domingo, 24 de março de 2013

Vaticano é acusado de gastar R$ 58 milhões em complexo que abriga sauna gay Pelo menos 18 dos cardeais responsáveis pela escolha do Pontífice moram no local, em Roma




A basílica de São Pedro, em Roma

Um dia antes do início do conclave que irá eleger o Papa que substituirá Bento XVI, um novo escândalo sobre o Vaticano tomou conta da imprensa internacional. De acordo com o jornal “Independent”, a instituição religiosa teria gasto € 23 milhões (mais de R$ 58 milhões) em apartamentos de um prédio em Roma que abriga nada menos que a maior sauna gay da Europa.

Pelo menos 18 dos cardeais responsáveis pela escolha do Pontífice moram no local. Um deles é Ivan Dias, chefe da Congregação para Evangelização dos Povos, de 76 anos, que vive no mesmo andar onde funciona a sauna. Visto como um conservador, mesmo para os padrões atuais da Igreja, o ex-arcebispo de Bombaim teria ficado “horrorizado” com a descoberta. Uma de suas crenças é de que gays e lésbicas podem ser curados de suas “tendências não naturais através do sacramento da penitência”.

Segundo a imprensa local, o investimento no imóvel, realizado em 2008 pelo cardeal Tarcisio Bertone, foi realizado graças a generosos benefícios fiscais recebidos pela Igreja Católica durante o governo de Silvio Berlusconi. A propriedade é reconhecida como parte da Cidade Santa.

Leitores de sites gays italianos foram rápidos em fazer piadas sobre o tema.

“Se você não pode ir a uma sauna gay por medo de ser visto, o que você faz com milhões de euros roubados de italianos? Compra um bloco de apartamentos com a sauna dentro”, dizia um dos comentários do “Gay.it”.

A denúncia acontece em um momento delicado para a Igreja, que ainda se recupera de especulações a respeito da renúncia de Bento XVI. Chegou a ser dito que a saída do teólogo alemão ocorreu devido à presença de cardeais homossexuais dentro do Vaticano.
Primeiro dia de conclave termina com fumaça preta


Fumaça negra sai da chaminé instalada na Capela Sistina

Terminou com fumaça preta a primeira reunião do conclave para escolher o sucessor de Bento XVI, nesta terça-feira. Ao final de três horas de reunião, os cardeais eleitores reunidos na Capela Sistina não chegaram a um consenso, e um produto químico foi adicionado aos votos durante a queima.

A fumaça saindo pela chaminé da Capela Sistina foi observada por milhares de pessoas que aguardavam na Praça de São Pedro. Quando o novo Pontífice for escolhido, a fumaça será branca. As reuniões do conclave serão retomadas na manhã desta quarta-feira e continuarão até que haja um eleito. Já era esperado que o primeiro dia terminasse sem que um nome fosse escolhido. Especialistas acreditam que somente quarta-feira à tarde ou quinta-feira seja conhecido o nome do novo ocupante do Trono de Pedro.

Mais cedo, cantando a “Ladainha dos santos”, um canto gregoriano que pede aos mártires a inspiração, os 115 cardeais seguiram em fila no início da tarde desta terça-feira até a Capela Sistina para iniciar o conclave que escolherá o sucessor do Papa Bento XVI. O Vaticano já informou que é mínima a chance de um nome ser definido ainda na primeira votação

Uma vez na capela, os cardeais prestaram um juramento de sigilo, comprometendo-se a não divulgar qualquer informação sobre o que for tratado dentro do conclave. O religiosos estão proibidos de se comunicar com o mundo exterior, incluindo o acesso à internet e a redes sociais. O cardeal sul-africano Wilfrid Napier chegou a brincar, dizendo que já estava com síndrome de abstinência do Twitter.

A procissão obedeceu à ordem de cardinalato à qual cada um pertence. Primeiro entram os cardeais diáconos, que atuam na Cúria Romana. Atualmente são 30, entre eles o cardeal brasileiro João Braz de Aviz, que é prefeito emérito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica.

A seguir é a vez dos Cardeais presbíteros, os que estão à frente das dioceses pelo mundo. São a maioria que participam deste Conclave: 81. Entre eles, os outros quatro Cardeais brasileiros: Geraldo Majella Agnelo, Cláudio Hummes, Raymundo Damasceno Assis e Odilo

Por fim, os Cardeais bispos, aqueles que assumem dioceses suburbicárias em Roma. São somente quatro, sendo o mais idoso o Giovanni Battista Re, que é justamente o Decano do Conclave.

Após o juramento, foi proclamado o “extra omnis”, para que todos os não eleitores deixassem o recinto, e lacrada a porta da capela, dando início formalmente às deliberações para a escolha do novo Papa.

Até que a fumaça branca anuncie que o trono de Pedro tem um novo ocupante, seguem intensas as especulações. Hoje, o jornal italiano “Corriere della Serra” disse que o arcebispo de Milão, cardeal Angelo Scola, já teria 50 dos 77 votos necessários. Segundo a reportagem, o brasileiro Odilo Scherer, embora ainda um dos mais cotados, teria perdido força por conta de sua ligação com a Cúria romana, abalada por uma série de escândalos.

Missa solene teve como tema o amor e a unidade da Igreja

Pela manhã, os cardeais participaram da missa solene, celebrada pelo decano Angelo Sodano, que, por ter mais de 80 anos, não participa do conclave. Na homilia, Sodano fez diversas homenagens e Bento XVI, que renunciou ao pontificado no dia 11 de fevereiro, e pediu a Deus um novo “Bom Pastor” que lidere os cerca de 1,2 bilhão de católicos em todo o mundo.

Ao contrário do contundente discurso que Bento XVI, então ainda cardeal Josef Ratzinger, proferiu em 2005, atacando a “ditadura do relativismo”, Sodano foi conciliador em sua fala, ressaltando a importância do amor como “maior mandamento” e o trabalho de cada um pela unidade da Igreja. Segundo especialistas, o cardeal não sinalizou a preferência por qualquer um dos candidatos.

Nem tudo foi serenidade e meditação na missa. O cardeal italiano Antonio Maria Veglio passou mal e precisou ser socorrido durante a cerimônia. O Vaticano, porém, não informou a natureza do problema.

Os cardeais mudaram-se nas primeiras horas do dia para a Casa de Santa Marta, onde ficarão hospedados durante toda a duração do conclave.

Fonte: O Globo

Empresa ligada a Cachoeira vence licitação no Pará Empresa ganhou licitação de R$ 100 milhões para fornecer comida a 12 mil presos de Justiça no Pará




Empresa ganhou licitação de R$ 100 milhões para fornecer comida a 12 mil presos de Justiça no Pará

O jogo pesado de Carlinhos Cachoeira para ganhar concorrências públicas fraudulentas chegou ao Pará, onde a empresa Cial Comércio e Indústria de Alimentos, a ele ligada, acaba de abocanhar uma licitação de R$ 100 milhões. A Cial vai fornecer café da manhã, almoço e jantar aos 12 mil presos de justiça que superlotam as penitenciárias do Estado e também aos três mil policiais e agentes encarregados da segurança nas casas penais.

Para vencer a licitação aberta pela Secretaria de Segurança Pública, a empresa teve de convencer os concorrentes a desistir de enfrentá-la, oferecendo às que entrassem na disputa pequenas fatias no fornecimento da alimentação. Ela garantia que, no final, todo mundo iria se dar bem. Desde que, é claro, todos ficassem de boca fechada. Quem recusou entrar no esquema foi bater nas portas da Justiça.

Derrotada no pregão eletrônico por incrível R$ 0,1, a empresa Oliveira Alimentos, atual fornecedora da comida aos presos, denunciou a trama ao Ministério Público, anexando um DVD com duas horas de conversas entre os empresários em que eles combinavam quem iria ganhar ou perder a licitação. O DIÁRIO obteve cópia do DVD e, num dos trechos da conversa (ver ao lado), o representante da Cial afirma que o que ficasse combinado entre as empresas teria o apoio de “gente de cima” do governo estadual. O promotor Nelson Medrado ficou estarrecido com o que ouviu. E ingressou com pedido de liminar para suspender a concorrência.

O motivo alegado pelo promotor não foram as conversas nada republicanas de acerto entre os empresários que brigavam para fornecer comida aos presos- o que deve provocar um outro processo, em data oportuna -, mas a acusação de que teria havido inadequação à exigência do edital de apresentação de balanço patrimonial, tendo a Cial apresentado cópias xerografadas do livro contábil do período de 01 a 31 de julho de 2011, além de não apresentar nutricionista na relação de seu quadro profissional e também de responder a processo judicial em ação civil pública por ato de improbidade administrativa.

O juiz da 2ª Vara da Fazenda de Belém, Marco Antônio Lobo Castelo Branco, acolheu o pedido, determinando a suspensão. A decisão do juiz foi tomada em dezembro do ano passado. “A coletividade corre o risco de sofrer dano de difícil reparação, uma vez que o certame seguirá para as próximas fases culminando com a contratação de empresa possivelmente habilitada de forma irregular”, afirmou Castelo Branco no despacho. Para surpresa de Medrado, o mesmo juiz, no começo desta semana, retratou-se da decisão que havia tomado em dezembro, autorizando que a Cial de Cachoeira seja contratada, em “caráter provisório, até decisão de mérito”.

Medrado disse que está recorrendo contra a decisão de Castelo Branco, porque as irregularidades na licitação seriam graves, além dos fatos contidos nas gravações. “Eu pedi há quase três meses que a polícia mandasse para mim o inquérito, com os depoimentos dos envolvidos nessas conversas, mas até agora ela não fez isso”, conta o promotor.

Segup só vê ‘choro’. Contrato inicia amanhã

O secretário de Segurança, Luiz Fernandes, definiu como “choro de derrotado” a denúncia de irregularidades. “Quem perdeu me procurou várias vezes, uma delas questionando a documentação da vencedora. Houve recurso jurídico e ele foi indeferido”, disse Fernandes.

No caso das gravações em que as partes combinam preços e quem sairá vencedor, o secretário disse que não ouviu as gravações, mas que ao receber a denúncia mandou abrir inquérito imediatamente. Também garante que, se houve gravação, isso não interferiu na licitação. “Tudo foi feito dentro da lei, com total transparência, e o nosso setor jurídico agiu corretamente”.

Perguntado se sabia que a vencedora era ligada a Cachoeira, Fernandes respondeu que o que existe é “nota de jornal”. Mas, se há alguma ligação, emendou que a empresa não estaria impedida de concorrer. “Eu não me meto nisso”, disparou o secretário.

“LEVAR FERRO”

Ninguém da Cial ou do grupo de Carlinhos Cachoeira foi localizado em Belém e em Goiânia para falar sobre o caso. A empresa deve começar a fornecer a comida aos presos de todo o Pará a partir desta segunda-feira. O bicheiro sempre brigou pelas licitações em favor da Cial em outras capitais do País com a mesma voracidade com que um faminto avança sobre um prato de comida.

Conversas telefônicas da Polícia Federal na Operação Monte Carlo revelam a interferência de Cachoeira em uma briga na justiça da Cial para tirar da jogada uma concorrente, a Coral, com quem disputava o fornecimento de marmitas aos presos da cadeia de Aparecida de Goiânia (GO).

Na data de 9 de outubro de 2011, Cachoeira dialoga com um homem identificado pela PF como Michel. À certa altura, Michel pergunta se a Cial pertencia ao bicheiro. “Não é minha não, rapaz”, ele responde. “É de amigos. É Cial. A nossa é a Cial”. Michel, parecendo duvidar, indaga: Cial ou Coral? E Cachoeira, incisivo: “Não. É para ser a Cial. A Coral tem de levar ferro”.

AS NEGOCIATAS AO TELEFONE – EU GANHO, TU FORNECES

Em um dos trechos da gravação, feita de um aparelho celular, um homem identificado por Miro, da empresa Qualichef, que pertence ao mesmo grupo da Cial, uma das participantes da licitação, fala que queria que fizessem uma parceria em que a empresa Oliveira Alimentos – que denunciou o esquema ao MP – ganharia a licitação e ele, referindo-se a uma outra pessoa, trocaria o fornecimento da comida.

QUESTIONOU, DANÇOU

Em outra conversa, o homem identificado como Zé Antônio, o Toinho, comenta que o pessoal da Secretaria de Segurança teria praticado uma única falha por ter sido “induzido a erro”. Isso teria ocorrido, segundo Toinho, porque a Oliveira Alimentos “foi questionar a inabilitação da empresa ( Cial) quanto ao capital”. Diz ainda que, por conta disso, “ele”, sem especificar quem, “abriu o leque”. E dá a entender que existe alguém da Secretaria de Segurança envolvido no acordo. Cita como exemplo que, por conta do erro, os lotes de Marabá e Santarém da licitação foram colocados em “stand by”, ou seja, em espera.

É DE AMIGOS, É CIAL. A NOSSA É A CIAL

Na data de 9 de outubro de 2011, Cachoeira dialoga com um homem identificado pela PF como Michel. À certa altura, Michel pergunta se a Cial pertencia ao bicheiro. “Não é minha não, rapaz”, ele responde. “É de amigos. É Cial. A nossa é a Cial”. Michel, parecendo duvidar, indaga: Cial ou Coral? E Cachoeira, incisivo: “Não. É para ser a Cial. A Coral tem de levar ferro”.

UM LOTE É MEU; OUTRO, É TEU

Em uma conversa de 50 segundos, Miro fala da proposta sobre os contratos. Propõe que a empresa concorrente ceda um lote do interior, permanecendo com outro do interior e o da capital. Toinho entra na conversa lembrando que diante do que for decidido, tem-se compromisso.

Um homem conhecido por Euler pressiona em busca de uma decisão. Ele fala para o representante da Oliveira Alimentos que ele tem que escolher um dos caminhos que propõe. E continua dizendo que propõe em ficar como subcontratado da empresa Oliveira e assim acaba o problema.

ACERTO PARA FISGAR CONTRATOS

A pergunta da conversa agora é: qual será o acerto? Miro responde que ficaria em parceria com a empresa Oliveira na capital, a empresa Oliveira fica sozinha em Marabá e ele – não especifica nome – ficaria com Santarém. Toinho, entusiasmado, fala que melhor do que isso não existe. Toinho fala que não era para entrar ninguém e que era para eles jogarem – participar dos contratos – sozinhos.

Fonte: Diário do Pará

Época’: Lindbergh é acusado de ter recebido propina


O senador Lindbergh Farias, acusado de ter recebido propina quando era prefeito de Nova Iguaçu


Senador Lindenberg
Senador Lindenberg
O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) foi acusado de ter montado um esquema de recebimento de propina de empresas contratadas por Nova Iguaçu, quando ele foi prefeito do município, entre 2005 e 2010. Reportagem publicada neste sábado pela revista “Época” fez um levantamento a partir de documentos obtidos com o PMDB que fazem parte de um inquérito a que o senador petista responde no Supremo Tribunal Federal (STF).
O PMDB é contrário à pré-candidatura do senador ao governo do Rio em 2014 e defende o nome do vice-governador Luiz Fernando Pezão. As trocas de farpas entre as duas pré-campanhas ficaram mais intensas nos últimos meses, e, a partir de agora, incluem a divulgação de dossiês. Segundo a “Época”, o inquérito a que Lindbergh responde no STF contém acusações de corrupção, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro, todas relativas ao período em que o petista foi prefeito de Nova Iguaçu.
A investigação é baseada em dois depoimentos prestados em 2007 ao Ministério Público Estadual por Elza Elena Barbosa Araújo, ex-chefe de gabinete da Secretaria de Finanças de Nova Iguaçu, que até então estava sob sigilo. Segundo ela, logo no início do mandato, em 2005, Lindbergh montou um esquema de captação de propina entre empresas contratadas pela prefeitura. Os valores chegariam a até R$ 500 mil por contrato. Os recursos eram usados, segundo a acusação, para quitar despesas pessoas do então prefeito, inclusive prestações de um apartamento da mãe dele, Ana Maria, em Brasília.
Outra acusação da ex-funcionária da prefeitura atinge Carlos Frederico Farias, irmão de Lindbergh. A empresa Bougainville Urbanismo, de sua propriedade, teria recebido R$ 250 mil do esquema.
O Tribunal de Justiça do Rio autorizou a quebra de sigilos do senador, inclusive de cartão de crédito e aplicações financeiras. A revista informa que obteve cópias de duas decisões que determinaram quebra de sigilo. Segundo a “Época”, o desembargador Alexandre Varella considerou que os extratos sustentam as acusações de Elza. Varella ainda disse que o pedido do MP também foi baseado em depoimentos de outras testemunhas que teriam confirmado detalhes do esquema. A reportagem ainda cita denúncias contra empresas contratadas por Nova Iguaçu, como a 7R Comércio de Materiais de Escritório, que receberia pagamentos, mas não entregaria mercadorias. Os contratos chegariam a R$ 1,1 milhão.
À “Época”, o senador disse que não se intimidará com o dossiê e que será candidato “com tudo aberto”. Em referência indireta à casa que o governador Sérgio Cabral tem em Angra dos Reis, o senador disse não ter “mansão incompatível” com seus rendimentos. Para o petista, a “devassa” feita em sua vida não terá resultado: “Não vai aparecer nada”, disse à revista. Sobre a quebra de sigilo, o senador disse que foi “uma violência, covardia”.
Advogados do petista negaram à reportagem qualquer esquema de corrupção e afirmam que a empresa 7R prestou todos os serviços contratados. Segundo eles, o apartamento em Brasília citado por Elza foi da mãe do senador, mas, na época dos pagamentos citados, a propriedade pertencia a Francisco José de Souza, então secretário de Finanças de Nova Iguaçu.
Carlos Frederico, irmão de Lindbergh, disse que a Bouganinville jamais recebeu dinheiro público. Ele classificou a acusação como mentirosa e disse que nunca teve relação com a prefeitura de Nova Iguaçu.

Fonte: O Globo

Lula e as empreiteiras, FHC e a Sabesp




A Folha de São Paulo publicou com grande destaque em sua primeira página, na edição desta sexta-feira, 22 de março de 2013, manchete que parece anunciar um grande escândalo. Diz o jornal, em tom grandiloquente, que “Empreiteiras patrocinam 13 viagens de Lula ao exterior”.
Na linha fina que segue a espalhafatosa manchete, outra “acusação”: “Ex-presidente foi a países onde empresas têm interesses; todos negam lobby”.
No primeiro caderno, o de política, três grandes matérias sobre a manchete escandalizadora:
Devido ao tom da manchete em letras garrafais, colocada em destaque principal na primeira página, bem como devido à redação confusa das matérias vinculadas, têm-se a impressão de que o ex-presidente Lula foi pago com dinheiro público brasileiro para vender facilidades para empreiteiras brasileiras junto ao governo brasileiro.
Apesar do amplo destaque dado à “denúncia”, porém, a certa altura da matéria principal, em vez de ela explicar direito que Lula foi pago por construtoras brasileiras para dar palestras em países da América Latina e da África de forma a promover essas empresas junto a governos dos países daquelas regiões – o que, por óbvio, é positivo porque alavanca negócios para o país – e que não existe qualquer ilegalidade nisso, o jornal preferiu dar uma informação que, em vez de esclarecer, permite alguma dúvida sobre a legalidade da atividade do ex-presidente:
Dois procuradores da República, um delegado federal, um juiz e dois advogados disseram à Folha que não há, a princípio, irregularidades nas viagens por não haver lei sobre a atuação de ex-presidentes”.
A cautelosa expressão “a princípio” supostamente usada pelos “dois procuradores”, pelo “delegado federal” e pelos “dois advogados” que a Folha diz ter consultado, tal expressão não passa de excesso de cautela, possivelmente para agradar a um dos veículos que chantageiam autoridades para que digam ou façam o que querem contra seus inimigos políticos. Afinal, não existe irregularidade alguma na atividade PRIVADA de Lula.
Todavia, tentando estabelecer um vínculo entre relações de Lula com empresas privadas brasileiras e governos estrangeiros e o governo do Brasil, o jornal põe uma segunda matéria que pretende apontar o que procuradores, delegado e advogados que diz que consultou, não viram.
A segunda matéria do caderno Poder da Folha de 22 de março diz que “Lula promete repassar pedidos a Dilma”. Essa matéria, se tivesse algum conteúdo, possibilitaria insinuar que estaria havendo algum tipo de influência de Lula junto à Presidência da República para que esta ajudasse as empresas que o pagam.
A matéria não aponta nada disso. Leia, abaixo. Em seguida continuo.
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FOLHA DE SÃO PAULO
22 DE março de 2013
No exterior, o ex-presidente Lula participou de encontros privados entre políticos locais e empresários brasileiros, além de prometer levar pedidos a Dilma Rousseff, segundo telegramas do Itamaraty.
Em maio de 2011, Lula foi ao Panamá a convite da Odebrecht. Na agenda, visitas a obras da empresa com ministros, o presidente Ricardo Martinelli e a primeira-dama.
O diretor da Odebrecht no país ofereceu jantar em sua casa para Lula, Martinelli e os ministros da Economia, Obras Públicas e Assuntos do Canal.
Ao final do jantar, o ex-presidente prometeu levar três pedidos a Dilma, em encontro na mesma semana: maior presença da Petrobras no Panamá, um encontro entre os ministros dos dois países e a criação de um centro de manutenção da Embraer.
A Odebrecht obteve no Panamá contratos de US$ 3 bilhões. Cinco meses depois do jantar, engenheiros da construtora foram fotografados com um estudo de impacto ambiental sobre uma obra que só seria anexado à licitação três meses mais tarde.
A brasileira conquistou a obra de US$ 776 milhões e foi acusada de já saber do resultado previamente pela ONG Orgulho Panamá. “Há um sentimento geral de que a obra é motivada simplesmente por interesses especiais. O maior interesse comercial é da Odebrecht e políticos”, diz, em nota, a organização.
Em julho de 2011, Lula esteve em Angola para um evento patrocinado pela Odebrecht -empresa que tem 20 mil funcionários no país.
“Quando era presidente, Lula não gostava do presidente de Angola, mas ganhou um bom dinheiro para dizer que está tudo bem no país, o que é importante para a elite corrupta”, disse à Folha Rafael Marques, da ONG Maka Angola.
Em junho de 2011, Lula viajou em jato da Odebrecht para Caracas, na Venezuela. Lá, encontrou-se com “grupo restrito de autoridades e representantes do setor privado”.
A conversa com o então presidente Hugo Chávez, morto este mês, ocorreu no momento em que o governo local devia cerca de US$ 1 bilhão à empreiteira por obras como a do metrô de Caracas.
Três dias após a visita, Chávez anunciou que as dívidas com a Odebrecht estavam “quase” resolvidas.
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Como se vê, no segundo dos três textos sobre a “denúncia” que o jornal fez com enorme destaque em sua primeira página, constrói-se a teoria de que “o ex-presidente prometeu levar três pedidos a Dilma” para favorecer empreiteiras brasileiras.
O ex-presidente teria prometido ao presidente do Panamá que pediria a Dilma “Maior presença da Petrobrás no Panamá, um encontro entre os ministros dos dois países [Brasil e Panamá] e a criação de um centro de manutenção da Embraer”.
Ou seja: haveria um legítimo – e antiético – lobby de Lula junto a uma presidente sobre a qual ele exerce conhecida e ampla influência.
Que fique registrado, portanto, que uma empresa pública ou estatal brasileira – no caso, a Petrobrás – realizar operações no país vizinho é considerado pela Folha de São Paulo um grande escândalo que merece destaque escandaloso em sua primeira página.
Não esqueça, leitor, porque precisará dessa informação logo adiante.
Ocorre que, como a matéria mostra (ao bom entendedor), o jornal não descobriu absolutamente nada que relacione as atividades da Petrobrás no Panamá à suposta “promessa” de Lula de pedir a Dilma que a empresa aumentasse suas atividades naquele país.
De forma confusa, a matéria, em seguida, pula para uma acusação que se confunde com aquela sobre a Petrobrás, mas que nada tem a ver. Diz que “A Odebrecht obteve no Panamá contratos de US$ 3 bilhões. Cinco meses depois do jantar, engenheiros da construtora foram fotografados com um estudo de impacto ambiental sobre uma obra que só seria anexado à licitação três meses mais tarde”.
O que tem a ver com a Petrobrás a obra que a Odebrecht conseguiu junto ao governo do Panamá? Nada. O governo do Panamá pode fazer quantas obras quiser com a Odebrecht mesmo se for a pedido de Lula que, no Brasil, não se pode reclamar de nada.
O máximo que poderia haver de ilegal nesse caso seria relativo ao Panamá. A matéria, então, já esquecida da Petrobrás, diz que uma ONG panamenha questiona o governo panamenho por suas relações com a empreiteira brasileira.
Todavia, não diz qual é a acusação. Faz apenas uma ilação sobre parecer que há alguma coisa estranha.
Não há nada, absolutamente nada na “denúncia” contra Lula que sequer insinue que o governo brasileiro mexeu uma palha pelas empreiteiras brasileiras a pedido de Lula.
O que espanta na iniciativa da Folha de São Paulo, então, é que aquilo de que acusa Lula – e que sua matéria não conseguiu provar – o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso fez comprovadamente em 2007 através do Instituto Fernando Henrique Cardoso.
Em 17 de janeiro de 2007, foi o portal Terra quem fez a denúncia de que uma grande empresa estatal, a Sabesp (empresa de saneamento básico de São Paulo, Estado governado pelo PSDB, partido de FHC), doou QUINHENTOS MIL REAIS (!) ao Instituto Fernando Henrique Cardoso (IFHC).
Leia, abaixo, a matéria do Terra. Em seguida continuo.
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TERRA MAGAZINE
17 de janeiro de 2007
Daniel Bramatti
O Instituto Fernando Henrique Cardoso, ONG criada pelo ex-presidente tucano com a ajuda de grandes empresários, foi contemplado no ano passado com uma doação de R$ 500 mil de uma empresa estatal do governo paulista, que no período 2003-2006 foi comandado por Geraldo Alckmin (PSDB) e Cláudio Lembo (PFL).
O dinheiro saiu da Sabesp – então presidida por outro tucano, Dalmo Nogueira Filho – e foi direcionado para um projeto de conservação e digitalização do acervo do instituto, conhecido pela sigla iFHC.
A Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) é uma das sete empresas que, até o final do ano passado, haviam doado R$ 2.095.000,00 para o projeto de preservação e digitalização do acervo do iFHC, com incentivos fiscais da chamada Lei Rouanet – as contribuições podem ser descontadas do Imposto de Renda.
O acervo é formado por livros, fotos e obras de arte de FHC e também de sua mulher, Ruth Cardoso. Reúne não apenas itens coletados durante a passagem do tucano pela Presidência, mas também da época em que era professor e um dos líderes da oposição ao regime militar. Entre os objetos em processo de catalogação estão os presentes que FHC recebeu durante seu governo – vasos, quadros, tapetes e até capacetes de pilotos de Fórmula 1.
O projeto de preservação e digitalização do acervo está orçado em mais de R$ 8 milhões – valor que equivale a cinco vezes o orçamento anual da Biblioteca Mário de Andrade, a maior de São Paulo, com mais de 3,2 milhões de itens.
O site do iFHC afirma que a digitalização dos documentos será feita com softwares e equipamentos cedidos pela IBM e pela Sun Microsystems do Brasil, mas não faz referência à Sabesp e aos outros patrocinadores, nem detalha como serão aplicados os R$ 2 milhões já recebidos. Ontem à noite, a entidade divulgou uma nota sobre o assunto (leia aqui).
O Instituto Fernando Henrique Cardoso é uma espécie de “organização ex-governamental” – reúne em seu conselho deliberativo diversas estrelas dos dois mandatos presidenciais tucanos, entre eles ex-ministros como Pedro Malan (Fazenda), Luiz Carlos Bresser-Pereira (Administração) e Celso Lafer (Relações Exteriores e Desenvolvimento).
A entidade tem como fonte de inspiração as fundações mantidas por ex-presidentes norte-americanos. Mas as semelhanças são limitadas. A ONG do ex-presidente Bill Clinton, por exemplo, atua na prática: apóia e implementa programas de combate à aids, de redução do custo de medicamentos e de controle do aquecimento global, entre outros. Também administra uma biblioteca pública no Estado de Arkansas que recebe cerca de 300 mil visitantes por ano.
Já o iFHC afirma ter dois objetivos básicos: o primeiro é a preservação do próprio acervo do ex-presidente e de sua mulher; o segundo é a promoção de debates e seminários – que são restritos a convidados. O site do instituto na internet destaca que “o iFHC, entidade privada, não está aberto à visitação pública”.
O site também anuncia que parte do acervo será aberto ao público quando for concluído seu processo de catalogação e digitalização. Não há informações sobre a possibilidade de pesquisar os itens mais interessantes, do ponto de vista histórico e jornalístico: as gravações e anotações que o ex-presidente fez, durante seus oito anos de governo, sobre temas polêmicos como privatizações e reeleição.
O auxílio estatal ao instituto, via Sabesp, foge à regra: o iFHC nasceu e é mantido graças a contribuições privadas. Quando inaugurado, em 2004, tinha R$ 10 milhões em caixa. O tucano começou a pedir doações a empresários quando ainda era presidente.
Em um jantar no Palácio da Alvorada, em 2002, FHC expôs os planos de sua futura ONG a convidados como Emílio Odebrecht (grupo Odebrecht), Lázaro Brandão (Bradesco), Olavo Setubal (Itaú), Benjamin Steinbruch (CSN), Pedro Piva (Klabin) e David Feffer (Suzano). Na época, o colunista Elio Gaspari criticou o fato de a coleta de fundos ser feita entre representantes de empresas financiadas pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) ou contempladas no processo de privatização.
Já as relações da Sabesp com políticos do PSDB não constituem propriamente uma novidade. No ano passado, reportagens da Folha de S.Paulo revelaram que a estatal patrocinou uma edição da revista Ch’an Tao, do acupunturista do então candidato à Presidência Geraldo Alckmin – o tucano foi assunto de capa e apareceu em 9 das 48 páginas da publicação.
A estatal também destinou R$ 1 milhão de sua verba publicitária para uma editora e um programa de TV do deputado estadual Wagner Salustiano (PSDB). O Ministério Público abriu uma investigação sobre o eventual uso de empresas do Estado para beneficiar aliados de Alckmin na Assembléia Legislativa.
Terra Magazine procurou ontem a Sabesp e FHC, em busca de esclarecimentos sobre a doação de R$ 500 mil. Não houve resposta da estatal. A assessoria do iFHC informou apenas que o ex-presidente não se encontrava no local.
Além da Sabesp, da Sun e da IBM, os outros patrocinadores do projeto de digitalização do iFHC são as empresas Philco Participações (R$ 600 mil), Arosuco Aromas e Sucos (do grupo Ambev, R$ 600 mil), Mineração Serra Grande (do grupo Anglo-American, R$ 200 mil), Norsa Refrigerantes (representante da Coca-Cola no Nordeste, R$ 140 mil), Rio Bravo Investimentos (R$ 30 mil) e BES Investimentos do Brasil (R$ 25 mil).
A Rio Bravo Investimentos foi fundada e é dirigida por Gustavo Franco, que presidiu o Banco Central nos anos FHC. A Norsa Refrigerantes têm entre seus proprietários outro tucano famoso, o senador Tasso Jereissati (CE). O BES Investimentos faz parte do grupo português Espírito Santo, cujo representante no Brasil, Ricardo Espírito Santo, teve seu nome associado ao escândalo do mensalão por supostas relações com o publicitário Marcos Valério. Em 2005, o banqueiro foi acompanhado por Valério a uma reunião com o então ministro da Casa Civil, José Dirceu. Em 2002, Ricardo Espírito Santo também estava no jantar do Palácio da Alvorada em que FHC pediu contribuições para a criação de sua ONG.
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Como se vê, outro ex-presidente recebe benefícios imensos de empresas públicas e privadas brasileiras de todo tipo, mas isso não vira escândalo.
O jornal que acusa Lula com tanto destaque por seus negócios privados, que não têm relação alguma com empresas estatais ou públicas, em 2007 repercutiu a matéria do Terra no dia seguinte à sua publicação, no dia 18 de janeiro.
Porém, o que escandaliza é que a Folha, à diferença do que faz com Lula em um caso sem gravidade, não repercutiu o caso de FHC, que é grave, com mínimo destaque. E, claro, sem chamada alguma na primeira página.
Leia, abaixo, a notinha que a Folha publicou escondida em suas páginas internas em 2007 relatando a denúncia do Terra sobre a qual a mesma Folha – ou qualquer outro grande veículo – nunca mais disse nada – o que, por certo, não acontecerá na acusação vazia contra Lula.
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FOLHA DE SÃO PAULO
17 de janeiro de 2007
DA REPORTAGEM LOCAL
O Instituto Fernando Henrique Cardoso, entidade não-governamental criada pelo ex-presidente da República, recebeu no ano passado doação de R$ 500 mil da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), administrada por indicados pelo PSDB.
A ONG do ex-presidente captou por meio da Lei Rouanet, de incentivo a cultura, cerca de R$ 2 milhões de doadores diversos, entre os quais a Sabesp, para um projeto de preservação do acervo de FHC -documentos, fotografias e objetos. Em nota, o instituto negou haver irregularidades na doação.
A Sabesp é uma empresa de economia mista cujo principal acionista é o governo do Estado de São Paulo. A doação feita pela empresa foi revelada por reportagem publicada ontem no site “Terra Magazine”. De acordo com o texto, os recursos serão abatidos do Imposto de Renda por meio da Lei Rouanet.
A nota divulgada ontem pelo instituto FHC explica que as doações, fruto de um projeto aprovado pelo Ministério da Cultura, se destinam à digitalização do arquivo do instituto, que poderá ser acessado pela internet.
“Além das atividades acima referidas [digitalização], ele [o projeto] prevê a realização de exposições, seminários e palestras dirigidos a um amplo público de estudantes e professores.”
A nota prossegue ressaltando a legalidade da doação da Sabesp. “O iFHC manteve-se no estrito cumprimento das determinações legais, seja em relação à Lei Rouanet, que permite a doação de empresas públicas, seja da Lei 4.344, que faculta a qualquer entidade ou pessoa física mantenedora de acervos documentais privados de presidentes da República “buscar apoio financeiro e técnico do poder público para projetos de fins educativos, científicos e culturais”.”
A Folha não conseguiu falar ontem com a Sabesp.
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A notinha diz que “A Folha não conseguiu falar com a Sabesp”. E, como mostram os arquivos do jornal, nunca mais tentou. Ficou por isso mesmo. Até porque, o jornal nunca tivera ímpeto de investigar. Apenas repercutira matéria do Terra.
Assim, vale repetir: no caso de FHC, não se tratou de negócios privados dele, mas de ter recebido DOAÇÃO de dinheiro público feita pelo governo de São Paulo, que à época – como continua sendo até hoje – era do seu partido.
Imagine, leitor, se a Folha ou algum outro veículo da mídia atucanada, parcial, golpista, mentirosa e chantagista tivesse descoberto que a Petrobrás – que, como a Sabesp, é uma empresa pública dirigida por grupos políticos – doou dinheiro público a Lula.
 by eduguim 
Blog da Cidadania

Coração Satânico (Angel Heart, 1987 ) - Dissecação de um filme



O texto abaixo contém spoilers pesados de Coração Satânico e não é recomendável à quem não conhece o filme e pretende assistí-lo.
Se você não viu Coração Satânico, veja antes de ler o post. Afinal, nenhum filme se resume a uma análise fria de cenas.


Com Chinatown, de Roman Polanski, criou-se uma vertente do filme policial. O neo-noir se refere aos longas com elementos dos thrillers dos anos 30 e 40, mas produzidos após os anos 70 (embora alguns críticos considerem algumas produções sessentistas como neo-noirChinatown é, sem dúvida, o maior representante). E na década de 80, houve algumas tentativas bem sucedidas de se emular as características do cinema noir, aquele clássico que você deve conhecer com Humpfrey Bogart como grande ícone. Blade Runner, O Ano do Dragão, Perigo na Noite, entre outros, foram produzidos com muita competência em mostrar o (anti)herói relutante, as femme fatales, as tramas de intriga e os personagens de caráter duvidoso.
Em 1987, o diretor Alan Parker se apossou do estilo (porque os teóricos não consideram o noir como um gênero) para contar uma história de terror e se beneficiou imensamente disso. Coração Satânico é uma adaptação do livro Falling Angel de William Hjortsberg, porém, além da trama principal, o longa compartilha pouco da narrativa literária. Isso porque Parker, como Ridley Scott em Blade Runner, preferiu por uma linguagem mais pessoal, carregada de simbolismos para ajudar no andamento da história. Por isso, Coração Satânico merece uma análise da utilização de símbolos e de sua atmosfera opressiva e decadente. O cineasta, com seu diretor de fotografia, Michael Seresin. e seu diretor de arte, Armin Ganz, conseguiu criar uma obra fortemente baseada no visual mas que não deixa de lado o roteiro, carregado de ironias e subtextos.
Coração Satânico começa mostrando um sombrio beco da Nova York dos anos 50 na escuridão da noite. A neve cobre a calçada e a silhueta de um homem caminha enquanto os créditos iniciais são revelados. Corta para um gato, em uma sacada, e logo depois para o beco novamente, quando um cachorro surge em cena e ameaça o felino lá de baixo. Uma bela caracterização sobre do que o filme trata. Uma caçada, como a trama sugere em seu início, mas também sobre um predador que mantém sua presa acuada, mesmo ela estando em terreno mais elevado, onde aparentemente a ameaça não chegaria. O cachorro desiste de sua perseguição e continua sua caminhada apenas para encontrar um corpo de um homem que teve seu pescoço cortado. Seria a misteriosa figura de minutos atrás, o assassino?
Na sequência seguinte, o filme apresenta seu protagonista, Harry Angel, interpretado por Mickey Rourke, em uma atuação memorável. Angel é um detetive decadente chamado por uma firma de advogados para atender um novo cliente. Um encontro é marcado entre eles. No caminho, uma cena interessante mostra que Harry, apesar de sua profissão, tem boa índole, como seu nome sugere. Enquanto caminha até seu destino, o vento tira o chapéu de uma senhora e Angel imediatamente o pega do chão para entregá-lo a sua dona.
Ao entrar no local do encontro, o espectador é gradualmente apresentado ao cenário, quando o som, aos poucos, revela um culto religioso acontecendo ali. É uma igreja e Harry chega justamente no momento em que o pastor diz algo como “se você acredita em Deus, abra sua carteira”. É uma das ironias do texto, que ficará bem clara quando a verdadeira identidade do empregador do detetive for revelada. Harry observa tudo do alto, como o gato da primeira cena do filme e também como o “anjo” de seu sobrenome.
Em uma sala em algum lugar do prédio, Harry se encontra, finalmente, com seu misterioso cliente, Louis Cyphre, vivido por Robert De Niro. É bom ressaltar como os nomes dos personagens revelam muito sobre suas naturezas. Infelizmente, Harry não foi tão esperto pra fazer a ligação e, de certa forma, na posição dele, ninguém faria. Cyphre revela o propósito desse encontro. Ele precisa que o detetive encontre Johnny Favourite (novamente, o nome sendo usado para dar pistas sobre um personagem). Favourite era um cantor que tinha um contrato com Cyphre e que desapareceu depois da Segunda Guerra, deixando seu acordo para trás. É bom prestar atenção à posição de De Niro em cena. Ele está sentado em uma cadeira levemente elevada, como se todos que fossem visitá-lo estivessem abaixo dele. Sua postura é de um homem que espera reverência das pessoas que o veem naquela cadeira, como um rei em seu trono.
Harry começa sua investigação por um asilo onde Favourite estaria internado com psicose pós-guerra. Essa sequência mostra o protagonista tirando uma carteira de sua mala e escolhendo, entre várias identidades, qual usaria para tentar descobrir alguma coisa sobre seu investigado. Essa cena é interessante por revelar que um dos temas do filme é justamente a busca por identidade, ainda que o protagonista não se dê conta disso até o último ato da trama.
Depois de descobrir que Favourite não se encontra naquele lugar há 12 anos, Harry decide ir atrás do médico que liberou o paciente do Asilo e segue até um bar para pesquisar na lista telefônica. Nesta cena Harry é mostrado atrás de uma janela com um vidro amarelo, na altura de sua cabeça formando uma espécie de auréola, daquelas usadas em pinturas de figuras santas.
Harry vai até a casa do médico e descobre que este é viciado em ópio. Usa isso para tirar algumas informações e como percebe que o homem está quase desmaiando por querer uma dose de sua droga, o tranca em seu quarto, revelando aí um signo que perseguirá o personagem por toda sua jornada: um ventilador. Quando Harry entra com o médico no quarto, o ventilador gira para um lado, mas conforme o protagonista coloca seu interrogado na cama, o ventilador para e começa a girar para o outro lado. Isso vai acontecer várias vezes durante o filme e sempre indicará a morte do coadjuvante em cena, como Harry descobre momentos depois, ao voltar para o quarto e encontrar o médico com um tiro no olho.
Antes, porém, o detetive sai para caminhar e escuta sussurros chamando por seu nome. O que chama atenção nesta cena é a iluminação que privilegia apenas um lado do rosto do personagem, deixando o outro completamente escurecido por uma sombra. É um recurso muito utilizado para revelar dualidades e que funciona muito bem por colocar essa dúvida na cabeça tanto do espectador quanto do próprio protagonista.
Depois do suposto suicídio do médico, Harry se encontra com Cyphre novamente, pois começa a ter dúvidas quanto ao trabalho, já que poderia ser facilmente incriminado por uma morte em circunstâncias misteriosas. Cyphre convence o detetive a continuar sua investigação enquanto descasca um ovo cozido. Como o personagem de De Niro explica, pouco antes de morder o alimento, o ovo é, em algumas culturas, uma representação da alma. Mais uma pista sobre a natureza de Cyphre que Angel deixa escapar, mais por seu ceticismo do que por distração.
Depois de investigar mais um pouco, Harry descobre que se Favourite estiver vivo, talvez se encontre em Lousiana e segue rumo ao sul dos Estados Unidos. É bom lembrar que ao seguir rumo ao sul, o detetive começa sua descida ao inferno como sugere o título do livro que o filme se baseia.
Uma das pistas sobre o paradeiro de Favourite é Margeret Krusemark, antiga namorada do cantor, que, dizem, lida com magia negra. Aqui, outro símbolo é usado como pista para que a trama seja decifrada. O colar de Margaret tem um pingente com um pentagrama invertido, ícone muito usado no Satanismo.
Angel continua seguindo pistas até encontrar a jovem Epiphany Proudfoot (Lisa Bonet). Mais uma vez o nome exerce função para a história. A garota mais tarde é revelada como sacerdotisa devoodoo e filha de Favourite. Logo depois, Epiphany e Harry protagonizam uma tórrida cena de sexo em que o ritmo é ditado por goteiras no quarto onde o detetive está hospedado. Quanto mais íntima se torna a relação, mais molhada a cena se revela. Sem precisa entrar em detalhes sobre o significado disso, este é o momento chave em que Harry Angel finalmente concretiza sua descida ao inferno. Ao ir para a cama com Epiphany, surge um comportamento selvagem que não havia ainda se manifestado. Neste momento, a água se torna sangue e Harry a ataca com uma violência assustadora.
Quando percebe que estava quase sufocando a moça, Angel se levanta e esmurra o espelho do quarto, que reflete sua imagem em pedaços, revelando como o personagem se sente, e, como é mostrado mais pra frente na trama, como é a sua personalidade.
No final, somos apresentados ao ponto de virada: Harry e Favourite são a mesma pessoa. O cantor havia feito um pacto com o demônio, Louis Cyphre (Lúcifer), vendendo sua alma. Mas, como se achava esperto demais, descobriu uma forma de enganar o “maior enganador de todos” em um ritual para devorar a alma de outra pessoa, neste caso o verdadeiro Angel. Favourite então é convocado para a guerra mas volta desfigurado e com amnésia, assumindo assim, as memórias de sua vítima acreditando realmente ser Harry. Todas as mortes que acontecem foram efetuadas pelo detetive quando a mente de Favourite despertava. Por isso os ventiladores mudavam de direção, representando a outra personalidade, controlada por Lúcifer, comentendo seus crimes. Como dito acima, o momento do sexo é a derradeira descida de Angel ao inferno, pois comete um deplorável ato de incesto, mesmo sem saber.
Há, além disso, outro elemento surpresa, cuja natureza não será revelada neste texto (quem sabe assim, mesmo depois de já conhecer toda a história, quem não tiver assistido ao filme, resolva o fazer). Os créditos finais, são intercalados com Angel/Favourite, descendo por um interminável elevador, representando sua chegada ao Reino de Lúcifer.
Coração Satânico, como já dito, é dotade de forte apelo visual. E é justamente na riqueza da utilização de símbolos e imagens emblemáticas que a película de Alan Parker encontra força para contar uma história relativamente simples (sem ser vazia). Se fosse apenas um filme de terror, sem todas as referências, não se tornaria tão memorável. Assim como se fosse simplesmente um filme visual, sem um roteiro decente, também não mereceria destaque. E a interpretação de Mickey Rourke também ajuda. É interessante reparar em como seu semblante vai mudando durante o filme. Do detetive decadente mas sempre fazendo piadas, a um homem sem identidade, e que deve encarar as consequências de atos feitos em uma “outra” vida, por assim dizer. Assim, o longa, além de ser satisfatório como exemplo do cinema neo-noir, com suas nuances duvidosas herdadas de Chinatown, também não faz feio como terror, na atmosfera pesada e na sensação de perigo iminente.
by Cine Alerta

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