Políticos do PTB foram julgados por abuso de poder nas eleições de 2018. MPE sustenta que servidores foram coagidos a fazer campanha para irmão do prefeito. Ministros ainda anularam votos de deputado, alterando formação da Assembleia Legislativa.
Por g1 RS
03/03/2022
Prefeito de Bagé, Divaldo Lara, e deputado Luís Augusto Lara, ambos do PTB — Foto: Rogério Ferrari/Agência ALRS
O pleno do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) negou, nesta quinta-feira (3), recurso do deputado estadual do Rio Grande do Sul Luís Augusto Lara (PTB) e de seu irmão, o prefeito de Bagé, Divaldo Lara (PTB). Com a decisão da corte, ficam mantidas a cassação do deputado e a inelegibilidade do prefeito julgadas pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE), em 2019, por abuso de poder político, econômico e de autoridade nas eleições de 2018. O presidente do TSE, ministro Edson Fachin, determinou a execução imediata da decisão.
(CORREÇÃO: o g1 errou ao informar que o prefeito Divaldo Lara teve o mandato cassado. A informação foi corrigida às 12h05.)
O advogado Eduardo Alckmin, que representa os políticos, afirmou na sessão que, durante o período em que os atos teriam sido praticados, quem se encontrava no exercício da prefeitura de Bagé era o vice e não Divaldo Lara, afastando, então, o abuso de poder em benefício do irmão. "O prefeito havia se afastado e nenhum desses foi praticado pelo prefeito irmão", disse.
Em nota, Divaldo Lara disse discordar da decisão e que irá recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF). "A decisão ignorou uma gama de nulidades existentes no curso do processo", afirmou. Leia a íntegra abaixo.
O ministro Alexandre de Moraes, relator do processo, já havia negado recurso dos políticos em abril de 2021. O voto de Moraes na sessão desta quinta foi seguido pelos ministros Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves, Paulo de Tarso Sanseverino, Sérgio Banhos, Carlos Mario Velloso Filho e Edson Fachin.
"O irmão utilizou o cargo de prefeito para auxiliar o seu irmão candidato à reeleição à deputado", afirmou.
Além disso, Alexandre de Moraes alterou seu entendimento sobre o pedido da coligação PSOL/PCB, que solicitava a anulação dos votos de Luís Augusto Lara. Com isso, os votos destinados ao deputado deixam de contabilizar no quociente eleitoral da coligação do PTB. Assim, o novo cálculo deve abrir vaga para a outra coligação, com a eleição do vereador de Porto Alegre Pedro Ruas (PSOL), até então suplente.
Sessão do TSE que julgou deputado Luís Augusto Lara e prefeito Divaldo Lara — Foto: Reprodução/TSE
Entenda o caso
Na denúncia, o Ministério Público Eleitoral (MPE) apontou que houve uso indevido da máquina pública durante as eleições de 2018. Servidores municipais de Bagé, cuja administração é comandada por Divaldo Lara, teriam sido coagidos a fazer campanha ao irmão do prefeito, Luis Augusto Lara, em horário de expediente.
"O conteúdo probatório evidencia de forma muito robusta, sem qualquer dúvida – nem razoável, nem irrazoável, diga-se, qualquer dúvida – que Divaldo Lara, prefeito de Bagé, propiciou ao seu irmão, então candidato à reeleição ao cargo de deputado estadual, a amplificação de canais de divulgação da campanha e recursos utilizando-se indevidamente da máquina pública municipal", sustentou Alexandre de Moraes.
O processo apontou que agentes públicos foram coagidos a comprar ingressos para um evento de campanha de Luís Augusto Lara, com a antecipação do 13º salário dos servidores de Bagé.
"Mais manipulação do que isso, só se o prefeito tivesse colocado na lei ordinária a obrigatoriedade de comprar ingressos para o jantar da vitória", apontou o ministro.
Luis Augusto e Divaldo Lara recorrerão nos cargos — Foto: Reprodução/RBS TV
Perfis
Luís Augusto Lara foi eleito deputado estadual em 1998, sendo reeleito sempre desde então. Em 2019, o político ocupou a presidência da Assembleia Legislativa. O deputado ainda foi secretários dos governos de Germando Rigotto (MDB), Yeda Crusius (PSDB) e Tarso Genro (PT).
Divaldo Lara foi eleito prefeito de Bagé em 2016 e reeleito em 2020. Uma de suas bandeiras na campanha foi o combate à corrupção, simbolizado por um relho.
Reportagem da RBS TV exibida em janeiro de 2022 revelou a existência de uma delação premiada sobre um suposto caso de pagamento de propina ao político. Seriam pagos até R$ 40 mil por mês para manter contratos de cerca de R$ 27 milhões com uma empresa que administrou as áreas da saúde e da educação no município. Lara afirma que as denúncias não são verdadeiras e que os contratos, que são de 2018, foram extintos e passaram por aprovação do Tribunal de Contas.
Prefeito Divaldo Lara durante campanha, usando relho como símbolo de combate à corrupção — Foto: Reprodução
Nota de Divaldo Lara:
"Em razão do julgamento realizado na data de hoje perante o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), venho a público esclarecer que recebo a decisão da Corte Superior com o devido e merecido respeito. Dela discordo, todavia. A decisão ignorou uma gama de nulidades existentes no curso do processo, as quais serão levadas agora ao Supremo Tribunal Federal (STF), no sentido de fazer valer as garantias processuais, que é do direito de todo e qualquer cidadão, e que vêm sendo reiteradamente asseguradas pelo próprio STF.
A decisão não interfere no mandato eletivo que exerço como prefeito. Ou seja, não houve cassação do mandato, obtido, em reeleição, no ano de 2020. Sigo, portanto, como prefeito de Bagé até o final da legislatura (2021-2024) no pleno gozo das prerrogativas e em respeito à soberania popular.
A decisão do TSE não cassou os meus direitos políticos, o que é vedado pela Constituição Federal. Portanto, se assim desejar e for da vontade do partido e do eleitorado, observados os calendários eleitorais futuros, posso concorrer nas eleições de 2026 e 2028.
No entanto, a decisão monocrática do Ministro Alexandre de Moraes nos tirou o direito de defesa no plenário da corte; e o direito amplo é garantido pela Constituição Federal do Brasil. É uma injustiça que a cadeira do Parlamento Gaúcho, mantida durante seis mandatos consecutivos pelo bageense deputado Lara, seja entregue aos radicais do PSOL."