessoal, com todo mundo tendo limitações e habilidades. Cada um faz aquilo que pode, do jeito que pode, com o corpo que tem.
“Como é transar sem sentir nada lá embaixo?”
Primeiramente, quem te disse que não sente? Nem todas as pessoas que não andam perderam a sensibilidade em alguma parte do corpo. E depois, quem disse que para transar tem que sentir lá embaixo? Gente que não sente nada, nadica, tá transando muito e bem. Às vezes, até mais do que quem pergunta. Como se sexo se resumisse a penetração, a posições do kama sutra. Parem de assumir coisas sobre nós e ouçam um pouquinho.
Volto outro dia pra escrever sobre mais asneiras. Eu falei que eram muitas…
by Lugar de Mulher
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