by Cristiana Lôbo
20/04/12
“João amava Teresa que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili que não amava ninguém.”
Este é um conhecido trecho de “Quadrilha”, de Carlos Drummond de Andrade, que continua:
“João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento, Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia, Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes que não tinha entrado na história…”
O poeta mineiro não tem nada a ver com a história, mas o ambiente no Supremo Tribunal Federal é o de “Quadrilha” às avessas:
Peluso, que criticou Gilmar, que quase se atracou com Lewandowski, que separou uma briga entre Eros e Joaquim, que chamou Peluso de tirânico…
Este é o ambiente do Supremo Tribunal Federal neste momento em que a opinião pública cobra o julgamento do mensalão. Na Corte, há uma divisão clara sobre o momento ideal para este esperado julgamento. Para um grupo de ministros, o ideal seria deixar para o ano que vem, mas a pressão da opinião pública já contagiou alguns dos ministros que não querem deixar passar.
O presidente do STF, Carlos Ayres Brito, pretende colocar em julgamento no mês de junho. Mas o ministro revisor Ricardo Lewandowski confidenciou que apresentará seu voto em julho para ser submetido aos pares em agosto – depois, portanto, do calendário de Ayres Brito que quer tratar do mais longo processo na Corte antes do mês de setembro, que é quando Cezar Peluso vai cair na aposentadoria compulsória porque completará 70 anos.
A briga de hoje é entre Cezar Peluso e Joaquim Barbosa. Começou com Peluso, numa entrevista coletiva, disparando críticas para todos os lados, inclusive para Barbosa, sobre quem disse ter um “temperamento difícil”. Joaquim respondeu que ”Peluso se acha” e, depois, numa entrevista publicada por “O Globo” nesta sexta-feira, diz que Peluso é “ridículo”, “brega”, “caipira”, “corporativo”, desleal”, “tirano”e “pequeno”.
Ontem pela manhã, estimulados pelo novo presidente do STF, Peluso e Joaquim Barbosa trocaram um frio aperto de mão, mas que serviu de “bandeira branca” entre eles. Assim, todos supunham que a briga estava superada. Só que a entrevista a “O Globo” já estava concedida e só foi publicada nesta sexta-feira, realimentando o embate.
O ponto mais grave da entrevista de Joaquim, no entanto, é quando ele diz que Peluso “não hesitava em violar as normas para impor à força sua vontade”. Segundo frequentadores do STF, esse descontentamento aconteceu depois que Gilmar Mendes fez um “mutirão carcerário”, determinando que juízes decidissem causas pequenas em três dias. Peluso acabou concedendo uma liminar à Associação dos Magistrados suspendendo a determinação e não colocou o assunto em votação – fazendo prevalecer sua decisão.
Reconhecido pelos colegas como um juiz preparado, de raciocínio lógico, Peluso não agradou aos colegas como administrador. Um caso lembrado é exatamente este da liminar concedida à Associação dos Magistrados, em que, para alguns, prevaleceu o corporativismo.
Outra decisão de Peluso questionada pelos colegas foi o fato de não ter colocado em votação matérias importantes nos momentos em que o STF esteve desfalcado de um de seus integrantes. E isso aconteceu praticamente em todo o mandato dele à frente da Corte: de agosto do ano passado até fevereiro, a vaga de Eros Grau ficou aberta; e depois, por mais quatro meses, depois da aposentadoria de Ellen Gracie até a nomeação de Rosa Weber. Só neste primeiro semestre é que assuntos importantes entraram na pauta, como o caso do aborto de anencéfalos.
O caso do mensalão é o que provoca mais conflito no Supremo. Não há consenso sobre o melhor momento para a votação e tampouco possibilidade de avaliação. Nenhum ministro preparou seu voto – nem Joaquim Barbosa, que concluiu seu relatório, não o voto.
Aos poucos, vão surgindo interpretações de que, se o processo ficar para o ano que vem, não haveria grandes perdas – mas forte perda de imagem, diante da pressão da opinião pública para que o caso seja decidido logo. Do ponto de vista jurídico, pois, segundo especialistas, as penas pricipais não iriam prescrever até 2013.
O caso do mensalão chegou ao STF em abril de 2006, e o inquérito foi transformado em ação penal em agosto de 2007. Nesse período, o Supremo decidiu que iria votar o caso, mesmo sendo um processo considerado gigantesco em número de páginas, testemunhas e réus; e decidiu também que ele não seria desmembrado, o que está sendo pedido agora pelo advogado Márcio Thomaz Bastos ex-ministro da Justiça no governo Lula, defensor de diretores do Banco Rural que estão entre os réus.