by Fernando Jorge
Fui amigo intimo do presidente Jânio Quadros. Frequentei durante anos a casa desse homem carismático, situada na rua Nove de Julho, número 880, em frente à Chácara Flora, no bairro paulistano Alto da Boa Vista. Ele me estimulava a escrever a sua biografia e chegou a enviar-me uma carta com estas palavras,no dia 15 de agosto de 1972:
“Se vai ser o meu biógrafo, asseguro-lhe que meus ossos dormirão em paz.”
Certa ocasião, após almoçar com ele e dona Eloá, sua esposa, eu lhe disse:
-Presidente, o senhor me pediu para eu ser o seu biógrafo, porém preciso obter uma informação que é essencial nesse caso, embora não ignore a sua aversão pelo assunto.
Jânio Quadros fitou-me de maneira firme e respondeu:
-Já sei, Fernandinho (ele me chamava pelo diminutivo, carinhosamente), você quer saber a causa da minha renúncia.
-Sim, presidente.
-Veja, meu caro, estamos num país onde ninguém renuncia a nada. Apenas D. Pedro I, no ano de 1831, renunciou em favor do seu filho, D. Pedro de Alcântara, então com cinco anos de idade. E note, D. Pedro I não era brasileiro... Aqui todos se aferram aos seus cargos, às suas posições, de modo até feroz. O vereador, o deputado, o prefeito, o governador, o secretário de Estado, o ministro, o presidente da República, agarram-se aos seus cargos como os cães famélicos se atiram a um pedacinho de osso coberto de pouca carne. Perder o cargo, para essa gente, é como morrer, tornar-se vítima de uma tragédia sangrenta. E no entanto eu apresentei a minha renúncia ao Congresso, no dia 25 de agosto de 1961, depois de menos de sete meses de governo. Renunciei ao cargo supremo, num país, repito, onde ninguém renuncia a nada, a nada!
Nesse momento o rosto de Jânio ficou bem vermelho. Falava exaltado. Temendo pela sua saúde, pronunciei estas palavras:
-Presidente, se este assunto o desagrada, eu...
Ele me interrompeu:
-Não, não, você merece ouvir o que estou dizendo. Isto me faz bem, me alivia.
Mais sereno, Jânio prosseguiu, após tomar um gole de uísque:
-Eu havia prometido, a milhões dos meus eleitores, travar um combate ininterrupto ao clientelismo, ao empreguismo, à ineficiência administrativa, à corrupção endêmica e à burocracia obsoleta. Ansiei por alcançar, neste sentido, a minha total independência em relação a grupos e a partidos. E não foi sem dificuldades que consegui efetuar o corte dos subsídios às importações de trigo e petróleo, a fim de atrair os empréstimos do Exterior à nossa combalida economia. Também transpus barreiras, quando optei pela neutralidade do Brasil em plena Guerra Fria. Assacaram contra mim a pecha de comunista, por reatar as relações diplomáticas com a União Soviética e por não aderir ao boicote a Cuba de Fidel Castro, promovido pelos Estados Unidos do governo Kennedy. Resumindo, eu, como presidente da República, achava-me com as mãos atadas, incapaz de cumprir as solenes promessas que fizera ao povo. Não dispunha de maioria no Congresso, o PSB e o PTB dominavam a Câmara e o Senado, opunham-se à minha política clara, sadia, regeneradora.
Jânio colocou a sua mão direita no meu ombro e outra vez de fisionomia rubra, agitado, com o cabelo caindo na testa, emitiu esta frase:
-Ninguém pode governar o Brasil se não tiver o apoio maciço do Congresso, ninguém!
O rosto dele parecia estar congestionado e os seus olhos despendiam fagulhas. No intento de acalmá-lo, desviei a conversa para outro assunto.
De fato nenhum homem ou mulher pode governar o nosso país se não tiver o apoio da Câmara Federal e do Senado. Eis aí o drama da presidenta Dilma Rousseff. Devido aos compromissos políticos que ela assumiu, para receber o indispensável apoio do Congresso e com este apoio dirigir a nação, Dilma nomeou sete ministros no primeiro ano do seu mandato e todos acabaram sendo demitidos, ou por corrupção, ou por atos reprováveis.
Antonio Palocci, ministro da Casa Civil, foi demitido no dia 7 de junho de 2011, pelo motivo de não explicar como multiplicou o seu patrimônio, entre os anos de 2006 e 2010.
Alfredo Nascimento, ministro do Transportes, foi demitido no dia 6 de julho do mesmo ano, por causa de um esquema de superfaturamento em obras públicas.
Nelson Jobim, ministro da Defesa, foi demitido no dia 7 do mês seguinte, depois de chamar os integrantes do governo de idiotas.
Wagner Rossi, ministro da Agricultura, foi demitido no dia 17 do mesmo mês de agosto, por atos de corrupção.
Pedro Novais, ministro do Turismo, foi demitido no dia 14 do mês seguinte, sob a acusação de usar o dinheiro dos cofres públicos em beneficio próprio.
Orlando Silva, ministro do Esporte, foi demitido no dia 26 de outubro de 2011, por se encontrar envolvido diretamente num esquema de desvio de recursos do programa Segundo Tempo.
Carlos Lupi, ministro do Trabalho, foi demitido no dia 4 de dezembro de 2011, acusado, entre outras coisas, de desvio das verbas de ONGs e de acumulo de cargos na Câmara dos Deputados e na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Este ex-ministro declarou: só sairia do cargo se fosse “abatido à bala”.
Como uma professora que expulsa, da sala de aula, sete maus alunos, a presidenta Dilma Rousseff enxotou do seu governo sete ministros...
Ela, a ex-guerrilheira, é dinâmica, inteligente, capacitada, mas para governar o Brasil de modo eficaz, precisa libertar-se, no decorrer do seu mandato, dos compromissos partidários. Dilma só deveria nomear pessoas de comprovada honestidade, não indicadas por qualquer partido, nem pelo PT, nem pelo PDT, nem pelo PMDB, nem pelo PSDB, enfim, negar-se a atender os pedidos dos líderes das várias agremiações políticas. Se estas lhe retirarem o apoio, movidas pela vingança, e Dilma ficar com minoria no Congresso, apesar de submeter a ele a aprovação de medidas acertadas, o povo a apoiará entusiasticamente, obrigando o Poder Legislativo da República a prestigiar o seu governo.
Presidenta Dilma: mande para os confins do Judas os líderes desses partidos!
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Escritor e jornalista, Fernando Jorge é autor do livro Se não fosse o Brasil, jamais Barack Obama teria nascido, cuja 3ª edição foi lançada pela Editora Novo Século
“Se vai ser o meu biógrafo, asseguro-lhe que meus ossos dormirão em paz.”
Certa ocasião, após almoçar com ele e dona Eloá, sua esposa, eu lhe disse:
-Presidente, o senhor me pediu para eu ser o seu biógrafo, porém preciso obter uma informação que é essencial nesse caso, embora não ignore a sua aversão pelo assunto.
Jânio Quadros fitou-me de maneira firme e respondeu:
-Já sei, Fernandinho (ele me chamava pelo diminutivo, carinhosamente), você quer saber a causa da minha renúncia.
-Sim, presidente.
-Veja, meu caro, estamos num país onde ninguém renuncia a nada. Apenas D. Pedro I, no ano de 1831, renunciou em favor do seu filho, D. Pedro de Alcântara, então com cinco anos de idade. E note, D. Pedro I não era brasileiro... Aqui todos se aferram aos seus cargos, às suas posições, de modo até feroz. O vereador, o deputado, o prefeito, o governador, o secretário de Estado, o ministro, o presidente da República, agarram-se aos seus cargos como os cães famélicos se atiram a um pedacinho de osso coberto de pouca carne. Perder o cargo, para essa gente, é como morrer, tornar-se vítima de uma tragédia sangrenta. E no entanto eu apresentei a minha renúncia ao Congresso, no dia 25 de agosto de 1961, depois de menos de sete meses de governo. Renunciei ao cargo supremo, num país, repito, onde ninguém renuncia a nada, a nada!
Nesse momento o rosto de Jânio ficou bem vermelho. Falava exaltado. Temendo pela sua saúde, pronunciei estas palavras:
-Presidente, se este assunto o desagrada, eu...
Ele me interrompeu:
-Não, não, você merece ouvir o que estou dizendo. Isto me faz bem, me alivia.
Mais sereno, Jânio prosseguiu, após tomar um gole de uísque:
-Eu havia prometido, a milhões dos meus eleitores, travar um combate ininterrupto ao clientelismo, ao empreguismo, à ineficiência administrativa, à corrupção endêmica e à burocracia obsoleta. Ansiei por alcançar, neste sentido, a minha total independência em relação a grupos e a partidos. E não foi sem dificuldades que consegui efetuar o corte dos subsídios às importações de trigo e petróleo, a fim de atrair os empréstimos do Exterior à nossa combalida economia. Também transpus barreiras, quando optei pela neutralidade do Brasil em plena Guerra Fria. Assacaram contra mim a pecha de comunista, por reatar as relações diplomáticas com a União Soviética e por não aderir ao boicote a Cuba de Fidel Castro, promovido pelos Estados Unidos do governo Kennedy. Resumindo, eu, como presidente da República, achava-me com as mãos atadas, incapaz de cumprir as solenes promessas que fizera ao povo. Não dispunha de maioria no Congresso, o PSB e o PTB dominavam a Câmara e o Senado, opunham-se à minha política clara, sadia, regeneradora.
Jânio colocou a sua mão direita no meu ombro e outra vez de fisionomia rubra, agitado, com o cabelo caindo na testa, emitiu esta frase:
-Ninguém pode governar o Brasil se não tiver o apoio maciço do Congresso, ninguém!
O rosto dele parecia estar congestionado e os seus olhos despendiam fagulhas. No intento de acalmá-lo, desviei a conversa para outro assunto.
De fato nenhum homem ou mulher pode governar o nosso país se não tiver o apoio da Câmara Federal e do Senado. Eis aí o drama da presidenta Dilma Rousseff. Devido aos compromissos políticos que ela assumiu, para receber o indispensável apoio do Congresso e com este apoio dirigir a nação, Dilma nomeou sete ministros no primeiro ano do seu mandato e todos acabaram sendo demitidos, ou por corrupção, ou por atos reprováveis.
Antonio Palocci, ministro da Casa Civil, foi demitido no dia 7 de junho de 2011, pelo motivo de não explicar como multiplicou o seu patrimônio, entre os anos de 2006 e 2010.
Alfredo Nascimento, ministro do Transportes, foi demitido no dia 6 de julho do mesmo ano, por causa de um esquema de superfaturamento em obras públicas.
Nelson Jobim, ministro da Defesa, foi demitido no dia 7 do mês seguinte, depois de chamar os integrantes do governo de idiotas.
Wagner Rossi, ministro da Agricultura, foi demitido no dia 17 do mesmo mês de agosto, por atos de corrupção.
Pedro Novais, ministro do Turismo, foi demitido no dia 14 do mês seguinte, sob a acusação de usar o dinheiro dos cofres públicos em beneficio próprio.
Orlando Silva, ministro do Esporte, foi demitido no dia 26 de outubro de 2011, por se encontrar envolvido diretamente num esquema de desvio de recursos do programa Segundo Tempo.
Carlos Lupi, ministro do Trabalho, foi demitido no dia 4 de dezembro de 2011, acusado, entre outras coisas, de desvio das verbas de ONGs e de acumulo de cargos na Câmara dos Deputados e na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Este ex-ministro declarou: só sairia do cargo se fosse “abatido à bala”.
Como uma professora que expulsa, da sala de aula, sete maus alunos, a presidenta Dilma Rousseff enxotou do seu governo sete ministros...
Ela, a ex-guerrilheira, é dinâmica, inteligente, capacitada, mas para governar o Brasil de modo eficaz, precisa libertar-se, no decorrer do seu mandato, dos compromissos partidários. Dilma só deveria nomear pessoas de comprovada honestidade, não indicadas por qualquer partido, nem pelo PT, nem pelo PDT, nem pelo PMDB, nem pelo PSDB, enfim, negar-se a atender os pedidos dos líderes das várias agremiações políticas. Se estas lhe retirarem o apoio, movidas pela vingança, e Dilma ficar com minoria no Congresso, apesar de submeter a ele a aprovação de medidas acertadas, o povo a apoiará entusiasticamente, obrigando o Poder Legislativo da República a prestigiar o seu governo.
Presidenta Dilma: mande para os confins do Judas os líderes desses partidos!
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Escritor e jornalista, Fernando Jorge é autor do livro Se não fosse o Brasil, jamais Barack Obama teria nascido, cuja 3ª edição foi lançada pela Editora Novo Século
by Acapulcoweb
Jânio Quadros e Tancredo Neves se
encontraram no Jardim Acapulco em 1981
Em 1981, o jornalista Nunzio Briguglio Filho e o repórter fotográfico Hélio Campos Mello, estiveram no Jardim Acapulco para registrar o encontro de duas personalidades ilustres da política do Brasil: Jânio da Silva Quadros e Tancredo de Almeida Neves. Dois ex-presidentes e ícones da nossa história.
Jânio era proprietário de uma residência no Jardim Acapulco na Av. Quatro com a Av. Oito. Após o seu falecimento, em 1992, a casa foi vendida.
Jânio também foi sócio da SAJA (Sociedade Amigos do Jardim Acapulco) e o livro de ata de uma das reuniões da sociedade tem o registro histórico com a assinatura do ex-presidente (veja foto abaixo). Sua frase "fi-lo porque qui-lo", e o seu português impecável, lhe renderam fama, entre outras peculiaridades. Curiosamente o seu nome foi escrito no livro (veja foto abaixo) sem acento.
Jânio era proprietário de uma residência no Jardim Acapulco na Av. Quatro com a Av. Oito. Após o seu falecimento, em 1992, a casa foi vendida.
Jânio também foi sócio da SAJA (Sociedade Amigos do Jardim Acapulco) e o livro de ata de uma das reuniões da sociedade tem o registro histórico com a assinatura do ex-presidente (veja foto abaixo). Sua frase "fi-lo porque qui-lo", e o seu português impecável, lhe renderam fama, entre outras peculiaridades. Curiosamente o seu nome foi escrito no livro (veja foto abaixo) sem acento.
Jânio sem o devido acento
O fato é que, todos foram pegos de surpresa.
A seguir, sua carta de renúncia, que abriria caminho à vinda de João Goulart à presidência, e pouco tempo depois….março de 64.
Fui vencido pela reação e, assim, deixo o Governo. Nestes sete meses, cumpri meu dever. Tenho-o cumprido, dia e noite, trabalhando infatigavelmente, sem prevenções nem rancores. Mas, baldaram-se os meus esforços para conduzir esta Nação pelo caminho de sua verdadeira libertação política e econômica, o único que possibilitaria o progresso efetivo e a justiça social, a que tem direito o seu generoso povo.
Desejei um Brasil para os brasileiros, afrontando, nesse sonho, a corrupção, a mentira e a covardia que subordinam os interesses gerais aos apetites e às ambições de grupos ou indivíduos, inclusive, do exterior. Forças terríveis levantam-se contra mim, e me intrigam ou infamam, até com a desculpa da colaboração. Se permanecesse, não manteria a confiança e a tranquilidade, ora quebradas, e indispensáveis ao exercício da minha autoridade. Creio mesmo, que não manteria a própria paz pública. Encerro, assim, com o pensamento voltado para a nossa gente, para os estudantes e para os operários, para a grande família do País, esta página de minha vida e da vida nacional. A mim, não falta a coragem da renúncia.
Saio com um agradecimento, e um apelo. O agradecimento, é aos companheiros que, comigo, lutaram e me sustentaram, dentro e fora do Governo e, de forma especial, às Forças Armadas, cuja conduta exemplar, em todos os instantes, proclamo nesta oportunidade.
O apelo, é no sentido da ordem, do congraçamento, do respeito e da estima de cada um dos meus patrícios para todos; de todos para cada um.
Somente, assim, seremos dignos deste País, e do Mundo.
Somente, assim, seremos dignos da nossa herança e da nossa predestinação cristã.
Retorno, agora, a meu trabalho de advogado e professor.
Trabalhemos todos. Há muitas formas de servir nossa pátria.
Brasília, 25-8-61.
E também sua carta apresentada ao congresso nacional.
O fato é que, todos foram pegos de surpresa.
A seguir, sua carta de renúncia, que abriria caminho à vinda de João Goulart à presidência, e pouco tempo depois….março de 64.
Fui vencido pela reação e, assim, deixo o Governo. Nestes sete meses, cumpri meu dever. Tenho-o cumprido, dia e noite, trabalhando infatigavelmente, sem prevenções nem rancores. Mas, baldaram-se os meus esforços para conduzir esta Nação pelo caminho de sua verdadeira libertação política e econômica, o único que possibilitaria o progresso efetivo e a justiça social, a que tem direito o seu generoso povo.
Desejei um Brasil para os brasileiros, afrontando, nesse sonho, a corrupção, a mentira e a covardia que subordinam os interesses gerais aos apetites e às ambições de grupos ou indivíduos, inclusive, do exterior. Forças terríveis levantam-se contra mim, e me intrigam ou infamam, até com a desculpa da colaboração. Se permanecesse, não manteria a confiança e a tranquilidade, ora quebradas, e indispensáveis ao exercício da minha autoridade. Creio mesmo, que não manteria a própria paz pública. Encerro, assim, com o pensamento voltado para a nossa gente, para os estudantes e para os operários, para a grande família do País, esta página de minha vida e da vida nacional. A mim, não falta a coragem da renúncia.
Saio com um agradecimento, e um apelo. O agradecimento, é aos companheiros que, comigo, lutaram e me sustentaram, dentro e fora do Governo e, de forma especial, às Forças Armadas, cuja conduta exemplar, em todos os instantes, proclamo nesta oportunidade.
O apelo, é no sentido da ordem, do congraçamento, do respeito e da estima de cada um dos meus patrícios para todos; de todos para cada um.
Somente, assim, seremos dignos deste País, e do Mundo.
Somente, assim, seremos dignos da nossa herança e da nossa predestinação cristã.
Retorno, agora, a meu trabalho de advogado e professor.
Trabalhemos todos. Há muitas formas de servir nossa pátria.
Brasília, 25-8-61.
E também sua carta apresentada ao congresso nacional.