Você sabe o que é MAV? Inventada no 4º Congresso do PT, em 2011, a sigla significaMilitância em Ambientes Virtuais. São núcleos de militantes treinados para operar na internet, em publicações e redes sociais, segundo orientações partidárias. A ordem é fabricar correntes volumosas de opinião articuladas em torno dos assuntos do momento.
Um centro político define pautas, escolhe alvos e escreve uma coleção de frases básicas. Os militantes as difundem, com variações pequenas, multiplicando suas vozes pela produção em massa de pseudônimos. No fim do arcoíris, um Pensador Coletivo fala a mesma coisa em todos os lugares, fazendo-se passar por multidões de indivíduos anônimos.
Você pode não saber o que é MAV, mas ele conversa com você todos os dias.
O Pensador Coletivo se preocupa imensamente com a crítica ao governo. Os sistemas políticos pluralistas estão sustentados pelo elogio da dissonância: a crítica é benéfica para o governo porque descortina problemas que não seriam enxergados num regime monolítico.
O Pensador Coletivo não concorda com esse princípio democrático: seu imperativo é rebater a crítica imediatamente, evitando que o vírus da dúvida se espalhe pelo tecido social.
Uma tática preferencial é acusar o crítico de estar a serviço de interesses de malévolos terceiros: um partido adversário, "a mídia", "a burguesia", os EUA ou tudo isso junto.
É que, por sua própria natureza, o Pensador Coletivo não crê na hipótese de existência da opinião individual.
É que, por sua própria natureza, o Pensador Coletivo não crê na hipótese de existência da opinião individual.
O Pensador Coletivo abomina argumentos específicos.
Seu centro político não tem tempo para refletir sobre textos críticos e formular réplicas substanciais. Os militantes difusores não têm a sofisticação intelectual indispensável para refrasear sentenças complexas.
Você está diante do Pensador Coletivo quando se depara com fórmulas genéricas exibidas como refutações de argumentos específicos. O uso dos termos "elitista", "preconceituoso" e "privatizante", assim como suas variantes, é um forte indício de que seu interlocutor não é um indivíduo, mas o Pensador Coletivo.
O Pensador Coletivo interpreta o debate público como uma guerra.
"A guerra de guerrilha na internet é a informação e a contrainformação", explica o deputado André Vargas, um chefe do MAV.
No seu mundo ideal, os dissidentes seriam enxotados da praça pública. Como, no mundo real, eles circulam por aí, a alternativa é pregar-lhes o rótulo de "inimigos do povo".
Você provavelmente conversa com o Pensador Coletivo quando, no lugar de uma resposta argumentada, encontra qualificativos desairosos dirigidos contra o autor de uma crítica cujo conteúdo é ignorado. "Direitista", "reacionário" e "racista" são as ofensas do manual, mas existem outras. Um expediente comum é adicionar ao impropério a acusação de que o crítico "dissemina o ódio".
O Pensador Coletivo é uma máquina política regida pela lógica da eficiência, não pela ética do intercâmbio de ideias.
Por isso, ele nunca se deixa intimidar pela exigência de consistência argumentativa. Suzana Singer seguiu a cartilha do Pensador Coletivo ao rotular o colunista Reinaldo Azevedo como um "rottweiler feroz" para, na sequência, solicitar candidamente um "bom nível de conversa".
Nesse passo, trocou a função de ombudsman da Folha pela de Censora de Opinião. Contudo, ela não pertence ao MAV. Os procedimentos doPensador Coletivo estão disponíveis nas latas de lixo de nossa vida pública: mimetizá-los é, apenas, uma questão de gosto.
Existem similares ao MAV em outros partidos?
O conceito do Pensador Coletivo ajusta-se melhor às correntes políticas que se acreditam possuidoras da chave da porta do Futuro.
Mas, na era da internet, e na hora de uma campanha eleitoral, o invento será copiado. Pense nisso pelo lado bom: identificar robôs de opinião é um joguinho que tem a sua graça.
by Demétrio Magnoli é Sociólogo
Fonte: blog Alerta Total
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