segunda-feira, 7 de março de 2022

Alexandre de Moraes acumulou patrimônio milionário no serviço público

Entre 2006 e 2009, ministro da Justiça comprou oito imóveis, por R$ 4,5 milhões — incluindo dois apartamentos de luxo em São Paulo. Procurado, Moraes negou irregularidades.

by Alexandre Aragão

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Ueslei Marcelino / Reuters

Entre novembro de 2006 e agosto de 2009, o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes (PSDB), comprou uma série de imóveis de alto padrão, como apartamentos de andar inteiro e terrenos em um condomínio luxuoso.

O período coincide com o intervalo entre sua saída do governo Geraldo Alckmin (2005), a atuação no Conselho Nacional de Justiça e parte do tempo em que foi secretário do então prefeito Gilberto Kassab (2007-2010), em São Paulo.

Naquele momento, o tucano adquiriu oito imóveis que, pelos valores declarados nas escrituras, somaram R$ 4,5 milhões sem correção monetária.

O valor de face das certidões registradas em cartórios de São Paulo e Minas Gerais é inferior ao valor praticado no mercado, de acordo com corretores e documentos obtidos pela reportagem.

Quando deixou o governo Alckmin em 2005, o ex-promotor de Justiça Moraes tinha um patrimônio de classe média: dois apartamentos no bairro da Saúde e na Aclimação (áreas de classe média na capital paulista) e uma casa para passar os finais de semana em um condomínio fechado em São Roque (a 70 km de São Paulo).

A mulher dele, Viviane Barci de Moraes, recebera de herança parte de um terreno no bairro de Santo Amaro (zona sul da capital). No período, Moraes também atuou como professor universitário e recebia royalties de obras jurídicas.

Em novembro de 2006, Moraes adquiriu um apartamento de 332 m² de área privativa pelo preço declarado de R$ 2,03 milhões. O imóvel ocupa um andar inteiro do edifício Brazilian Art, no Itaim Bibi, bairro nobre da zona oeste de São Paulo.


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O edifício Brazilian Art, no Itaim Bibi.
Um documento do cartório diz que o apartamento foi comprado exclusivamente com recursos da mulher do ministro, a advogada Viviane Barci de Moraes, “não tendo seu marido contribuído de forma alguma para o seu pagamento”.

O adendo à escritura não reflete a verdade: na hora da compra do imóvel no edifício Brazilian Art, o ministro entregou seu apartamento no bairro da Saúde a fim de abater R$ 650 mil do preço total.

Apenas seis meses depois, em maio de 2007, Moraes comprou outro imóvel de alto padrão: um apartamento com 365 m² de área útil, também de andar inteiro, com cinco vagas na garagem.

O edifício Mansão Tucumã, que hoje é a residência do ministro, fica encravado numa das regiões mais nobres de São Paulo, em frente a uma das entradas do Clube Pinheiros.


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O edifício Mansão Tucumã.
Preço no papel: R$ 1,82 milhão (R$ 3,27 milhões atualizados), conforme a matrícula. Ou: R$ 4,1 milhões, segundo a tabela da prefeitura. Em 2014, a propriedade deste apartamento foi transferida para sua empresa, a Lex Estudos Jurídicos.

Quando comprou os dois apartamentos, Alexandre de Moraes exercia o cargo de conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), cujo salário bruto à época era de R$ 23.200.

O apartamento no Itaim foi vendido em julho de 2010, quando ele estava saindo da gestão Kassab, pelo valor declarado de R$ 3,02 milhões — lucro de R$ 1 milhão em relação ao valor declarado na compra em 2006.

Pouco depois, o ministro comprou um imóvel de 217 m² para abrigar seu escritório de advocacia, no mesmo bairro, por R$ 850 mil.

As compras continuaram na gestão Kassab
Alexandre de Moraes foi nomeado secretário por Kassab em agosto de 2007, menos de um ano após comprar os dois apartamentos.

Nessa época, quando esteve à frente das pastas de Transporte e Serviços — cargos que acumulou às presidências da SPTrans e da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) —, o ministro adquiriu mais seis imóveis:
Dezembro de 2007: um apartamento para a mãe dele, na Aclimação, pelo valor declarado de R$ 145 mil (R$ 255 mil em valores atualizados);

Fevereiro de 2008: um apartamento em Perdizes, pelo valor declarado de R$ 200 mil (R$ 351 mil);
Junho de 2009: um apartamento no Cambuci, por R$ 150 mil (R$ 242 mil);

Junho de 2009: dois terrenos em São Roque, dentro de um condomínio de luxo em que o ministro tem uma casa de campo desde 2001, por R$ 100 mil (R$ 162 mil);

Agosto de 2009: um terço do Sítio Novo Horizonte, em Inimutaba (MG), por R$ 40 mil (R$ 65 mil).

A casa de campo
Dois terrenos comprados por Moraes quando era secretário de Kassab, em junho de 2009, serviram para aumentar um lote que ele já possuía. Na época, o ministro adquiriu terras no condomínio Patrimônio do Carmo, uma reserva ambiental em São Roque (SP) com residências de luxo.

O tucano já era dono de outros dois lotes, comprados em 2001, onde fica a casa de campo da família. O imóvel fica em um terreno íngreme, em um nível mais baixo que a rua, tem dois andares e 411 m² de área construída, segundo o registro da Prefeitura de São Roque.

Para efeito comparativo, uma casa na mesma rua da que pertence a Moraes, com 100 m² a mais de área construída — mas um terreno menor —, está à venda por R$ 2,2 milhões no mercado.


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O sítio de Moraes em um condomínio de luxo em São Roque. Num terreno íngreme, o imóvel fica escondido em relação ao nível da rua.

Os terrenos comprados pelo ministro em 2009 são contíguos aos que já pertenciam a ele — a área total dobrou de tamanho, somando 5.000 m² — e custaram, segundo a documentação, R$ 100 mil (R$ 162 mil em valores atualizados).

Em março de 2016, um imóvel no condomínio com características semelhantes ao do ministro, mas um terreno menor (cerca de 3.000 m²), foi avaliado em R$ 1 milhão em um leilão judicial.

Lotes sem construções que foram a leilão nos últimos anos, todos com cerca de 1250 m² de área — metade do tamanho do adquirido por Moraes em 2009 —, no mesmo setor do condomínio, foram avaliados entre R$ 150 mil e R$ 200 mil.

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BuzzFeed / Google - Reprodução

Imagem de satélite do Google, sobreposta com a planta do condomínio na área em que ficam os terrenos.

O condomínio é de alto padrão e tem segurança reforçada, incluindo cinco guaritas distribuídas pela área — equivalente a uma cidade de pequeno porte —, com vigilantes de uma empresa privada portando armas de fogo.

Uma corretora de imóveis que trabalha na região relatou ao BuzzFeed Brasil que o aparato foi instalado porque o condomínio tem diversos políticos, magistrados e empresários entre seus associados.

As terras mineiras

Dois meses após adquirir as novas terras em São Roque, Alexandre de Moraes comprou parte de outra propriedade rural com 40 hectares, desta vez no município de Inimutaba (182 km de Belo Horizonte), no centro do Estado de Minas Gerais. Cada hectare equivale a um campo de futebol.

Junto com dois amigos do meio jurídico — os juízes Samuel Francisco Mourão Neto e Rogério Marrone de Castro Sampaio, antigos colegas da Faculdade de Direito da USP —, Moraes dividiu o Sítio Novo Horizonte e cada um declarou ter pago R$ 40 mil (R$ 65 mil em valores atualizados).

Reprodução

Corretores de imóveis rurais na região estimam que o preço de mercado do hectare no município de Inimutaba varie entre R$ 10 mil e R$ 12 mil.
Reprodução

Enquanto era secretário de Kassab, o ministro se desfez de apenas um imóvel: o apartamento de 182 m² na Aclimação, havia sido comprado na planta em 1998, por R$ 180 mil (R$ 798 mil em valores atualizados).

Moraes o vendeu em julho de 2008, pelo valor declarado de R$ 750 mil, a Luiz Herrmann Júnior, presidente da Editora Atlas — responsável por publicar a obra jurídica do ministro, que integra o conselho editorial da casa.

Foi um negócio ruim: a matrícula do apartamento registra que, um mês após comprá-lo, Herrmann levou prejuízo de R$ 150 mil, ao revendê-lo por R$ 600 mil.
Compras de imóveis não coincidem com atuação na iniciativa privada

Foi só quando deixou a gestão Kassab que Moraes fez a primeira incursão de sua carreira na iniciativa privada. A banca de advogados fundada por Alexandre de Moraes, que levava o nome dele, foi rebatizada com o sobrenome de Viviane após o tucano assumir o ministério — hoje, chama-se Barci de Moraes Advogados Associados.

Em outubro, o jornal Folha de S.Paulo revelou que a firma do ministro recebeu R$ 4 milhões da JHSF, empresa imobiliária investigada na Operação Acrônimo.

Divulgação

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