Natália Correia foi uma intelectual de reconhecida independência e demolidor sarcasmo crítico com a qual eu tive algumas divergências, mas muitas cumplicidades, mormente quando ambos trabalhámos, eu como jornalista e ela como directora na “Vida Mundial”, uma revista do extinto grupo “O Século”, pouco antes da morte de Sá Carneiro.
Se hoje fosse viva continuaria a ser, seguramente, uma proeminente defensora da democracia, da liberdade e, sobretudo, da independência e soberania de Portugal. Estaria, certamente, na linha da frente de uma ampla frente de democratas e patriotas que, para além de se recusarem a pagar uma dívida que não foi contraída pelo povo, nem o povo dela retirou qualquer benefício para si, apostaria na preparação de Portugal para a saída do euro e da União Europeia.
Seria, indubitavelmente uma defensora do derrube deste governo de serventuários, protagonizado pelos traidores nacionais Coelho e Portas, ambos tutelados por Cavaco, e posso mesmo imaginar a truculência com que apelaria à expulsão da tróica germano-imperialista de Portugal, segundo ela, a Mátria de todos nós!
Vem este longo intróito a propósito de declarações suas, na década de 80 do século XX – há mais de 30 anos – sobre a adesão de Portugal à então CEE e as consequências que dessa adesão adviriam para o povo português. Seguramente que, se democratas e patriotas como Natália Correia saíssem hoje da letargia em que o armário os colocou, teríamos hoje a fibra de quem, em vida, nunca se calou perante a injustiça e a exploração, e mais próximo estaria o fim deste governo que se presta a vender aos grandes grupos financeiros e bancários europeus – com os germânicos à cabeça – pelos 30 dinheiros da traição, os trabalhadores e o povo português, e o país!
Sem mais delongas, portanto, passo a reproduzir o que Natália Correia escreveu em "O Botequim da Liberdade", de Fernando Dacosta:
"A nossa entrada (na CEE) vai provocar gravíssimos retrocessos no país, a Europa não é solidária com ninguém, explorar-nos-á miseravelmente como grande agiota que nunca deixou de ser. A sua vocação é ser colonialista".
"A sua influência (dos retornados) na sociedade portuguesa não vai sentir-se apenas agora, embora seja imensa. Vai dar-se sobretudo quando os seus filhos, hoje crianças, crescerem e tomarem o poder. Essa será uma geração bem preparada e determinada, sobretudo muito realista devido ao trauma da descolonização, que não compreendeu nem aceitou, nem esqueceu. Os genes de África estão nela para sempre, dando-lhe visões do país diferentes das nossas. Mais largas mas menos profundas. Isso levará os que desempenharem cargos de responsabilidade a cair na tentação de querer modificar-nos, por pulsões inconscientes de, sei lá, talvez vingança!"
"Portugal vai entrar num tempo de subcultura, de retrocesso cultural, como toda a Europa, todo o Ocidente".
"Mais de oitenta por cento do que fazemos não serve para nada. E ainda querem que trabalhemos mais. Para quê? Além disso, a produtividade hoje não depende já do esforço humano, mas da sofisticação tecnológica".
"Os neoliberais vão tentar destruir os sistemas sociais existentes, sobretudo os dirigidos aos idosos. Só me espanta que perante esta realidade ainda haja pessoas a pôr gente neste desgraçado mundo e votos neste reaccionário centrão".
"Há a cultura, a fé, o amor, a solidariedade. Que será, porém, de Portugal quando deixar de ter dirigentes que acreditem nestes valores?"
"As primeiras décadas do próximo milénio serão terríveis. Miséria, fome, corrupção, desemprego, violência, abater-se-ão aqui por muito tempo. A Comunidade Europeia vai ser um logro. O Serviço Nacional de Saúde, a maior conquista do 25 de Abril, e Estado Social e a independência nacional sofrerão gravíssimas rupturas. Abandonados, os idosos vão definhar, morrer, por falta de assistência e de comida. Espoliada, a classe média declinará, só haverá muito ricos e muito pobres. A indiferença que se observa ante, por exemplo, o desmoronar das cidades e o incêndio das florestas é uma antecipação disso, de outras derrocadas a vir".
Caso para reafirmar a coerência daqueles que, como os marxistas-leninistas, afirmaram então – e continuam a demonstrar – que não seria Portugal a entrar na CEE, mas esta superestrutura do imperialismo alemão que entraria pelo nosso país adentro e o transformaria – como está a transformar – num protectorado ou colónia.
Ousar Lutar é Ousar Vencer! Mas, é também demonstrar respeito pela memória de todos aqueles democratas e patriotas, da estirpe de Natália Correia, que persistiram e continuam a persistir em lutar pelos interesses do povo e se apresentaram e se apresentam de peito aberto, mãos e cara lavada, a todos aqueles que quiseram - e persistem nesse objectivo - vender a soberania do país e os interesses do povo a potência externa
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