domingo, 11 de abril de 2021

06/01/2004 China vai exterminar gatos para evitar nova epidemia de Sars












Jim Yardley
EM BEIJING, CHINA

As autoridades das províncias do sul da China iniciaram nesta segunda-feira (05/01) uma operação destinada a abater centenas de gatos-de-algália (mamífero carnívoro de pele cinzenta e manchas escuras, com cerca de 50 cm de cumprimento, utilizado na culinária chinesa), como medida preventiva destinada a deter a Sars (pneumonia asiática).

A OMS, que enviou um alerta ao país nesta segunda, advertiu que um abate efetuado numa escala tão grande poderia apresentar graves riscos sanitários, caso não sejam tomadas as precauções necessárias, inclusive a possibilidade de ocorrerem mais casos de infecção.

Algumas horas antes, nesta segunda, os especialistas que atuam junto à organização e ao ministério chinês da Saúde confirmaram que um homem de 32 anos em Guangdong é a primeira pessoa da China continental a ser infetada pela Sars desde a pandemia inicial que havia sido debelada em meados de 2003. Os especialistas da OMS acrescentaram que o caso deste homem parece ser isolado e enfatizou que ele não representa, de forma alguma, uma "ameaça imediata para a saúde pública" no sul da China.

Após terem divulgado o seu comunicado sobre os gatos-de-algália, os funcionários da OMS recomendaram aos líderes da província de Guangdong que fosse feito um estudo prévio para avaliar os riscos que a operação comporta, antes de abater os cerca de 10 mil gatos-de-algália em cativeiro que foram recenseados na província. Eles explicaram que as autoridades de Guangdong deveriam se precaver contra a possível contaminação do solo ou da água durante o abate, e que elas deveriam também garantir que os trabalhadores encarregados desta operação não sejam expostos ao vírus.

"Nós recomendamos expressamente às autoridades desta região da China para que elas tomem todos os cuidados possíveis", declarou o médico Jeffrey Gilbert, um especialista em animais que atua no escritório da OMS em Beijing, durante uma coletiva de imprensa que ocorreu na noite desta segunda. "Nós temos boas razões para acreditar que existe um perigo potencial muito grande".

Entretanto, os funcionários chineses pareciam estar determinados a agir prontamente. Alguns cientistas suspeitam de que a Sars tenha sido transmitida a seres humanos por intermédio dos gatos-de-algália. Mesmo assim, várias agências de notícias estatais do país informaram que as autoridades chinesas haviam dado a ordem de abater os gatos-de-algália desde sábado. Não foi divulgado nenhum detalhe sobre como ou onde o abate seria realizado.

A Organização Mundial da Saúde elogiou os funcionários de Guangdong pela maneira com a qual eles lidaram com o caso, a partir do momento em que foi confirmado o diagnóstico de que um homem é portador da Sars, e acrescentou que, apesar de tudo, toda e qualquer pessoa deveria se sentir segura ao viajar nessa província ou em qualquer outro lugar da China.

Estes elogios contrastavam drasticamente com a situação do ano passado, quando a organização havia alertado os viajantes para evitarem a região de Guangdong e, mais tarde, a cidade de Beijing. Estas advertências haviam sido proferidas depois de a disseminação da doença ter sido interrompida.

"Nós estamos convencidos de que o sistema que foi implantado em Guangdong está funcionando", declarou Henk Bekedam, o representante da organização em Beijing.

Contudo, essas manifestações de confiança intervieram no final de um dia em que as preocupações em torno de um novo alastramento da Sars aumentaram em toda a Ásia.

Os responsáveis dos serviços sanitários nas Filipinas colocaram em quarentena uma mulher que havia desenvolvido uma febre depois de uma viagem de avião de Hong Kong. O seu marido também foi colocado em quarentena, com febre. Entretanto, poderia demorar vários dias até que se consiga determinar se o casal está mesmo acometido da Sars.

O Representante da OMS nas Filipinas, Jean-Marc Olive, disse estar pessoalmente cético de que se trata de um caso de Sars, uma vez que não foi registrado em Hong Kong nenhum novo caso da doença. Mas ele acrescentou que o governo das Filipinas estava tomando as precauções corretas.

Houve também notícias em Guangzhou, a capital da província de Guangdong, segundo as quais uma mulher, possivelmente uma trabalhadora de um mercado de carne de animais selvagens, havia sido hospitalizada com sintomas compatíveis com os da Sars. Um funcionário do serviço sanitário local declarou numa entrevista coletiva que tais notícias eram "sem fundamento".

No entanto, ele confirmou que a trabalhadora havia sido hospitalizada com uma febre que foi diagnosticada como tendo sido causada por uma pneumonia.

Nas primeiras horas do dia, o principal especialista em Sars na China, o médico Zhong Nanshan, anunciou em Hong Kong que o paciente portador da Sars em Guangdong pareceu ter sido acometido de um novo surto provocado pelo vírus, o qual é geneticamente similar aos surtos constatados nos gatos-de-algália.

Ele também anunciou as descobertas feitas no decorrer de um estudo que foi desenvolvido junto com microbiologistas de Hong Kong, segundo as quais haveria uma grande preponderância de vírus vinculados à Sars no organismo dos gatos-de-algária.

Os gourmets do sul da China têm a reputação de serem temerários. Com efeito, muitos deles consideram o gato-de-algália, uma criatura parecida com o furão e parente do mangusto - uma guloseima a ser degustada sobretudo no inverno.

Durante a erupção inicial da epidemia de Sars, as autoridades baniram a venda dos gatos-de-algária.

Mas, a partir do mês de agosto, apesar das advertências dos cientistas, as autoridades de Guangdong suspenderam essa proibição, e os gatos-de-algária acabaram voltando para os cardápios locais.

Agora, as autoridades de Guangdong afirmam que elas farão um grande mutirão com objetivo de abater todo e qualquer gato-de-algária nos mercados, nos restaurantes e nas fazendas onde eles são criados. Em algumas feiras, o mutirão foi iniciado já nesta segunda. O governo também anunciou o projeto de registrar todos os trabalhadores que atuam na criação e na comercialização de animais selvagens.

O doutor Jeffrey Gilbert, que qualificou o plano de extermínio de "um passo radical", afirmou que todo abate deveria ser feito no quadro de ambientes controlados e por meio de regulamentos estritos, assim como tem sido feito em outros países onde animais foram abatidos para prevenir o alastramento de doenças.

Ele acrescentou que a pesquisa científica havia apontado os gatos-de-algária como prováveis suspeitos mas que ela ainda não havia encontrado a prova definitiva de que esses animais são a fonte da Sars. Ele observou que as novas descobertas sobre os gatos-de-algária que foram anunciadas em Hong Kong ainda precisam ser publicadas ou submetidas a uma verificação por parte de outros cientistas.

Contudo, ele também afirmou que uma tal descoberta poderia proporcionar grandes recompensas no plano científico, e que os responsáveis deveriam estar atentos para não "destruir as evidências".

Os cientistas ainda não foram capazes de determinar de que maneira o homem doente em Guangzhou contraiu a Sars. Algumas agências de notícias chinesas sugeriram que ratos podem estar envolvidos. Mas os responsáveis da OMS afirmaram que 30 ratos que foram pegos em armadilhas nas proximidades do apartamento onde o homem morava haviam sido submetidos a testes para verificar se eles eram portadores do vírus, e todos foram negativos.
Tradução: Jean-Yves de Neufville 

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