terça-feira, 24 de setembro de 2019

VOCÊ SABE O QUE É GASLIGHTING?

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É uma forma de abuso psicológico em que informações são omitidas, distorcidas ou inventadas para fazer a vítima duvidar de seus sentimentos
Sabe aquela cena clássica em que o marido, mesmo tendo sua traição descoberta, diz à esposa que ela está vendo coisas onde não tem? Pois essa atitude hoje atende pelo nome de gaslighting, termo tomado emprestado do filme americano Gaslight, de 1944. No roteiro, um homem, entre outras táticas para abalar e confundir, apaga e acende as luzes da casa tentando levar a esposa a pensar que enlouqueceu.
Isso porque ele descobre que ficará com a fortuna da mulher se ela for internada como doente mental. “Essa é uma forma de abuso psicológico em que informações são omitidas, distorcidas ou inventadas para fazer a vítima duvidar de seus sentimentos, suas percepções e, em alguns casos, como no filme, até de sua sanidade”, define a psicóloga Julia Maria Alves, orientadora profissional e de carreira em São Paulo.
A psicanalista Simone Demolinari, de Belo Horizonte, completa alertando que, se a prática abusiva era inicialmente mais observada no contexto amoroso, agora está em todas as áreas da vida. “Vemos na família, nas amizades, no ambiente de trabalho”, diz. “Gosto de definir como um crime psicológico, em que uma pessoa faz com que a outra pense não estar com a razão justamente quando ela tem certeza absoluta de algo.”
Originalmente, segundo a psicanalista mineira, as vítimas eram as mulheres. Até hoje, o cenário não mudou quase nada. A professora Valeska Zanello, doutora e pesquisadora de saúde mental e gênero na Universidade de Brasília, afirma que não dá para comparar o volume de gaslighting que eles e elas sofrem. “Existe na nossa sociedade uma hierarquia com domínio bem masculino, e, nesse jogo de poder, os homens são mais encorajados a fazer gaslighting contra as mulheres, entre outras formas de violência”, explica Valeska. O pior é que essa prática costuma ser particularmente danosa para elas.
“Existe na sociedade uma hierarquia com domínio bem masculino, e os homens são mais encorajados a fazer gaslighting contra as mulheres”, Valeska zanello, pesquisadora.
A publicitária paulistana Lorena*, 34 anos, sofreu bastante nas mãos de um chefe. Na empresa em que trabalhava, havia uma política de verificação periódica de desempenho, com bonificação para os melhores colocados. Lorena foi contemplada duas vezes seguidas. Estava satisfeita até descobrir que um colega que ocupava um cargo idêntico ganhava mais e trabalhava menos horas.
“Fui conversar com meu superior, mas, para minha surpresa, ele alegou que eu não era tão competente quanto meu colega. Como assim, se a própria empresa reconhecia meu talento nos feedbacks regulares?”, lembra, indignada. Segundo ela, o chefe desfiou uma série de argumentos, todos falsos, como o de que o colega tinha mais experiência e mais afazeres do que ela, o que justificava os reais a mais dele. “Quando discordei, ele disse que eu era ambiciosa demais e deveria tomar cuidado com isso para não prejudicar minha carreira”, conta. “Tinha ido conversar cheia de razão, mas deixei a mesa do chefe achando que meu pedido não fazia tanto sentido. Fiquei até com a sensação de que estava sendo ingrata.”
A psicanalista Simone explica que o objetivo de quem comete o abuso é se favorecer – no caso de Lorena, a vantagem do chefe era não dar aumento a ela – ou, então, sair de uma situação desconfortável. “A pessoa que pratica gaslighting está, enfim, visando beneficiar-se às custas do desrespeito ao outro. Mas, se confrontada com a situação, não admite”, pontua Simone.
Ela recorda o caso de outro gestor que, cobrando hora extra dos subordinados, sempre afirmava que na véspera havia permanecido no escritório madrugada adentro, sendo que os funcionários sabiam que tinha ido embora por volta das 10 da noite. “Ele insistia em sua versão falsa até quando o viam entrando no carro. Dizia que eles o tinham confundido com outra pessoa ou que só havia ido pegar algo no veículo e voltado. É comum quem faz gaslighting não admitir as próprias mentiras e distorções da realidade, reafirmando sua versão dos fatos e defendendo seu ponto de vista até o fim”, afirma Simone.
“Eu me sentia um lixo”
O psicanalista paulistano Jorge Forbes lembra que ninguém gosta de ser desmascarado, mas que a insistência em desmentir os fatos, como no caso do chefe citado ou em situações envolvendo políticos que, embora tenham áudios vazados e sejam surpreendidos com malas de dinheiro, alegam inocência, pode indicar ausência de freios morais.
“Há quem, mesmo mentindo para não ser descoberto ou distorcendo os argumentos do outro, experimente um desconforto pelo que fez e prometa a si mesmo não repetir, ainda que reincida”, ele analisa. “Mas existe quem não tenha crise alguma de consciência e só esteja interessado em proteger a própria lógica, sem ouvir, sem se preocupar, sem se sentir mal.”
É difícil traçar um perfil exato do abusador nesses casos. “Embora não dê para generalizar, podemos falar em pessoas que têm muita dificuldade em admitir os próprios erros e, no fundo, possuem uma insegurança que as fazem diminuir o outro para se engrandecerem”, resume a psicóloga Julia Maria. Segundo ela, às vezes, elas podem até sentir prazer ao fazer o outro de bobo.
“É mais fácil uma funcionária passar por situações de desempoderamento do que um funcionário, porque ele ocupa um lugar de privilégio, enquanto ela costuma ser mais questionada e, por isso, cai mais facilmente na armadilha de duvidar de si mesma”, opina Valeska. Ciladas para fazer a mulher hesitar, de fato, proliferam nas empresas. “Por exemplo, se ela se impõe ao receber uma cantada do chefe, é chamada de chata ou mal-amada. Se sobe na carreira, dizem que é porque transou com alguém. De tanto ouvir esse tipo de coisa, ela pode questionar seu mérito”, completa Valeska.
“Tinha ido conversar cheia de razão, mas deixei a mesa do chefe achando que meu pedido não fazia tanto sentido”, Lorena*, publicitária.
A verdade é que muito mais frases desabonadoras atingem as mulheres cotidianamente. Exemplo? “Você é sensível demais.” Há outras, como “Nossa, quanto escândalo por uma bobagem!” e “Cadê seu senso de humor?”. Talvez a mais famosa seja “Você está louca?”. As vítimas ficam com a autoconfiança abalada e podem desenvolver ansiedade e depressão.
Aline Costa, 28 anos, paulista de Hortolândia, lembra com sofrimento de quando trabalhava como assistente em uma escola para surdos e estava grávida pela segunda vez. Era uma gestação de alto risco, devido a um diagnóstico de pré-eclâmpsia que havia recebido na primeira gravidez. Sua pressão estava sempre alta. “Quando precisava sair para a emergência, minha chefe me ligava antes que chegasse ao hospital e me ameaçava dizendo que eu estava abandonando o trabalho, que não podia mesmo confiar em mim e que eu era incompetente”, relata.
Depois, quando teve pneumonia, Aline ficou uma semana afastada. A chefe voltou a atacar acusando-a de estar prejudicando o andamento pedagógico da escola. “Eu me sentia um lixo nessas horas, ficava confusa, me questionava”, conta. “Hoje parei de achar que o problema sou eu”, afirma Aline, já em outro emprego e após muita terapia.
Tentar o diálogo com o agressor é válido, mas nem sempre adianta. “Se a pessoa for sádica e sentir prazer em diminuir o outro, a conversa não será produtiva”, previne a psicóloga Julia. Em empresas pequenas, muitas vezes não há a quem recorrer em casos assim, e a única saída é mudar de departamento ou de emprego. “Disseminar a existência dessa forma de violência é a melhor maneira de preveni-la”, acrescenta.
De acordo com Simone, dificilmente um chefe habituado a tratar os funcionários desse modo agirá assim apenas com uma pessoa. “Portanto, se você costuma sair confusa e triste das conversas, se sente que há algo errado, pode ser bom conversar com colegas para saber se outros estão passando por algo parecido e até avaliar a possibilidade de comunicar ao RH”, indica Simone.
Nesse aspecto, completa a especialista, sofrer gaslighting no trabalho pode ser mais delicado do que em outros ambientes. Vale tomar cuidado com aqueles que aproveitam para fazer fofocas e criar intrigas. “É diferente de quando acontece em uma relação de amizade. Mas há um lado bom. Quanto mais pessoas testemunharem, mais o time das vítimas sairá fortalecido e o agressor intimidado.”
Qualquer um está sujeito a sofrer gaslighting, não apenas “pessoas fracas”. “O problema é o agressor, que usa os pontos fracos dos outros para diminuí-los e manipulá-los”, diz Simone. “Nunca se deve culpar a vítima.” Valeska, aliás, orienta as mulheres a se unirem. “É importante se organizar e nunca se calar, pois fingir que não está vendo a violência pode causar grande impacto mental”, avalia. “Nos casos de violência de gênero, que as mulheres sofrem, é fundamental tirar do individual e coletivizar, no trabalho e fora dele.”
Fique de olho em outras violências de gênero
Manterrupting
  • A prática de interromper uma mulher quando ela está falando.
Bropriating
  • Levar os créditos por suas ideias.
Mansplaining
  • Explicar algo de forma didática, como se ela não fosse capaz de entender.

Sobre as "Agressões Inusitadas"


    





 O fenômeno das "agressões inusitadas" é a doença de um mundo que descartou a figura do pai


Fred Melo Paiva


      Jorge Forbes é um psicanalista capaz de explicar Lacan citando Fernando Pessoa, Chico Buarque, Drummond, Roberto Carlos. Até Chitãozinho & Xororó. Isso não significa que dê explicações descomplicadas, abraçando a causa, muito em voga, das análises simplórias embora pretensamente profundas. A sorte é que, a cada meia hora de conversa, tem a mania professoral de fazer um breve resumo da ópera, sempre rabiscando figuras geométricas em uma folha de papel. É assim que se entende que Forbes tem uma boa tese: a de que estamos em um mundo completamente novo, no qual pai, mãe, chefe e padre, entre outros ilustres personagens, estão totalmente por fora. A novidade, ele garante, Freud não explica.

     Aos 51 anos, Jorge Forbes já publicou dois livros e organizou outros três. Médico psiquiatra, abraçou a psicanálise e foi aluno de Jacques Lacan na Paris da segunda metade dos anos 70. Desde então vive entre São Paulo e a capital francesa. Paulistano, filho de uma elite bem-educada, foi também professor de Lingüística e Semiótica na Universidade de São Paulo. É membro da Escola Européia de Psicanálise e presidente do Instituto da Psicanálise Lacaniana. É um sujeito que ri fácil. Mas fecha a cara para Drauzio Varella, que, segundo ele, "acha que a boa vida depende de comer uma quantidade de sal que não absorva toda a água do organismo". Contrário a esse pragmatismo fisiológico, Forbes gosta mesmo é de contar que "Darcy Ribeiro mandou desligar os aparelhos do hospital e foi morrer junto das suas namoradas".

Darcy Ribeiro, no entanto, é da época em que "você tinha de escolher entre Geraldo Vandré e Chico Buarque, entre o DKW e o Fusca". Fazia parte de um mundo que Jorge Forbes tem deixado para trás, atento ao estudo comportamental das novas gerações. "A globalização pluralizou as possibilidades e as pessoas entraram na angústia da escolha", analisa.

      Perdemos todos os padrões." Uma das conseqüências disso é o que Forbes chama de "agressões inusitadas" - um fenômeno de violência "gratuita" que teve seu ponto alto na semana que passou, quando veio a público a história do assassinato do analista de sistemas José Eduardo Barcelos Vásquez, a mando da própria filha, Daniele, de apenas 20 anos. Forbes explica:

      O que há de novo no comportamento de gente como Daniele Vásquez?

     Agressões sempre aconteceram, porém de forma justificada - por necessidade, inveja, fome, disputa, amor. Podemos entender a agressão ao Iraque, ou por que alguém apanha se subir o morro vestindo terno, gravata e Rolex. Ao contrário disso, as agressões inusitadas caracterizam-se pela surpresa, pela falta de compreensão da sociedade e do próprio agressor sobre sua motivação. O primeiro caso do qual tivemos notícia aconteceu quando alguns alunos atiraram em seus colegas, fazendo vários mortos, em Columbine, nos Estados Unidos. Aqui, o caso foi explicado como "coisa de americano". Acontece que depois houve o atirador do cinema no MorumbiShopping. Disseram que ele tinha ido assistir a Clube da Luta e, "logo", disparou a arma. Agora, novamente um americano matou colegas de escola e depois se matou. Mas acharam na casa dele uma foto de Hitler, o que "justificou" a ação. São todos casos de grande repercussão. Mas há inúmeras outras histórias que nem chegam a virar notícia. Outro dia fui à delegacia porque o filho de um amigo foi agredido em um restaurante de classe média alta em São Paulo. Ele estava indo embora, descendo as escadas com a namorada, quando um outro jovem se aproximou.  
      Eles não se conheciam. Não havia briga, não havia gangue, não havia bebida. O rapaz tirou do bolso um soco-inglês e deu um murro na cara dele, partindo seu nariz em três pedaços e abrindo sua testa. Uma agressão completamente surpreendente, e muito mais comum do que se imagina. Esses fenômenos tanto mais se alastrarão se continuarmos tratando o assunto a distância. O fato é que a menina de Brasília é um fenômeno inerente e conseqüente à globalização. É um fenômeno que alia quebra de identidade e irresponsabilidade.

       Como podemos entender sua atitude?

     O pai virou um genérico, esse termo que vem da globalização e define o que não tem uma característica própria. O pai não é mais aquele, não é o intocável - pelo menos para essa pessoa. Então, pôde virar simplesmente um empecilho a ser eliminado, deletado. O pai do mundo industrial perdeu o sentido. Dizia-se que "com pai e mãe não se mexe". Como se dizia também que "em igreja não se rouba". Em Minas, as igrejas ficavam então de portas abertas. Hoje são roubadas. O laço social não dá mais ao pai - nem ao padre - nenhuma posição privilegiada.

Esse tipo de crime deixa uma pergunta no ar: como uma pessoa parecida comigo faz isso?

     Esse questionamento nos leva a pensar que, se ela fez, também podemos fazer. E o que nos protege de nós mesmos? A sociedade está apavorada frente a isso - não estamos apavorados com a menina de Brasília. Estamos apavorados com a nossa menina de Brasília. O que tem em mim parecido com a menina de Brasília ou com Suzane Richthofen? As pessoas, na verdade, estão auto-apavoradas.

Que mudança a globalização provocou, a ponto de permitir que isso acontecesse?
Tínhamos uma sociedade hierarquizada e vertical, com uma presença muito forte do pai ou do chefe. Essa sociedade não existe mais, o que deixa as pessoas perdidas - isso nos leva a enfrentar novas doenças, obrigando a novas soluções.

       Que doenças são essas?

     A depressão e as agressões inusitadas, apenas para citar dois exemplos. No caso da depressão, médicos falam na serotonina desregulada. Tudo bem, está certo. Mas por que raios eles não nos explicam qual o motivo de a serotonina ter se desregulado só agora, sendo que ela está no corpo humano desde que o homem é homem? Por que resolveu dar o ar de sua graça só agora? Prefiro outra explicação para o problema: quando o homem perde seu termômetro, ele passa a se medir mal. Então, se você passar pela rua, encontrar um velho amigo e ele der sinais de que não o conhece mais, a primeira coisa que você vai dizer será: "Mas o que eu fiz? Onde eu errei com ele?".
     Quando você cumprimenta alguém, faz um ato de demanda de reconhecimento.           Quando ele não o reconhece, acontece uma pequena crise de identidade, que você conserta quando pergunta o que fez de errado. É uma historinha banal, mas serve para entender a depressão - ela nada mais é do que a cura para a perda da identidade. Um mau borracheiro, devemos admitir, mas sem dúvida uma forma de consertar.

       O que há em comum nos episódios de agressões inusitadas?

      São imprevisíveis e inexplicadas pela sociedade a não ser que ela queira se enganar. O próprio agressor pode se assustar com o que fez, e isso não quer dizer que seja uma imoralidade ou uma psicose. Não é tão estranho que a pessoa esteja bem um dia, mate o pai no outro e faça um churrasco na manhã seguinte. Não é tão estranho porque estamos lidando com quebras de identidade, fruto da quebra de padrão. Só se escandaliza com isso quem ainda tem padrão. Além desses pontos, é importante ressaltar que quem as comete é gente igualzinha a gente. Digo isso porque a sociedade se tranqüiliza dizendo que o agressor é o outro: "Agrediu porque não teve educação, não teve comida, não teve berço".
     
      Essas agressões são um fenômeno exclusivo da classe média?

     Curiosamente, os exemplos que temos são saídos da classe média e da média alta. Eu classificaria como um problema de irresponsabilidade das elites. Às vezes, uma pessoa pressionada pela necessidade de sobrevivência pode cometer crimes. Mas esses não são tão inusitados.

       Como a sociedade deve lidar com o problema?

     Um dos riscos que envolvem as agressões inusitadas é tratarmos o problema com os velhos mecanismos, buscando explicações na falta de educação ou na falta de uma boa estrutura psíquica. Pior, só o Jornal da USP, que anunciava com grande alarde, na semana passada, uma pesquisa sobre o cérebro - e nela ficamos sabendo que, para viver muito e bem, precisamos entender onde estão as marcações da agressividade no cérebro humano. Há dez anos, isso seria visto vergonhosamente. Hoje é enaltecido como progresso. Irão descobrir marcas cerebrais - o passo seguinte será a lobotomia? Ou colocar focinheira nas pessoas? Está lá, no jornal dessa universidade, de história tão respeitável... Também não cabe qualificar os agressores inusitados como neuróticos ou perversos, porque são conceitos que nascem do complexo de Édipo, a teoria freudiana que funciona maravilhosamente em uma sociedade piramidal, onde o pai - ou o saber - estaria no topo. Mas tanto o saber quanto o próprio pai viraram genéricos, ou seja, não são mais padrão para nada. Sem a figura do mestre, o homem "desbussolou-se". Temos de gerar cultura que nos ensine a viver globalmente.

       O que é essa cultura?

      É saber que, nessa nova geração, a amizade é um valor fundamental. É perceber, por exemplo, o valor do esporte radical, uma forma boa que os jovens encontraram de enfrentar o tema da morte, antes presente através dos rituais da Igreja Católica. Sobretudo, temos de oferecer à sociedade um renascimento cultural. O Ministério da Cultura deveria ser o mais importante de um país. A economia deveria vir a reboque.

      Uma opção a esse renascimento é o retorno a uma sociedade que resgate valores deixados para trás?

      Se o laço social está disperso, temos duas saídas. Uma delas é reamarrar esse laço desde fora, criando uma nova onda moralista, à qual sou contra. Então vamos censurar a televisão, exigir que os meninos cheguem mais cedo em casa, que os colégios sejam mais rígidos. Outra saída é ver se não há neste novo mundo alguma coisa que já está se organizando de uma forma que não se esperava. Exemplo: esperava-se que, com a globalização, fosse haver uma febre de promiscuidade sexual. Não houve. Então, quem está organizando isso, se os padrões antigos se tornaram desimportantes? Vai ver que a nova geração sabe se organizar de uma forma diferente da gente.

       Como devem se colocar os pais no meio disso tudo?

      A partir dos anos 70, ou até antes disso, achou-se que tudo poderia ser compreendido. Isso levou mães a contar sobre seus amantes para as filhas. Pais foram para a zona com seus filhos. Foi um desastre. Pai e mãe têm uma função importante, que é a de representar o impossível, as incertezas que fazem parte da vida. Filhos só vão a festas se os pais deixarem. Pai e mãe foram feitos para ser criticados, e isso faz parte da função deles. Esse enfrentamento é necessário até que o filho consiga construir suas pontes para evitar o impossível. Se os pais não cumprirem esse papel, o filho vai procurá-lo em outras partes. Um exemplo: o filho de um amigo meu ia mal na escola. Ainda assim, e por sentir-se ausente de sua educação, o pai lhe deu um carro. Ele bateu o carro e morreu uma pessoa.

      Qual lição nos deixa um episódio como o acontecido em Brasília?

      Não vamos passar a mão na cabeça e dizer que ela é louca e não sabe o que faz. Por outro lado, é importante que cada vez mais todo mundo saiba que estamos em um novo mundo. Que este novo mundo vive um tempo de "não saber". Mas que este novo mundo vai trazer um laço social que, se compreende tragédias, compreende também a possibilidade, por exemplo, de um novo amor. Hoje, se eu estou com você é porque quero estar com você, e não porque devo estar com você. Posso simplesmente me separar - posso deletá-lo da minha vida, porque este é uma amor sem desculpas, que não se dá por causa de filhos ou da idade compatível. Antes, é uma opção pessoal e responsável. Este é um novo mundo que, se trouxe problemas graves, por outro lado prenuncia novo renascimento - iremos observar um aumento de interesse pelo cinema, pelo teatro, pelos livros. Não é por nada que todo jovem hoje conta sua história nos blogs.

domingo, 22 de setembro de 2019

Guerra é 'última opção', diz Arábia Saudita sobre tensões com o Irã



ORIENTE MÉDIO E ÁFRICA

21.09.2019
O chanceler saudita, Adel Jubeir, disse neste sábado (21) que Riade fará de tudo para se proteger em meio a tensões com Teerã, destacando que uma guerra com o Irã é "sempre a última opção".
Neste sábado (21), Jubeir culpou novamente o Irã por suposto ataque com drones e mísseis contra uma refinaria de petróleo da Arábia Saudita.
Já o comandante da Guarda Revolucionária Islâmica das Forças Armadas Iranianas, Hossein Salami, disse no início do dia que Teerã está pronta para "responder a qualquer agressão".

'Guerra é sempre a última opção'

A declaração do ministro das Relações Exteriores da Arábia Saudita, Adel Jubeir, comentou a possibilidade de um conflito com o Irã em uma entrevista para uma emissora britânica.
"Temos a responsabilidade de defender nosso país e garantir que nenhum dano aconteça em nosso país e em nossos povos. Portanto, faremos o que for necessário para impedir que nosso país sofra danos. Preparando-se para a guerra? Guerra é sempre a última opção", afirmou o ministro saudita disse à emissora Sky News.
O ministro afirmou que o Irã é "agressivo" há 40 anos, acusando Teerã de enviar milícias para a Síria, Iraque e Iêmen, além de "destruir o Líbano através do Hezbollah".
Na semana passada, um ataque de drones à petrolífera Saudi Aramco forçou a companhia nacional de petróleo da Arábia Saudita a paralisar as atividades nas instalações em Abqaiq e Khurais.
Embora a responsabilidade tenha sido reivindicada pela ala militar do movimento Ansar Allah, do Iêmen, também conhecido como Houthis, a Arábia Saudita e os Estados Unidos acusam o Irã pelo incidente. Teerã refutou as acusações.
by .sputniknews.com

Terceira Guerra Mundial pode começar em 2019 (em um destes cinco locais)

Por ZAP
- 26 dezembro, 2018
navy.com
Em 2019, o mar do Sul da China, a Ucrânia, o golfo Pérsico e a península da Coreia vão continuar sendo as regiões mais quentes onde a Terceira Guerra Mundial pode começar, diz um especialista militar norte-americano.
Segundo sustenta o especialista em geoestratégia Robert Farley, professor do Colégio Militar dos EUA, em um artigo publicado na revista The National Interest, um dos “pontos quentes” do planeta é o mar do Sul da China, no qual se desenvolve há anos um confronto “surdo” entre os Estados Unidos, a China e o Japão.
O Mar do Sul da China, ou Mar da China Meridional, é alvo de disputas há anos entre diversos países da região: China, Taiwan, Malásia, Indonésia, Brunei, Vietnã e Filipinas. Estima-se que a enorme área, que inclui mar e ilhas, seja rica em petróleo e gás.
Localização dos territórios em disputa no Mar da China Meridional
Recentemente, a imprensa chinesa revelou também que o país está construindo “submarinos fantasmas” para defender o mar do Sul da China contra uma eventual guerra submarina com os Estados Unidos.
Os dois países estão envolvidos em uma guerra comercial, uma batalha que acontece em um contexto de sanções econômicas e disputas tarifárias. Mas, diz o especialista, levando em conta o nível a que as relações bilaterais já se deterioraram, o conflito pode escalar ainda mais e assumir contornos de confronto militar.
De acordo com o autor, a Ucrânia é outro local onde a Terceira Guerra Mundial pode ter início. Farley relembra o recente incidente no Mar Negro entre russos e ucranianos, que causou um aumento da tensão diplomática na região, com a Ucrânia acusando a Rússia de ter disparado contra navios ucranianos no Estreito de Kerch, que separa a Crimeia da Rússia e é ponto de acesso ao Mar de Azov.
O especialista acredita que a Rússia provavelmente não estaria interessada em alterar o atual status quo na região antes das próximas eleições na Ucrânia, que, por sua vez, podem também vir a introduzir incerteza. Tendo em conta as contínuas tensões entre os Estados Unidos e a Rússia, qualquer pequeno choque pode destruir o fraco equilíbrio existente na região nos últimos anos, alerta Farley.
A terceira região quente do planeta é o golfo Pérsico. Aqui, sustenta Farley, as tensões estão aumentando devido à pressão econômica dos EUA sobre o Irã, bem como aos conflitos no Iêmen e na Síria.
Considerando a importância estratégica da região, qualquer instabilidade nessa zona pode levar a um confronto aberto entre os Estados Unidos, a Rússia e até a China, diz o especialista.
O quarto lugar de tensão identificado pelo especialista é a península da Coreia. Apesar das recentes iniciativas de paz entre os EUA, a Coreia do Norte e a Coreia do Sul, que parecem ter posto fim à intensa guerra de palavras e troca de ameaças entre os presidentes norte-americano e norte-coreano em 2017, as relações entre Washington e Pyongyang podem se deteriorar a qualquer momento.
Além disso, outros atores regionais importantes — a China e o Japão — também têm manifestado posições divergentes a respeito da questão coreana.
A estes quatro pontos quentes no planeta, que segundo o especialista em assuntos militares podem em 2019 ser palco da eclosão de uma Guerra Mundial, junta-se um quinto ponto quente, que uma equipe de cientistas da ONU identificou em 2016 como podendo ser a causa provável da 1ª Guerra Nuclear na Terra.
O primeiro conflito nuclear no nosso planeta, dizem os cientistas, pode ocorrer não entre a Rússia e os EUA, mas entre a Índia e o Paquistão – devido a problemas crescentes em torno do acesso à água potável no subcontinente indiano e aos conflitos em torno da bacia do rio Indo.
Em conclusão, se a Humanidade quiser mesmo encontrar o local perfeito para se autodestruir, tem muitas opções para escolher.
Ciberia // Sputnik / ZAP

5 perguntas para entender a rivalidade entre Irã e Arábia Saudita

Rivalidade entre as duas potências do Oriente Médio é antiga, mas tem se acirrado recentemente.
Por BBC
18/09/2019 


O aiatolá do Irã, Ali Khamenei (à esq.), e o príncipe saudita Mohammed bin Salman — Foto: Reuters/EPA
A relação entre a Arábia Saudita e o Irã é delicada. Os países são rivais há muito tempo, mas a situação ficou mais tensa recentemente. Explicamos por quê.
Por que a Arábia Saudita e o Irã não se entendem?
Os dois países, que são vizinhos poderosos, disputam o domínio da região.
A tensão entre as nações, que dura décadas, é acentuada por diferenças religiosas. Os países seguem ramos distintos do islã: o Irã é majoritariamente xiita, enquanto a Arábia Saudita se vê como a potência sunita dominante.
Esse embate religioso se reflete no mapa do Oriente Médio, onde países com maioria sunita ou xiita buscam, respectivamente, a Arábia Saudita ou o Irã em busca de alianças.
Historicamente, a Arábia Saudita, uma monarquia e berço do islã, se vê como líder do mundo muçulmano. Mas essa posição foi desafiada em 1979 pela Revolução Islâmica no Irã, que criou outro tipo de Estado na região: um tipo de teocracia revolucionária, que tinha o objetivo explícito de exportar o modelo além de suas fronteiras.
Nos últimos 15 anos, particularmente, as diferenças entre a Arábia Saudita e o Irã se intensificaram graças a uma série de eventos.A invasão do Iraque, liderada pelos EUA, em 2003, derrubou Saddam Hussein, um árabe sunita que havia sido um grande adversário do Irã.
A guerra removeu um ator militar que agia como contrapeso ao Irã na região. Ela abriu o caminho para um governo em Bagdá dominado por xiitas e com crescente influência iraniana.
Em 2011, uma série de levantes no mundo árabe causou instabilidade na região. O Irã e a Arábia Saudita exploraram essas revoltas para expandir sua influência - especialmente na Síria, no Bahrein e no Iêmen, ampliando a desconfiança mútua.
Os críticos do Irã dizem que o país busca controlar um corredor terrestre que vai do seu território até o Mediterrâneo.

Como as coisas pioraram?

A rivalidade vem se acentuando porque o Irã está vencendo a disputa regional em vários sentidos.
Na Síria, o apoio do Irã (e da Rússia) ao presidente Bashar al-Assad permitiu que o governo vencesse forças rebeldes apoiadas pelos sauditas.
A Arábia Saudita está tentando desesperadamente conter a crescente influência iraniana, enquanto as aventuras militaristas do jovem e impulsivo príncipe Mohammed bin Salman, a autoridade máxima no país, vêm exacerbando tensões regionais.
O príncipe combate uma guerra no vizinho Iêmen contra o movimento Houthi, visto como próximo do Irã. Mas, quatro anos depois de iniciado, o conflito tem se mostrado uma aposta arriscada.
O Irã nega acusações de que esteja contrabandeando armas para os houthis, embora relatórios da ONU apontem que Teerã tem dado assistência ao movimento tanto em termos de tecnologia quanto de armas.
Enquanto isso, no Líbano, um aliado do Irã, a milícia Hezbollah lidera um poderoso bloco político e controla forças imensas e altamente armadas.
Muitos analistas acreditam que os sauditas forçaram o primeiro-ministro libanês Saad Hariri a renunciar em 2017 em meio ao envolvimento do Hezbollah em conflitos regionais. Ele depois resolveu adiar a renúncia e segue no cargo até hoje.
Também há forças externas envolvidas na disputa. A Arábia Saudita se fortaleceu com o apoio do governo de Donald Trump - e se beneficia da postura de Israel, que considera o Irã uma grande ameaça e, consequentemente, apoia indiretamente o esforço saudita.



Os líderes israelenses temem o avanço de insurgentes pró-Irã na Síria, com quem Israel mantém fronteira.
Israel e a Arábia Saudita foram os dois países que mais se opuseram ao acordo de 2015 que limitou o programa nuclear iraniano. Os países argumentaram que o pacto não foi longe o suficiente para impedir que o Irã construísse a bomba atômica.

Quais são os aliados regionais?

De maneira geral, o mapa geopolítico do Oriente Médio reflete as divisões entre xiitas e sunitas.
No lado pró-sauditas há outros atores sunitas no Golfo — os Emirados Árabes Unidos e o Bahrein — assim como o Egito e a Jordânia.
No campo iraniano, há a Síria de Bashar al-Assad, membro de um grupo xiita heterodoxo, que tem sido apoiado por milícias xiitas pró-Irã, incluindo o libanês Hezbollah, para combater grupos rebeldes predominantemente sunitas.
O governo dominado por xiitas no Iraque também é um aliado próximo do Irã, embora paradoxalmente também mantenha uma boa relação com os EUA, que o tem ajudado a combater o grupo autoproclamado Estado Islâmico.

Quais os efeitos práticos da rivalidade entre Irã e Arábia Saudita?

De certa forma, essa disputa lembra a Guerra Fria, que manteve os EUA e a União Soviética sob tensões militares por muitos anos.
O Irã e a Arábia Saudita não estão lutando diretamente entre si, mas estão engajados em várias guerras na região nas quais apoiam lados rivais.
A Síria é um exemplo óbvio. No Iêmen, a Arábia Saudita acusa o Irã de prover mísseis balísticos atirados contra o território saudita pelo movimento rebelde Houthi.
O Irã também é acusado de fazer demonstrações de força nas águas do Golfo, por onde a Arábia Saudita escoa seu petróleo. Os EUA dizem que o Irã está por trás de ataques recentes a navios na região — acusação negada por Teerã.

Estamos caminhando para uma guerra entre Irã e Arábia Saudita?


Por enquanto, Teerã e Riad têm lutado indiretamente. Nenhum dos dois está realmente disposto a combater o rival diretamente, mas um ataque dos houthis à capital saudita ou a algum alvo econômico relevante — como o ocorrido recentemente nas instalações de petróleo — pode alterar esse cálculo.
Os ataques dos houthis à infraestrutura da Arábia Saudita são um novo front na batalha indireta entre Teerã e Riad. Assim como ocorre nas águas do Golfo, onde iranianos e sauditas se enfrentam numa fronteira marítima, as tensões crescentes ameaçam alçar o conflito a outro patamar.
Para os EUA e outras potências ocidentais, a liberdade de navegação no Golfo é essencial e qualquer conflito que ameace bloquear o fluxo — vital para o transporte global de petróleo — poderia mobilizar forças aéreas e navais americanas.
Há muito tempo, os EUA e seus aliados veem o Irã como uma força desestabilizadora no Oriente Médio. Autoridades sauditas cada vez mais encaram o Irã como uma ameaça existencial ao reino. O príncipe saudita parece disposto a fazer o necessário para conter a crescente influência de Teerã.
A vulnerabilidade da Arábia Saudita foi exposta pelos ataques recentes às instalações petrolíferas. Se uma guerra começar, talvez seja mais por acidente do que por planejamento.

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