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"O senhor representa a ala militar da revolução bolivariana", lançou Patricia Villegas, da emissora estatal Telesur, ao militar reformado Diosdado Cabello, presidente da Assembleia Nacional da Venezuela.
"O presidente também. Ele veio de um quartel", devolveu Cabello, reivindicando o lugar dos militares no movimento criado pelo tenente-coronel Hugo Chávez no momento em que o esquerdista escolheu um civil, o vice-presidente Nicolás Maduro, como seu herdeiro político.
A cena é representativa de uma discussão de que nem o canal estatal se desvia completamente: como se comportam as alas chavistas ante a escolha de Maduro?
Chávez misturou ideias sobre união cívico-militar, identidade popular, retórica socialista, ode aos cubanos e até "cristianismo revolucionário", embalado numa gestão com ênfase na redistribuição de renda que lhe fez herói dos pobres. Num mundo sem ele, qual será a cara predominante do pós-chavismo?
Editoria de Arte/Folhapress | ||
Chavistas, ex-chavistas e analistas descrevem discrepâncias entre uma ala nacional-militarista desenvolvimentista e uma esquerda de retórica socialista e vínculos com Cuba --sem falar nos chavistas acidentais, oportunistas e empresários com negócios com o governo.
Mas todas essas facções entenderam que não sobrevivem sozinhas no curto nem no médio prazo. Por isso, chegaram a um "pacto de coesão" para estrear uma espécie de liderança colegiada na ausência de Chávez, nas palavras de Vladimir Villegas, ex-vice chanceler de Chávez que rompeu com ele em 2007.
"Chávez não pode ser substituído por uma liderança individual", disse à Folha. "Os grupos vão conviver. Se Chávez morre, vão passar por uma prova de fogo para sua unidade, mas nunca antes do novo processo eleitoral."
Ex-ministro do Interior e das Comunicações de Chávez, Jesse Chacón, da turma 1987 da academia militar --a mesma de Cabello--, diz que o chavismo errou ao "pensar que haveria mais tempo para fazer a engenharia institucional" da sucessão.
Afirma que Maduro "terá de ampliar o aspecto da liderança com a ajuda de todos os outros". "Não creio que surjam tensões agora. Por duas razões: pela maturidade política e por necessidade."
"Estive em algumas reuniões e há essa fluidez para entender que têm de repartir as responsabilidades", diz Chacón. E repartir o poder? "Em determinado momento terão de fazê-lo, porque ou exerces o poder ou não é poder."
PACTO DE HAVANA
Maduro e Cabello têm se referido ao pacto de unidade, que inclui altos nomes do chavismo e foi afinado nos primeiros dias do ano em Cuba, onde Chávez segue internado. À Telesur, o presidente da Assembleia descreveu o encontro citando Rafael Ramirez, presidente da estatal PDVSA, Cília Flores, procuradora-geral e mulher de Maduro, e Jorge Arreaza, genro de Chávez com acesso estratégico ao presidente ao acompanhá-lo em Havana.
"Eu, Nicolás [Maduro], Rafael, Cília Flores, Jorge Arreaza conversamos muito nesses dias. Os compromissos que assumimos neste momento são os mesmo que assumimos quando era uma criança e jurei no quartel entrar para o movimento revolucionário", disse.
Parte da imprensa da Venezuela e de Miami batizou a reunião de "Pacto de Havana". Segundo o "El Nuevo Herald", o acordo foi costurado pelo ditador Raúl Castro, um interessado direto na sobrevivência do chavismo dada a ajuda da Venezuela à ilha.
Em comunicado oficial divulgado ontem, Castro manifestou "confiança na capacidade do povo venezuelano e em suas instituições para vencer qualquer desafio".
Para Vladimir Villegas, que é irmão do ministro das Comunicações, Ernesto Villegas, seja qual for o arranjo, o futuro chavista depende de pragmatismo e moderação.
A nova geração não poderá contar com um trunfo de Chávez: sua conexão emocional com a população que lhe percebe como homem de boa fé sem responsabilidade direta pelos "erros" de seus auxiliares.
"Vão precisar ser um pouco mais pragmáticos a médio prazo. Esse discurso radical só Chávez pode sustentar", afirma Vladimir.
by folha de São paulo