Escritório de Marcelo Braga Nascimento, de quem o governador vem tentando se afastar nos últimos meses, é alvo de ações judiciais e está envolvido em operações financeiras heterodoxas
Conexões entre o governador João Doria e a China envolvem o Grupo de Líderes Empresariais (Lide), fundado por ele em 2003 | Foto: Joel Rodrigues/Estadão Conteúdo
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), costuma se incomodar quando seus adversários citam conexões do tucano com a China, especialmente desde que o Instituto Butantan firmou a parceria com o laboratório chinês Sinovac para a produção da CoronaVac, vacina contra a covid-19. Uma reportagem publicada nesta sexta-feira, 23, pela revista Crusoé explicita que essas conexões entre Doria e os chineses envolvem o Lide (Grupo de Líderes Empresariais), fundado em 2003 pelo hoje governador.
Segundo a reportagem, o advogado Marcelo Braga Nascimento comanda a filial chinesa do Lide, “promovendo eventos pagos e reuniões entre empresários e agentes públicos na China e no Brasil, inclusive com o próprio governador e com seu vice, Rodrigo Garcia”. A relação entre Doria e Braga teria se estreitado depois de o tucano entrar na política. Em 2017, por exemplo, o advogado espalhou dezenas de bandeiras do Brasil pelas ruas de São Paulo para fazer propaganda de seu escritório — com aval da gestão Doria, então prefeito da capital. Braga assumiu a presidência do Lide China em julho do mesmo ano, no mesmo mês em que Doria realizou sua primeira viagem oficial ao país asiático como prefeito, com o objetivo de vender projetos de parcerias público-privadas e privatizações.
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No mesmo período, Braga se tornou advogado do próprio Doria e defendeu o hoje governador paulista em um processo no qual o Ministério Público apresentou uma ação de improbidade administrativa contra o tucano por supostas fraudes em licitações para o carnaval de rua em 2018 — o processo acabou extinto pela Justiça.
Ainda de acordo com a reportagem, “o braço chinês do Lide de Doria opera, na prática, como uma espécie de unidade de negócios do escritório de Marcelo Braga”. “A seção oriental do Lide fica com a receita das anuidades pagas pelas empresas filiadas — hoje são 30 companhias — e repassa uma parte do dinheiro à matriz do Lide, onde atua o filho de Doria, pelo uso da marca. A mistura é flagrante”, diz o texto.
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A revista teve acesso a documentos que mostram alguns pagamentos recebidos pelo escritório em 2018, que chegam a R$ 2,3 milhões. “Na relação, há empresas que possuem concessão de rodovias, uma empreiteira que venceu recentemente a licitação de uma obra do metrô do governo paulista e até pagamentos da TV Bandeirantes, que anunciou no fim de 2019 uma parceria com uma companhia de mídia chinesa em um evento que contou com a presença do próprio João Doria”.
“Além das transferências feitas pelas empresas, o escritório do presidente do Lide China movimentou grandes quantidades de dinheiro em espécie, segundo o relato de um ex-funcionário que moveu uma ação trabalhista contra a banca justamente por fazer ‘serviços particulares’ para Marcelo Braga. O funcionário diz que transportou volumes elevados de dinheiro vivo desde agências bancárias na capital e outros endereços até a sede do escritório. […] Em uma das operações de transporte de dinheiro, diz o relato do funcionário, as notas estavam armazenadas em duas caixas de uísque. As movimentações de dinheiro vivo teriam sido mais intensas entre os anos de 2017 e 2018. […] Entre os pagamentos feitos pelo escritório de advocacia do presidente do Lide China, chamam atenção cheques que somam cerca de R$ 1 milhão emitidos entre julho e dezembro de 2018 a Claudio Carvalho, braço direito de Doria na prefeitura que se associou à banca de Marcelo Braga depois que o tucano renunciou ao mandato de prefeito para concorrer a governador.”
A revista também aponta que o histórico do escritório que comanda o Lide China é “desabonador quando há cifras envolvidas”. Segundo a reportagem, a banca é alvo de inquéritos policiais e uma série de ações na Justiça por suposta apropriação indébita de valores dos clientes. “Braga fez fortuna como advogado atuando basicamente em causas milionárias contra a Sabesp, a companhia de saneamento básico do governo paulista. São dezenas de processos nos quais o advogado representa condomínios, shoppings e hospitais que questionam judicialmente excessos na cobrança de tarifa de água ou esgoto. Nos últimos anos, vários clientes se deram conta de que ganharam a disputa contra a Sabesp, mas nunca viram a cor do dinheiro pago pela companhia em razão dos processos. O escritório de Braga recebia os valores, mas não repassava aos clientes que representava”, informa a revista.
Ainda segundo a reportagem, o próprio Doria, potencial candidato à Presidência da República em 2022, tem evitado manter contato com o advogado nos últimos meses, mas Braga segue comandando o braço chinês do Lide. Sobre os pagamentos recebidos pelo escritório, Braga disse à Crusoé, por meio de nota, que “as relações entre o escritório e seus clientes têm caráter privado, sem interesse público, e são protegidas por sigilo profissional previsto em lei”. A respeito das ações judiciais contra a banca, a nota diz que elas decorrem de “conflitos comuns a qualquer escritório ou empresa e não estão resolvidos até que transite em julgado a última decisão”.
O comunicado também diz que “o grupo não tem o Estado como sócio nem utiliza dinheiro público, paga seus impostos em dia e não responde a qualquer processo judicial”. “As relações do Lide China com o governador João Doria remontam unicamente ao tempo em que ele era presidente do Grupo Lide”, completa Braga.
Horas antes da publicação da reportagem da Crusoé, a assessoria do governo Doria informou que Marcelo Braga não é mais presidente do Lide China e que o cargo, hoje, seria ocupado por José Ricardo dos Santos Luz Júnior. Em seu site oficial, no entanto, o grupo apontava até quinta-feira 22 Braga como presidente.
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