segunda-feira, 2 de abril de 2012

Ex-detentos, realidade e preconceito...


Quem passa pelo Sistema Penitenciário Bra­­sileiro, mesmo após ter cumprido a pena que foi estabelecida pelo Es­­tado, estará marcado para sempre pelo es­­tigma de ser um ex-presidiário. Com esse peso nas costas, fica difícil conseguir um emprego e a tão almejada ressocialização. Reportagem publicada pela Gazeta do Povo no último domingo re­­ve­­la o dra­­ma de presos que são despejados na sociedade após anos de encarceramento sem que, du­­rante esse período, o Estado tenha tomado providências para que essas pessoas se tornassem aptas a encarar o novo desafio. Há o preconceito, a dificuldade de arranjar trabalho, a necessidade de se readaptar. E há o medo de cair de novo em erro.
Tal medo é justificável tendo em vista que cerca de 42% de ex-penitenciários volta a praticar crimes e acaba na prisão mais uma vez. Ou seja, o sistema pune, mas não consegue cumprir a função de educar e de capacitar essas pessoas para enfrentar as mesmas condições que as levaram a praticar o primeiro delito. Como disse à Gazeta do Povo o coordenador nacional do Mutirão Car­­cerário promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o juiz federal Erivaldo Ribeiro dos Santos, é preciso dar oportunidade aos egressos. Mas é muito difícil isso acontecer no modelo atual tendo em vista o déficit de 180 mil vagas no siste­­ma penitenciário. “Em presídio superlotado”, diz ele, “não se consegue fazer curso de capacitação, de educação, alfabetização e muitos presos são analfabetos funcionais.”
Felizmente a matéria da Gazeta do Povo mostra que há alguns exemplos positivos e esperançosos de penitenciárias aqui mesmo no Paraná que conseguem dar condições para que o presidiário mude e, uma vez fora do sistema, volte a se tornar um ci­­dadão com ficha limpa. Esse é o caso da Penitenciária Industrial de Cascavel, no Oeste do estado, que indica que cerca de 70% dos que deixaram a instituição voltam a se reintegrar na sociedade.
Mas isso não é fácil. Afinal, as manchetes que tratam do tema mais comuns dos jornais são as de que ex-presidiários, que deixam suas celas por terem cumprido suas penas ou, ainda, detentos que por apresentarem bom comportamento ganham o direito de visitar seus familiares em épocas festivas, acabam se tornando reincidentes. Isso quando não cometem crimes ou assassinatos mais violentos do que praticaram anteriormente e pelos quais foram condenados. Esses fatos deixam a sociedade receosa em oferecer empregos para ex-presos, que acabam caindo mais uma vez na criminalidade. É um círculo negativo que parece não ter fim.
Tanto que, a rigor, as iniciativas de oferecer oportunidades concretas para ex-presidiários são bem tímidas no Brasil. Inclusive por parte do Estado, que falha ao não acompanhar o egresso após a libertação.
O sistema prisional de hoje é um trauma para a sociedade, especialmente nos países em desenvolvimento, nos quais os índices de criminalidade cresceram de forma exponencial nas últimas duas décadas. Em razão disso, a maior preocupação das autoridades e dos cidadãos inseguros é brigar para melhorar esse quadro. Mas, no Brasil, além da falta de vagas e de condições adequadas para a sobrevivência de qualquer ser humano dentro do sistema carcerário, a questão da busca de uma nova chance para ex-detentos fica claramente em segundo plano.
O trauma da sociedade é realmente grande quanto a tudo isso, especialmente para aqueles que perderam pessoas queridas em atos de violência. No entanto, num Estado Democrático de Direito, não há outro remédio senão buscar caminhos que possam dar uma trégua a essa guerra não declarada. É necessário que as leis existentes sejam cumpridas e penas sejam aplicadas para combater os criminosos. Mas mais importante que a aplicação da lei são os investimentos em educação e em condições de vida dignas para combater realmente a criminalidade. Se o Estado falha nesse ponto, não pode falhar uma segunda vez com quem está cumprindo sua pena. É preciso encontrar caminhos sólidos para aqueles que pagaram pelos seus crimes e desejam viver novamente em paz. Caso contrário, ficaremos presos nesse círculo que só tende a se alargar.
A sociedade, com o apoio do Estado, precisa fazer um grande esforço para romper essas barreiras, que mais atrasam do que defendem os cidadãos. As iniciativas de mutirões para liberar presos que já cumpriram suas penas, mas permanecem encarcerados, como as que estão sendo feitas em todo o país, e as políticas de ressocialização, a exemplo da Penitenciária Industrial de Cascavel, mostram que é possível avançar. Só com esses horizontes ampliados os cidadãos terão mais paz e segurança.
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