Governo diz que secretário está 'aberto ao diálogo e sempre agiu em respeito à dignidade humana'. Eduardo Leite é o primeiro governador homossexual do RS e denunciou homofobia durante a disputa eleitoral. Wesp diz que tratará 'diversidade e inclusão como prioridade'.
Por Gustavo Foster, g1 RS
Mateus Wesp (PSDB) durante a posse como secretário de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do RS, ao lado do governador Eduardo Leite (PSDB) e do vice Gabriel Souza (MDB) — Foto: Rodrigo Ziebell/Palácio Piratini
Mateus Wesp (PSDB), nomeado secretário de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do Rio Grande do Sul pelo governador Eduardo Leite (PSDB), teve sua indicação criticada por opositores após voltarem à tona projetos e declarações consideradas LGBTQIA+fóbicas do secretário. Leite é o primeiro governador homossexual da história do RS.
Wesp apresentou projetos que banem o uso da palavra "gênero" em escolas, quando era vereador de Passo Fundo em 2017 e deputado estadual em 2020. Em 2019, fez publicações nas redes sociais em que critica a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que criminalizou a homofobia. Saiba mais abaixo.
Questionado pelo g1 sobre como seu posicionamento a respeito do tema iria interferir no trabalho à frente da pasta, Wesp diz que está "tratando o tema da diversidade e inclusão como prioridade" e que a Secretaria terá um departamento exclusivo para tratar do combate à intolerância, formado por "pessoas qualificadas tecnicamente, com capacidade de elaboração de políticas públicas sólidas, além, claro, de serem representativas".
O governo do RS manifestou-se por meio de nota, afirmando que "Mateus Wesp é um democrata, com sólida formação jurídica e domínio dos compromissos institucionais dos cargos que ocupa". O texto diz ainda que o secretário, "embora possa ter divergências em temas específicos, se mostra aberto ao diálogo e sempre agiu em respeito à dignidade humana". Leia a nota completa abaixo.
A homofobia foi tema da disputa eleitoral no RS, que terminou com a reeleição de Leite. Na campanha, o governador denunciou ter sido vítima de preconceito durante a propaganda do adversário, Onyx Lorenzoni (PL), que destacou que o estado teria uma "primeira-dama de verdade" caso fosse eleito.
Em 2021, o governador do RS assumiu sua homossexualidade durante entrevista ao programa Conversa com Bial, da TV Globo.
A deputada estadual Luciana Genro (PSOL), que foi presidente da Comissão Especial para Análise da Violência Contra a População LGBT da Assembleia Legislativa do RS durante o ano de 2019, criticou a indicação de Wesp em suas redes sociais. "É muito grave que a Secretaria de Direitos Humanos seja comandada por alguém com este perfil e sem afinidade nenhuma com a pauta", escreveu.
A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) também criticou a nomeação. "Não bastam atos simbólicos como apresentar namorado na posse, enquanto na prática abre caminho contra os direitos e as existências de pessoas trans. Eduardo Leite com essa nomeação acena para a cartilha antitrans que conta com pessoas LGB cis", escreveu a organização em suas redes sociais.
'Gêneros inventados' e 'ativismo LGBT'
Em 2017, quando era vereador de Passo Fundo, Mateus Wesp apresentou um projeto de lei para excluir a palavra "gênero" do Plano Municipal de Educação (PME), substituindo o termo pela expressão "gênero masculino e gênero feminino". O projeto acabou arquivado, mas voltou à pauta após apresentação de um substitutivo. A proposta foi aprovada por 12 votos a dois, e as mudanças passaram a constar no PME.
Em seu site pessoal, na época, Wesp justificou a proposição argumentando que o uso da palavra "gênero" no documento não deixava claro se o termo "se refere aos tradicionais gêneros masculino e feminino ou, a dezenas de outras identidades inventadas socialmente (cisgênero, pângenero, etc) - que cria a possibilidade do uso ideológico do termo 'gênero' gerando, assim, aquilo que chamamos de 'ideologia de gênero'".
Em 2020, já como deputado estadual, Wesp apresentou um projeto de lei que determinava a "obrigatoriedade do ensino da norma culta" nas escolas estaduais. O parlamentar justificou que o uso da linguagem neutra "pretende apagar a distinção entre homem e mulher, que está na essência da constituição biológica e psíquica da pessoa". Já em 2021, apresentou um projeto semelhante ao que apresentara em Passo Fundo, banindo o uso da palavra "gênero", desta vez no Plano Estadual de Educação. Ambas não foram aprovadas.
A expressão "ideologia de gênero" não é reconhecida no mundo acadêmico e é usada por grupos conservadores, como as igrejas evangélicas, contrários aos estudos de gênero.
Antes, em 2019, durante a votação no Supremo Tribunal Federal que determinou a criminalização da homofobia e da transfobia, Wesp descreveu como "tirania pura" a decisão da corte. "Se o STF criminalizar opiniões contrárias ao ativismo LGBT (...), poderá fazer o mesmo com qualquer outra opinião", escreveu o então deputado estadual.
Publicação de Mateus Wesp durante o julgamento sobre criminalização da homofobia no STF — Foto: Reprodução/Redes sociais
Ao g1, o secretário diz que respeita a decisão do Supremo. "Como secretário, irei trabalhar por todos. E sempre pautado pela lei. Acompanho todas as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), inclusive a que decidiu que as práticas de homofobia e transfobia são enquadradas nas hipóteses de crime de preconceito. Tendo o entendimento do STF como norte, e pautados pela lei, vamos trabalhar políticas para todos os aspectos dos direitos humanos", respondeu.
Wesp diz também que pretende promover políticas públicas que combatam a LGBTQIA+fobia, em consonância com o que pensa o governador Eduardo Leite.
"Conheço a trajetória e o pensamento do governador sobre a temática e meu papel como secretário é ampliar as políticas públicas de apoio à diversidade e combate à intolerância, reforçando os nossos compromissos com a dignidade humana", diz Wesp.
Nota do Governo do RS
"O secretário Mateus Wesp é um democrata, com sólida formação jurídica e domínio dos compromissos institucionais dos cargos que ocupa. Agiu assim como parlamentar. Embora possa ter divergências em temas específicos, se mostra aberto ao diálogo e sempre agiu em respeito à dignidade humana. Estamos montando uma equipe diversa e plural na secretaria, garantindo a representatividade exigida pelas funções da pasta, preparando-a para implementar as nossas políticas para o setor."