domingo, 30 de maio de 2021

“Rumorese”: A estratégia de controle mental mais sutil que opera em toda a sociedade




O rumorese é composto por uma série de idéias projetadas para serem acreditadas, independentemente de sua veracidade ou racionalidade. Geralmente, trata-se de especulações ou deturpações que se espalham porque causam impacto em nossas emoções mais atávicas.



Em “O Grande Ditador”, Hynkel, o personagem interpretado por Charles Chaplin, fala Grammelot, uma linguagem composta de sons, palavras e rumores que têm significado que, no entanto, outros parecem entender.

No romance “1984”, George Orwell se referiu a uma “linguagem neo” a serviço do sistema de controle, na qual todas as palavras consideradas “perigosas” para o regime foram eliminadas. O lema do partido é: “Guerra é paz, liberdade é escravidão, ignorância é força”.

Na verdade, essa linguagem sem sentido, que fala muito sem dizer nada, se espalhou entre nós a uma velocidade vertiginosa, como uma epidemia real. O filólogo Igor Sibaldi chamou de “rumorese”. E é importante ser capaz de detectá-lo, porque – sem perceber e de maneira sub-reptícia – pode acabar restringindo nosso pensamento e, portanto, limitando nossas decisões de vida.
O que é rumorese?

Rumorese é falar muito sem dizer nada, é a “capacidade” de colocar uma palavra após a outra, rapidamente, sem se preocupar que a mensagem seja consistente, tenha significado ou valor. Um discurso em rumorese é composto de palavras vazias ou termos excessivamente ambíguos que são frequentemente contraditórios entre si.

Rumorese é, portanto, a linguagem de todos aqueles que querem se destacar, mas não têm nada importante para contribuir com o mundo. É também a linguagem daqueles que querem exercer controle sem recorrer à razão ou ao entendimento. É uma linguagem em que os sons prevalecem e o significado é óbvio.

Vivendo na sociedade da loquacidade

Nos tempos em que conta mais quantidade do que qualidade, não deve nos surpreender que falar muito sem dizer nada tenha se tornado a norma. Como Thoreau disse, “parece que o importante é falar com rapidez e não com bom senso”.

Quem não aprende esse idioma, mas fala de maneira sensata, pode ser visto com desconfiança pelos outros. Seu discurso será classificado como muito complicado e raro, porque exige uma capacidade de atenção e reflexão perdida.

Assim, discursos razoáveis, lógicos e coerentes tornam-se incompreensíveis para a maioria, uma maioria que foi convenientemente lobotomizada graças a uma educação sistemática à loquacidade.

De fato, para funcionar em certos contextos sociais e ter “sucesso”, muitas pessoas são forçadas a aprender a falar mais e dizer menos. Quem não se sente perdido, como um peixe fora d’água, como se fosse o único são em um manicômio, testemunhando uma cena absurda que se desenrola com extraordinária normalidade. Quem não fala esse idioma acaba, portanto, se sentindo marginalizado, excluído e raro.

O “rumorese” cria o absurdo que nos lobotomiza

“Estamos prontos para fazer as modificações necessárias, de uma justiça por parte do cidadão, implementando reformas que não modificam o processo em andamento …”

Essas palavras, tiradas de um jornal, podem nos parecer familiares, uma vez que fazem parte dos rumores políticos, embora seja verdade que existem muitas outras variantes que falam muito sem dizer nada que se estenda a diferentes áreas de nossas vidas.

Nesse exemplo, embora o leitor possa se sentir feliz porque as “reformas necessárias” serão aplicadas, na realidade elas “não modificarão o processo em andamento”, o que significa que tudo mudará para que nada mude. A isto se acrescenta que o fato de a justiça ser da parte do cidadão é uma contradição, uma vez que a justiça não deve estar em lugar nenhum, mas ser imparcial.

O rumorese, portanto, serve apenas para gerar confusão e criar expectativas que nunca serão satisfeitas, por isso acaba gerando frustração. As contradições flagrantes e o absurdo que ele gera fazem com que uma parte do nosso cérebro se desligue, cansada de procurar uma lógica inexistente. E é precisamente esse tipo de lobotomização autoinfligida que se adapta a todos aqueles que aproveitam os rumores para alcançar seus objetivos.

A isto se acrescenta que, como os rumoreses não têm significado em si, geralmente é mais credível quem tem maior autoridade. Se não entendermos dois discursos antagônicos, teremos a tendência de fundamentar e acreditar no discurso institucionalizado e canonizado. O poder do referente trabalha sua mágica onde não há hábito do pensamento livre.

E isso significa que a razão e o diálogo não prevalecem, mas o poder. Como Thoreau advertiu, “o homem aceita não o que é verdadeiramente respeitável, mas o que é respeitado”.

A reflexão como arma contra palavras vazias

O rumorese é composto por uma série de idéias projetadas para serem acreditadas, independentemente de sua veracidade ou racionalidade. Geralmente, trata-se de especulações ou deturpações que se espalham porque causam impacto em nossas emoções mais atávicas.

De fato, o rumorese se espalha de maneira extremamente eficaz e é uma ferramenta de manipulação perfeita, porque geralmente ajustamos nossa visão de mundo à percepção que os outros têm. Pensamos que muitas mentes não podem estar erradas, portanto, quem eu estou errado sou eu.

O melhor antídoto para conter essa conversa vazia é a razão. Precisamos passar tudo pela peneira do nosso pensamento. Não importa de onde venham as palavras ou quem as disse, temos que questioná-las e, se necessário, refutá-las. É nesse ato de desconstrução do que foi dito que encontramos nossa verdade e nos tornamos livres.

Emissoras estão em poder de poucos




DA SUCURSAL DO RIO
São Paulo, segunda-feira, 06 de agosto de 2001
Folha São Paulo


Além da presença de políticos, há o problema da concentração de mercado na radiodifusão. As emissoras de TV estão em poder de poucos grupos empresariais. A família Marinho tem participação societária em 32 concessões, o que representa mais de 10% das geradoras existentes no país.
As quatro grandes redes nacionais de televisão -Globo, SBT, Bandeirantes e Record- têm, somadas, 75 emissoras próprias, mais de um quinto das concessões de TV comercial.

Os Marinho têm 11 das 40 emissoras de TV existentes no Estado de São Paulo, o que dá uma proporção de 28%. Duas destas emissoras - a TV Vale do Paraíba, em São José dos Campos, e a TV Aliança Paulista, de Sorocaba- foram concessões dadas pelo ex-presidente José Sarney. A terceira concessão obtida pela família naquele governo foi a TV Cataratas, de Foz do Iguaçu (PR).

Em seis anos, os Marinho quase dobraram suas emissoras de televisão. Em 1994, eles apareciam no cadastro do Ministério das Comunicações com apenas 17 emissoras. Agora, três gerações da família já aparecem como acionistas em emissoras em Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, São Paulo, Pernambuco e Distrito Federal. Há concessões registradas em nome de Roberto Marinho, de seus três filhos e de cinco netos.

O registro em nome de diferentes pessoas da mesma família é um artifício legal encontrado pelas empresas para ultrapassar o limite de propriedade de TVs permitido na legislação. O teto por acionista é de duas concessões por Estado e dez em âmbito nacional, sendo cinco em VHF (canais de número 1 a 13) e cinco em UHF (do canal 13 para cima).

A Globo tem afirmado que ampliou sua participação no setor com aquisições legais e transparentes e que obedece à lei. Segundo a empresa, não é a família Marinho que possui 32 emissoras, mas pessoas físicas que, independentemente do parentesco entre elas, investiram no setor.

As redes Bandeirantes e SBT também aumentaram suas concessões nos últimos anos, mas em escala menor do que a Globo. A família Saad, da Bandeirantes, passou de nove para 12 concessões, enquanto a família Abravanel passou de nove para dez.

Nesse período também a Igreja Universal do Reino de Deus construiu seu império de 21 emissoras, divididas em três redes: Record, Rede Mulher e Rede Família.

Afiliadas da Rede Globo lideram ranking de ligações com políticos, seguidas pelas do SBT e da Bandeirantes

Políticos controlam 24% das TVs do país


ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
São Paulo, segunda-feira, 06 de agosto de 2001

Levantamento exclusivo feito pela Folha mostra que pelo menos 59 emissoras de televisão -24% das 250 concessões de TV comercial existentes- pertencem a políticos. Dentro de dois meses, o número subirá para 60, com a inauguração da TV do senador Gilvam Borges (PMDB-AP), em Macapá.
Esses números referem-se a empresas que têm concessão do governo para gerar programação e não incluem as milhares de retransmissoras que funcionam com licenças precárias e apenas repetem o sinal das geradoras nem as TVs educativas.

A Rede Globo tem 21 afiliadas ligadas a políticos, contra 17 do SBT e 9 da Bandeirantes. Entre os políticos ligados comercialmente à Globo, estão os ex-presidentes da República José Sarney e Fernando Collor de Mello e três governadores: Roseana Sarney (PFL-MA), Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) e o tucano Albano Franco, de Sergipe.

Entre os afiliados da Rede Globo encontram-se ainda o senador Antônio Carlos Magalhães Júnior (PFL-BA), o ex-senador João Calisto Lobo (PMDB-PI), oito deputados federais e um estadual.
No SBT, estão o governador do Ceará, Tasso Jereissati (PSDB), e o presidente interino do Senado, Edison Lobão (PFL-MA). Na lista da Bandeirantes figuram três senadores -entre eles, o presidente licenciado do Senado, Jader Barbalho (PMDB-PA), e o vice-governador de Alagoas, Geraldo Sampaio, do PDT.

Crise em Alagoas

Uma emissora de televisão na mão de políticos pode ser uma arma tanto para promover aliados quanto para atacar adversários.
De janeiro a abril deste ano, o governador de Alagoas, Ronaldo Lessa (PSB), esteve em guerra contra a TV Gazeta, afiliada da Globo pertencente à família Collor de Mello, que o acusou de tramar o assassinato do coronel Cavalcante. O militar cumpre pena em Maceió pela morte de um irmão do governador, em 1991."Era uma acusação sem nenhum fundamento, apenas porque Collor e eu somos adversários históricos. Fui para ofensiva. Suspendi entrevistas e publicidade oficial para as Organizações Arnon de Mello", diz o governador.

Ele conta que gravou em vídeo as imagens veiculadas pela TV e que entregou a fita ao ex-diretor de Jornalismo da Rede Globo, Evandro Carlos de Andrade. A emissora passou a enviar jornalistas de Recife para cobrir os eventos importantes de Alagoas.

Segundo Ronaldo Lessa, a guerra acabou em abril, quando a TV Gazeta noticiou que as acusações não procediam. No dia 9 de julho, o ex-diretor de jornalismo da Gazeta, Célio Gomes, foi substituído pelo então coordenador do núcleo de rede da Globo no Paraná, Clésio Oliveira. A Globo nega que tenha feito intervenção na afiliada, mas admite ter sugerido Clésio para o cargo. A TV Gazeta não comentou o episódio.

Mais recentemente, em maio, a Globo teve problemas na Bahia. Sua afiliada local, a TV Bahia, da família de Antonio Carlos Magalhães, não cobriu as manifestações em Salvador pela cassação de ACM. A Globo usou imagens feitas por um sindicato no noticiário nacional, mas -pelo menos para efeito externo- justificou a conduta da afiliada dizendo que ela subestimou os protestos.

Coronelismo

A forte influência política na radiodifusão é uma herança dos governos anteriores que Fernando Henrique Cardoso não conseguiu modificar. "O coronelismo eletrônico é uma face do atraso brasileiro. Mostra a nossa carência de cidadania e fragilidade partidária", diz o diretor da Faculdade de Comunicação da Universidade Nacional de Brasília, Murilo Ramos.
Ramos lembra que FHC, ao anunciar Sérgio Motta para ministro das Comunicações, em 1995, prometeu explicitamente mudar esse quadro. "Não mudou. Pelo contrário, consolidou o poder político no setor."

A família Sarney tem o maior império de comunicação do Maranhão, Estado em que controla quatro emissoras de TV afiliadas da Globo: as TVs Mirante das cidades de São Luís, Imperatriz, Santa Inês e Codó.

No Rio Grande do Norte, as quatro emissoras comerciais de televisão existentes pertencem a políticos, de acordo com o ex-ministro Aluísio Alves, tio do governador Garibaldi Alves e um dos acionistas da TV Cabugi, afiliada da Globo.

Aluísio Alves conseguiu a concessão da TV Cabugi quando foi ministro da Administração no governo Sarney. Foram agraciados, na mesma ocasião, os senadores Agripino Maia (PFL) e Geraldo Melo (PSDB).

Além da TV, a família Alves é dona de rádios e do jornal "Tribuna do Norte", de Natal.
O ex-ministro diz que a TV não lhe dá dividendos políticos. "O contrato com a Globo não permite fazer política com a emissora, mas meus adversários usam as deles. Só tenho liberdade de fazer política no jornal e nas rádios."

SBT
Entre os políticos vinculados comercialmente ao SBT, além de Tasso Jereissati e Edison Lobão, estão o senador Mozarildo Cavalcanti (PFL-RR), Orestes Quércia (ex-governador de São Paulo e atual presidente do PMDB no Estado), o prefeito de Araçatuba (SP), Jorge Maluly Neto (PFL), e o ex-governador do Paraná Paulo Pimentel. Constam também quatro deputados federais, entre eles, o ex-governador da Bahia Nilo Coelho (PSDB).

Maluly Neto e Sílvio Santos são sócios da TV Araçá, de Araçatuba. O prefeito admite que ser proprietário de TV o beneficia politicamente. Em entrevista à Folha, por telefone, ele travou o seguinte diálogo:

Folha - De que maneira a TV o ajuda politicamente?

Maluly - Você pode mostrar sua atuação. O fato de noticiar ajuda.

Folha - Há fatos relativos à sua gestão que são divulgados em sua TV e não saem nas emissoras concorrentes?

Maluly - Com certeza. Quando há fatos proeminentes na cidade, elas cobrem, mas nem sempre eu apareço. A mesma notícia, na nossa emissora, traz uma pontinha de declaração da gente.
Na avaliação de Maluly Neto, os radiodifusores tem 50% a mais de chances de se elegerem do que os demais candidatos, o que explica o interesse dos políticos pelas rádios e televisões.

Bandeirantes
A Bandeirantes é a rede de televisão com o maior número de senadores entre seus afiliados. Além de Jader Barbalho, também estão na lista os tucanos Geraldo Melo, do Rio Grande do Norte, e Romero Jucá, de Roraima.

Ainda faz parte da listagem o ex-senador e ex-governador do Mato Grosso Júlio Campos. A mulher dele, Isabel Campos, é diretora-executiva da TV Oeste, da cidade de Cuiabá.
Campos é o único político que figura no cadastro do Ministério das Comunicações como titular de emissora de televisão em Mato Grosso, mas, na avaliação de Isabel, "quase 100% das rádios e televisões do Estado têm vínculos com grupos políticos".
Ela diz que as emissoras que apóiam o governo são favorecidas na distribuição da verba publicitária e que a TV Oeste estaria sendo discriminada por pertencer a Campos. "Nem sempre o vínculo explícito com um político favorece a emissora", afirma.

Outras redes

Oficialmente, a Record tem apenas cinco afiliadas com políticos, mas sua situação não é comparável às das demais redes. "A Record é um caso à parte. Ela está a serviço de uma denominação religiosa, a Igreja Universal do Reino de Deus, que tem seus representantes do Congresso", afirma o diretor da Faculdade de Comunicação da UNB.

A CNT, que tem quatro geradoras próprias de televisão, é a rede com vínculo político mais explícito. Seu acionista controlador é o presidente nacional do PTB e deputado federal pelo Paraná, José Carlos Martinez.

sexta-feira, 28 de maio de 2021

TSE autoriza quebra de sigilo e pode cassar chapa Bolsonaro-Mourão

Tribunal busca responsáveis por ataque à página ‘Mulheres Unidas Contra Bolsonaro’, com 2,7 milhões de integrantes, nas eleições de 2018. Uma das ações foi movida pela coligação O Povo Feliz de Novo
26/05/2021 17h32

Foto: Adriano Machado


Após invasão e alteração do nome por criminosos, print da página do Facebook foi usada no perfil de 

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou a quebra de sigilo e disponibilização de informações de cinco empresas de tecnologia relativas a duas ações contra a chapa presidencial Bolsonaro-Mourão. A chapa é investigada por um ataque hacker à página no Facebook “Mulheres Unidas Contra Bolsonaro” nas eleições de 2018. Uma das ações foi movida pela coligação O Povo Feliz de Novo, encabeçada pelo PT. A decisão foi tomada pelo ministro Luis Felipe Salomão, corregedor-geral eleitoral.

Após o ataque à página, que tinha mais de 2,7 milhões de membros na rede social, o grupo passou a se chamar “Mulheres Com Bolsonaro”. Pela decisão, as empresas de telefonia terão de informar dados cadastrais dos números de telefone utilizados para moveintações na página e que foram identificados pela Polícia Federal. Além disso, as empresas de tecnologia intimadas devem apresentar os registros de acesso ao grupo.

À época da eleição, Bolsonaro chegou a compartilhar uma foto do grupo, já com o nome alterado, em seu perfil no Twitter, com uma mensagem de agradecimento. Salomão pediu ainda que o Twitter informe, no prazo de até cinco dias, o número de IP do celular ou computador utilizado para publicar a mensagem.

A mensagem de Bolsonaro, datada de 15 de setembro de 2018, dizia: “Obrigado pela consideração, Mulheres de todo o Brasil!” Bolsonaro tornou prática comum a utilização de estruturas subterrâneas para promover notícias e perfis falsos a fim de fraudar as eleições de 2018.

As empresas intimadas a prestar esclarecimentos são o Facebook, o Twitter, a Microsoft, a Oi e a Vivo. Desde o resultado das eleições de 2018, a Justiça Eleitoral já recebeu oito ações pedindo a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão.

Currículo “bombado”, Battisti, ligações com PT: todas as polêmicas de Kassio Nunes Marques

Nunes começou a carreira jurídica na advocacia. Como advogado, foi indicado em 2008 a uma vaga de juiz do TRE-PI (Tribunal Regional Eleitoral do Piauí). Em 2011 tomou posse como desembargador federal do TRF-1, nomeado pela então presidente Dilma Rousseff (PT), após ser indicado ao cargo em lista sêxtupla elaborada pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Ele é natural de Teresina e se formou pela UFPI (Universidade Federal do Piauí).

O desembargador foi responsável pela decisão que em maio do ano passado liberou a licitação do STF que previa a compra de itens considerados de luxo como lagosta e vinhos premiados. O pregão estimado em R$ 1,1 milhão tinha sido suspenso por decisão de primeira instância da Justiça Federal do Distrito Federal. Em sua decisão, Nunes considerou que a licitação não seria "lesiva à moralidade administrativa" e ponderou que os itens não serviriam à alimentação dos ministros, mas a eventos institucionais realizados pelo tribunal com a presença de autoridades.

Desembargador Kassio Nunes Marques foi indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para o
Desde que foi indicado para ser o substituto do ministro Celso de Mello no Supremo Tribunal Federal (STF), o desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) Kassio Nunes Marques vem sendo alvo de diversas acusações. De ligações com o PT ou mesmo com parlamentares do Centrão; passando pelo fato de ter liberado a polêmica licitação de lagostas para ministros do Supremo e até ter prestado informações inconsistentes sobre sua vida acadêmica, com suspeita de plágio em sua dissertação de mestrado.

Apesar disso, integrantes do Senado classificam como certa a aprovação dele tanto na sabatina do dia 21 de outubro na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) quanto no plenário da Casa. Integrantes do governo acreditam que Kassio Nunes terá pelo menos 22 votos na CCJ (dos 27 possíveis) e 65 votos no plenário do Senado, de um total de 80 senadores.

Confira abaixo as principais polêmicas envolvendo o indicado pelo presidente Jair Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal:


Kassio Nunes Marques apresentou currículo acadêmico "vitaminado"

O desembargador indicado ao STF é acusado de turbinar o seu currículo, incluindo nas informações acadêmicas um pós-doutorado em Direito Constitucional pela Universidade de Messina, Itália (Universitá Degli Studi di Messina), e um “postgrado” em Contratación Pública pela Universidad de La Coruña, na Espanha.
Os dois títulos são questionáveis. O primeiro equivale a um ciclo de seminários e o segundo a curso, de fato, não existe. O “postgrado” em Contratación Pública, de acordo com a instituição, foi um Curso Euro-Brasileiro de Compras Públicas. O pós-doutorado é uma extensão dos estudos e pesquisas realizados no doutorado. O período do pós-doutorado varia de país para país sendo de 6 meses a 6 anos.


Em resposta encaminhada ao Senado, Kassio Nunes Marques afirmou que “em nenhum momento foi afirmado que o aludido curso corresponde a uma pós-graduação no Brasil. A coincidência é tão somente de ordem semântica, pois na Espanha, o curso de aperfeiçoamento após a graduação é denominado ‘postgrado’”, justificou o desembargador.


Acusação de plágio na dissertação de mestrado

Uma reportagem da revista Crusoé apontou que o desembargador teria copiado trechos de artigos publicados pelo advogado Saul Tourinho Leal, que foi integrante da banca de advocacia do ex-presidente do STF Carlos Ayres Britto, em sua dissertação de mestrado. Até erros de português foram reproduzidos no estudo.

De acordo com a revista, pelo menos 10 trechos reproduziam passagens de Tourinho Leal e, ao todo, a dissertação teria em torno de 46,2% de semelhança com textos já publicados. Por sua vez, o desembargador afirmou que o trabalho é diferente do posicionamento de Saul Tourinho. Kassio Nunes Marques alegou que defende a autocontenção judicial; já Tourinho defende o ativismo judicial.

“A coincidência das citações apontadas provavelmente decorre da troca de informações e arquivos relacionados a um dos temas abordados", justificou o desembargador por meio de sua assessoria.

Levantamento feito pela Gazeta do Povo mostrou ainda que, em dez anos, Kassio Nunes é um dos poucos magistrados do TRF-1 a não ter publicado artigos acadêmicos na Corte.

Lagosta liberada para os ministros do Supremo

Considerado "garantista", o desembargador tem em seu histórico manifestações ou a concessão de decisões, no mínimo, controversas. Dois casos são pontuais. A liberação da compra de lagostas para os ministros do Supremo; e a manifestação em favor da não extradição do terrorista italiano Césare Battisti.

Sobre o caso das lagostas, em maio de 2019, ele cassou a decisão da juíza Solange Salgado, da 1.ª Vara Federal em Brasília, que havia determinado a suspensão do pregão eletrônico do Supremo Tribunal Federal que previa a contratação de um buffet com fornecimento de vinhos, lagostas e outros pratos finos.

Em sua decisão, atendendo a pedido da AGU, Kassio Nunes alegou que o processo licitatório não feria princípios da economicidade no polêmico certame. “A licitude e a prudência com que se desenvolveu o processo licitatório desautorizam tal ideia, que reflete uma visão distorcida dos fatos, nutrida por interpretações superficiais e açodadas, daí se justificando o acionamento da excepcional jurisdição plantonista para que, imediatamente, se afaste a pecha indevidamente atribuída ao STF”, disse o magistrado na decisão.

A decisão em segunda instância que manteve Battisti no Brasil

Em relação a Battisti, ele participou, em 2015, de julgamento da Sexta Turma do TRF-1 que decidiu suspender uma decisão de primeira instância para deportação do terrorista italiano.

Durante o julgamento, os desembargadores não adentraram no mérito da legalidade ou não do processo de deportação. Os juízes se debruçaram em uma questão técnica relacionada a uma decisão de primeira instância se sobrepor, ou não, a processo ainda em análise no Supremo Tribunal Federal.

Diante das críticas, o próprio presidente da República, Jair Bolsonaro, resolveu defender o seu indicado. “O desembargador Kassio participou de julgamento que tratou exclusivamente de matéria processual e não emitiu nenhuma opinião ou voto sobre a extradição. A apelação no TRF1 nunca chegou a ser julgada em razão de decisão posterior do STF”, disse Bolsonaro em suas redes sociais.

Kassio Nunes Marques tem ligações com parlamentares do Centrão e PT


Outra polêmica relacionada à carreira do desembargador Kassio Nunes Marques são as supostas ligações políticas. Sua carreira como magistrado começou ainda em 2008, como juiz do Tribunal Regional Eleitoral do Piauí (TRE-PI). Fora nomeado pelo ex-presidente Lula e reconduzido ao cargo também após ato assinado pelo petista.

Ao chegar ao TRF-1, Nunes foi escolhido pela ex-presidente Dilma Rousseff, que foi alvo de um processo de impeachment. Nos dois casos, ele teve como padrinhos nomes como o então governador do Piauí Wilson Martins (PSB) e o atual governador Wellington Dias (PT).

Sua indicação ao Supremo teve apoio de vários políticos, entre os quais, o senador Ciro Nogueira (PP-PI), o filho do presidente da República, senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), e o ex-advogado da família Bolsonaro Frederick Wassef, segundo reportagem do jornal O Globo. Gilmar Mendes também é apontado como uma das pessoas que balizaram a indicação de Kassio Nunes Marques.

Em audiência com os senadores, porém, Nunes desconversou. “Quanto à questão da indicação, o que eu posso asseverar é que essa indicação foi exclusiva do presidente Bolsonaro. Há um ditado antigo em Brasília que diz que quando a imprensa ultrapassa cinco nomes indicando como padrinhos de indicados, é porque realmente não consegue descobrir. Eu já detectei mais de oito pela imprensa”, disse o magistrado aos senadores.



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