quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Lava Jato denuncia Lula por corrupção e lavagem de dinheiro

É a primeira acusação feita pela força-tarefa contra o petista. Além dele, foram denunciados Marisa Letícia, Léo Pinheiro, Paulo Okamotto e outros quatro


Por Da redação



O ex-presidente Lula durante posse como ministro-chefe da Casa Civil - 17/03/2016 (Igo Estrela/Getty Images)
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi denunciado nesta quarta-feira pela primeira vez no âmbito da Operação Lava Jato. O Ministério Público Federal no Paraná acusa o petista dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, relativos à reforma e propriedade do tríplex no Condomínio Solaris, no Guarujá, litoral paulista. Se o juiz federal Sergio Moro aceitar a denúncia, Lula se tornará réu na Lava Jato. O petista já responde na Justiça pela acusação de tentar obstruir as investigações da operação, mas em uma ação que corre no Distrito Federal. Além do inquérito sobre o tríplex, a força-tarefa investiga a compra do sítio Santa Bárbara, em Atibaia (SP), e as razões pelas quais as empreiteiras Odebrecht e OAS executaram obras milionárias nas propriedades. Também são investigadas as palestras do ex-presidente, contratadas a peso de ouro por empreiteiras envolvidas no petrolão por meio da LILS Palestras.
Além de Lula, foram denunciados pela força-tarefa da Lava Jato a ex-primeira-dama Marisa Letícia, o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, o empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, o ex-executivo da empreiteira Agenor Franklin Martins, o engenheiro Paulo Gordilho, Fábio Fori Yonamine e Roberto Moreira Ferreira.
A história do tríplex enreda Lula nas tramoias das empreiteiras do petrolão. Como VEJA revelou, foi o ex-presidente quem convenceu a OAS a assumir as obras deixadas para trás pela Bancoop, cooperativa que foi à bancarrota após desviar o dinheiro de milhares de associados para os cofres do PT. Pedido de Lula, sabe-se agora, era ordem, e a OAS topou. Um dos projetos assumidos pela empreiteira foi justamente o do Edifício Solaris, no Guarujá, onde o ex-presidente teria uma unidade. A OAS não só evitou o prejuízo a Lula, tirando o projeto do prédio do papel, como aproveitou a oportunidade para afagar o petista. Reservou para ele um tríplex, na cobertura do edifício – e cuidou para que, a exemplo do sítio, o apartamento ficasse ao gosto da família. A empreiteira investiu quase 800.000 reais apenas numa reforma, que deixou o imóvel com um elevador privativo e equipamentos de lazer de primeiríssima qualidade. Sem constrangimento, Lula e a ex-primeira-dama Marisa visitaram as obras na companhia de Léo Pinheiro, o ex-­presidente da OAS. Tudo estava ajustado para que a família logo começasse a desfrutar o apartamento. Mas veio a Lava Jato e os planos mudaram. Lula, então, passou a dizer que tinha apenas uma opção de compra do apartamento – e que desistira do negócio. O argumento não convenceu a polícia.
Já o sítio, para o qual Lula enviou parte de sua mudança logo após deixar o Planalto, está até hoje em nome de dois sócios de Fábio Luís da Silva, o Lulinha, o filho mais velho do ex-presidente. Os policiais e procuradores, porém, não têm dúvidas de que saiu dos cofres das empreiteiras do petrolão o dinheiro usado para comprar a propriedade em 2010, meses antes de Lula deixar o Planalto. Um presente que, suspeitam os investigadores, Lula teria recebido quando ainda era presidente. As empreiteiras também cuidaram dos detalhes para que a propriedade ficasse ao gosto de Lula e de sua família. Bancaram as obras no sítio, como a construção de uma nova sede com quatro confortáveis suítes e de um tanque para pescaria. Pagaram até a mobília. Os móveis da cozinha foram encomendados pela OAS em uma loja de luxo.
Paralelamente, a Lava Jato também mapeou as transações financeiras do ex-presidente. No ano passado, VEJA revelou que a LILS, empresa de palestras aberta por Lula logo após deixar o Planalto, recebera 10 milhões de reais só das empreiteiras do petrolão. Agora, as transações foram anexadas à investigação como indício de que os pagamentos, na verdade, serviram para maquiar vantagens indevidas que o presidente recebeu por “serviços” prestados às empreiteiras.
Executivos da OAS ouvidos pela Lava Jato, por exemplo, disseram à polícia que não se recordavam de palestras do ex-presidente na empreiteira – no papel, a OAS pagou 1,2 milhão de reais à LILS. A empresa de palestras não era a única fonte dos repasses milionários a Lula, que teve seus sigilos fiscal e bancário quebrados pelo juiz Sergio Moro. O Instituto Lula, entidade sem fins lucrativos criada pelo petista com o propósito altruísta de acabar com a fome na África e desenvolver a América Latina, também era destinatário de repasses milionários das companhias que fraudaram a Petrobras. Dos 34,9 milhões de reais recebidos pelo instituto entre 2011 e 2014 a título de doações, 20,7 milhões foram repassados pela Camargo Corrêa, Odebrecht, Queiroz Galvão, OAS e Andrade Gutierrez, todas investigadas.
triplex-lula

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Teses conspiratórias ainda rondam atentados às Torres Gêmeas em NY

CAROLINA FREDERICO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM NOVA YORK 


Na manhã de 11 de Setembro de 2001, Nona Ellis, vice-presidente na Lehman Brothers, estava sentada em sua mesa no edifício Three World Financial Center, quando foi informada de que uma explosão havia ocorrido na Torre Norte do Word Trade Center, praticamente do outro lado da rua, e que era preciso deixar o prédio.

"O nosso edifício não foi atingido, mas aquela foi a última vez que eu estive naquele escritório no 12º andar", relembrou Nona Ellis em conversa com a Folha em Nova York, cidade em que vive desde agosto de 1980.

Os acontecimentos daquele dia podem ser considerados tão bizarros e sem precedentes que apenas os formuladores das chamadas teorias conspiratórias se atrevem a perguntar abertamente: "Será que tudo aquilo é possível?".

Richard Drew - 11.set.2001/Associated Press
Homem se joga em meio ao incêndio provocado pela colisão dos aviões no World Trade Center, em NY
Homem se joga em meio ao incêndio provocado pela colisão dos aviões no World Trade Center, em NY

Em vídeos caseiros postados no YouTube, em sites com apresentação tosca e argumentos pouco fundamentados ou em documentários respeitados como "Loose Change", de Dylan Avery, há dezenas de perguntas que, de tão pertinentes, simplesmente não querem calar.

Há dúvidas sobre a veracidade das ligações telefônicas reveladas pelas investigações do governo, que teriam sido gravadas durante os voos, em pleno ar —acontece que, em 2001, a tecnologia disponível permitia que as tais ligações de celulares fossem feitas em terra, apenas, não da altitude em que os aviões estavam voando. Da mesma forma, ligações de 27 minutos como a da aeromoça Betty Ong seriam improváveis.

As teorias e conspirações são muitas. No entanto, se pelo menos uma delas é possível ou plausível, por que toda a trama ainda não foi revelada após 15 anos?

De acordo com uma pesquisa realizada pelo New York Times e pela CBS News em outubro de 2006, apenas 16% dos americanos achavam que o governo estivesse falando a verdade sobre os ataques de 11 de Setembro.

"Uma significativa parte da população americana e de outros países rejeita a explicação oficial sobre o 11 de Setembro. O que falta é o reconhecimento público nos principais jornais e redes de TV", diz à Folha, por e-mail, David Ray Griffin.

Griffin escreveu mais de dez livros sobre o tema 11 de Setembro, incluindo "The New Pearl Harbor", em que afirma ter encontrado evidências de que os ataques de 11 de Setembro foram orquestrados pleo governo de George W. Bush como um pretexto para levar adiante seus objetivos imperialistas.

"A maior parte dos americanos está no estado de ignorância em que eu estive nos primeiros dois anos. Eles não entendem, por exemplo, por que as Torres Gêmeas e o WTC 7 não poderiam colapsar por causa do fogo, mesmo que estes prédios fossem atingidos por aviões", afirma Griffin.

INVESTIGAÇÃO


Perguntas tais quais "como dois aviões podem derrubar três prédios?" —contando o vizinho WTC 7, onde ficavam escritórios do Pentágono e da CIA, e que não foi diretamente atingido pelas aeronaves— e "onde foram parar os demais quatro prédios que formavam o complexo?" tornaram-se foco de investigação científica para a cientista Judy Wood desde 11 de setembro de 2001.

Com graduações em engenharia civil, de mecânica e ciência de engenharia de materiais, Wood responde a essas e outras perguntas em seu livro "Where Did The Towers Go" (Para onde foram as torres), de 2010.

Conclusões chocantes, mas supostamente baseadas em evidências, estão presentes no livro em afirmações como "as Torres Gêmeas não queimaram"; "os detritos das torres não se chocaram contra o chão"; "as Torres Gêmeas se transformaram em pó, no meio do ar, enquanto caíam" —algo muito semelhante ao relatado por Nona Ellis ao descrever os "pequenos pedacinhos de prédio que choviam sobre Manhattan".

Steh McAllister -11.set.2001/AFP


Momento em que o segundo avião atirado contra o WTC atinge a torre sul durante o 11 de Setembro

De acordo com organização Architects and Engineers for 9/11 Truth (Arquitetos e Engenheiros pela Verdade do 11 de Setembro), todas as evidências mostram que a queda do WTC 7 foi uma demolição controlada clássica, quase tão metódica quanto as quedas livres e simétricas das Torres Gêmeas.

O livro Beyond Misinformation, (Além da Desinformação), lançado há um ano para marcar o 14º aniversário dos atentados, faz uma análise de todos os edifícios que sofreram colapsos causado por fogo (incluindo o edifício Joelma, em São Paulo, em 1974), e nenhum deles sofreu colapso total, apenas parcial.

Em 2005, o edifício de 29 andares Windsor Tower, em Madri, queimou por quase 24 horas antes de sofrer um colapso parcial —as Torres Gêmeas, em contrapartida, queimaram por apenas pouco mais de uma hora antes de colapsarem (ou serem destruídas, como afirma o livro).

"Além disso, se o motivo foi o fogo, "como a torre que foi atingida por último foi a primeira a cair?", questiona Ted Walter, membro da AE911Truth e autor principal do livro.

'FICÇÃO'

Morgan Reynolds, professor emérito de economia na Texas A&M University, não teve receio de afirmar abertamente à Folha que o 11 de Setembro foi "um evento encenado para a TV, feito para as duas horas de limiar de atenção do americano".

Em setembro de 2006, Reynolds, que foi economista-chefe do Departamento de Trabalho americano em 2001 e 2002, chamou a atenção do país em entrevista na Fox News, por ser o primeiro proeminente funcionário do governo Bush a declarar publicamente que os ataques de 11 de Setembro foram uma operação interna.

"É ficção. A comissão do 11 de setembro nunca tentou provar nada, porque é impossível provar uma mentira, este é o problema. Aconselho a todos que assistam ao vídeo com a penetração da Torre Sul, quadro por quadro, e o que você vai ver é uma apresentação de desenho animado, falso, porque um avião não pode atravessar direto um prédio como de aço e concreto como a Torre Sul como se ela fosse ar fino. Como um avião, feito em sua maior parte de alumínio, pode ser completamente absorvido por um prédio de concreto e aço? Onde está o impacto? Para onde foram os detritos?", questionou.



Steh McAllister -11.set.2001/AFP

Avião da United Airlines é atirado contra segunda torre do WTC, enquanto a primeira já se incendiava


Ex-capitão de diferentes companhias aéreas que pilotou mais de 160 tipos de avião em mais de 50 países, John Lear, filho do desenvolvedor do jato LearJet e retém diversos recordes mundiais de velocidade.

Assim como Morgan Reynolds, ele é um dos defensores da "No Planes Theory", hipótese segundo a qual nenhum avião Boeing-767 atingiu as torres. Lear trata das supostas velocidades dos aviões ao atingirem as torres —aproximadamente 795 km/h e 943km/h—, algo que seria impossível para tais aeronaves.

"E, mesmo que tal velocidade fosse possível, o piloto perderia o controle da aeronave, que provavelmente rodaria em círculos."

Nona Ellis relata que viu o contorno do avião na fachada da Torre Norte. "Você olha para a imagem como se fosse uma daquelas coisas hipnotizantes, porque você nunca viu algo assim antes", descreve.

No entanto, de acordo com a explicação de Lear, quando o nariz de um avião entra em contato com um prédio com colunas de aço, é impossível que os mastros das asas cortem as colunas do prédio. "Elas se espatifariam no chão, por causa da colisão", afirma.

Já o formato de avião impresso nas fachadas das torres chocou o mundo, mas é chamado por esses especialistas de "Efeito Papaléguas" (ou Roadrunner Effect), novamente numa referência ao personagem dos desenhos que atravessa portas ou paredes deixando a exata marca de sua silhueta. "Isso simplesmente não acontece" diz Reynolds.

RELATÓRIO

O relatório oficial do governo, "The 9/11 Commission Report", formalmente chamado de "Relatório Final da Comissão Nacional sobre os Ataques Terroristas contra os Estados Unidos", que teve as investigações conduzidas pelo NIST (National Institute of Standards and Technology), foi publicado em julho de 2004, a partir de um pedido de Bush e do Congresso americano para que os ataques fossem investigados.

Em março de 2007, Judy Wood, Morgan Reynolds e John Lear, representados pelo advogado Jerry Leaphart, entraram na Justiça com um Pedido de Correção (Request for Correction) do documento. Mesmo com a admissão do NIST no relatório de que não foram feitas buscas por explosivos, as alegações do trio foram rejeitadas.

Em 2010, o apelo feito por Leaphart à Suprema Corte também foi rejeitado, e o caso, encerrado. "Nós sabíamos que a possibilidade de perder o caso existia, o que também aconteceu com todos os demais processos, mas o que nós queríamos mesmo era fazer com que essas informações passassem a ser parte de arquivos públicos", afirma Leaphart.

Para o advogado, quando se é associado a teorias conspiratórias, a tendência é que não se seja levado a sério. "Por isso decidimos focar nas evidências que demonstram o aconteceu, em vez de tentar provar o porquê e como."

Apesar de todos os esforços legais já tomados, não há ainda uma explicação científica publicamente aceita que desvende o mistério dos dois aviões que "desaparecerem" dentro das Torres Gêmeas, além de tantos outros acontecimentos ocorridos há 15 anos. Em caso de dúvidas, que são muitas, os especialistas, não os conspiradores, advertem: "É só olhar as evidências".

terça-feira, 6 de setembro de 2016

Justiça apreende passaporte e CNH de devedor

Para a tomada dos documentos, a juíza Andrea Ferraz Musa se baseou no inciso 4º do artigo 139 do novo Código de Processo Civil.




Afonso Maia

Um devedor paulistano teve passaporte e Carteira Nacional de Habilitação apreendidos por decisão da 2ª Vara Cível de São Paulo, uma decisão inédita até então. A decisão, relaciona-se a uma ação no valor de R$ 253.299,42 devidos a uma concessionária de automóveis. A ação tramita desde 2013. Para a tomada dos documentos, a Juíza Andrea Ferraz Musa se baseou no inciso 4º do artigo 139 do novo Código de Processo Civil(CPC), que não valia para casos envolvendo dívidas até março deste ano e que permite medidas coercitivas pelo cumprimento de determinações.

Até então, só era permitido ao juiz usar da penhora ou expropriação de bens. O artigo trata dos poderes, deveres e responsabilidades do juiz e confere a ele a possibilidade de “determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”.

A lógica usada pela decisão foi de que a pessoa que não tem dinheiro para pagar o que deve, também não o teria para manter um veículo ou fazer uso do passaporte em viagens. Os dois documentos, portanto, podem ser apreendidos até a quitação.

A advogada e professora da Fundação Getúlio Vargas Daniela Gabbay explica:

"Essa possibilidade existe porque agora o código está mais amplo e o juiz pode determinar algumas medidas coercitivas para o cumprimento a decisão judicial a partir de sua interpretação da situação".

Segundo ela, essas medidas já estavam no código anterior, só que agora o texto está mais amplo autorizando uma interpretação mais aberta.

Medidas do gênero deverão ser tomadas principalmente quando houver indícios de que o devedor esteja maquiando seu patrimônio - pessoas que realmente não têm o dinheiro para quitar a dívida provavelmente não serão atingidas.

Fonte: Infomoney


O deslumbramento e a loucura das mudanças no cenário político brasileiro



Fernando Gabeira
O GLOBO
04/09/2016 

Cheguei a Brasília no seu típico calor seco, sabendo que não haveria surpresas no resultado final. Dilma seria cassada. Restavam-me apenas as peripécias, essas sim imprevisíveis. Pela primeira vez, vi Renan Calheiros perder a calma no plenário. E olha que, ao microfone, já disse coisas bem pesadas para ele, e sua máxima reação foi suspender os trabalhos por algum tempo. Renan disse que o Senado parecia um hospício. Lembrou-me de Maura Lopes Cançado que escreveu o livro “Hospício é Deus”.
Ela colaborava com o suplemento literário do “JB”. Ficou internada por muito tempo. O livro mostra que o hospício, além de todos os seus horrores, era também um espaço de negociação. Renan ficou próximo da realidade ao reconhecer o lado maluco do plenário do Senado, assim como Maura contribuiu ao sugerir o lado parlamentar do hospício. O problema é o equilíbrio entre os dois. Há visões mais céticas, como a do filósofo inglês John Gray.
“De qualquer forma”, escreve ele, “apenas alguém milagrosamente inocente em relação à História poderia acreditar que a competição entre ideias possa resultar no triunfo da verdade. Certamente, as ideias competem umas com as outras, mas os vencedores são aqueles que têm o poder e a loucura humana ao seu lado”.
Renan disse também, ao microfone, que a burrice humana era infinita. Na verdade, repetia o final de um famosa frase de Albert Einstein, para quem o universo e a estupidez humana eram infinitos. Alguns cientistas ainda pesquisam se o universo é mesmo infinito. Mas a parte final da frase sobre a estupidez humana nunca foi contestada. Refletindo sobre isso em Brasília, no corre-corre do trabalho cotidiano, constatei que também a esperteza humana é infinita. Renan e a bancada do PMDB fatiaram a Constituição: condenaram Dilma por irresponsabilidade fiscal e mantiveram seus direitos políticos. Não me parece que fizeram isso por Dilma. No fundo, é também uma manobra defensiva, prevendo o próprio futuro. Quando Romero Jucá disse que era preciso estancar a Lava-Jato, não estava brincando. O objetivo da cúpula do PMDB é o de bloquear investigações e neutralizar o trabalho das instituições que combatem a corrupção no Brasil.
Nessa empreitada, contam com o deslumbramento de Temer, para quem um pedaço do mandato presidencial é um presente dos céus. E com a timidez dos tucanos, que temem romper uma aliança num momento de reconstrução. O sonho das raposas é continuar depenando o galinheiro. Se as pessoas não se derem conta, elas liquidam os avanços das instituições de controle e continuarão roubando o país até o último centavo. Se o quadro é tão ameaçador, não teria sido melhor manter o mandato do PT até 2018?
Acontece que são forças com objetivos diferentes. As raposas do PMDB querem apenas enriquecer em paz. O PT tinha um projeto hegemônico que passava pelo crescente controle do Parlamento, dos juízes e, também, se tudo desse certo, da própria imprensa. Com sua vasta experiência política, as raposas recebem as críticas, lamentando apenas que estamos sendo injustos com elas. O PT seguia arruinando o país mas recebia as críticas com uma agressiva tática de defesa. Questionar a corrupção oficial era coisa da elite, da burguesia, de gente loura de olhos azuis que não aceita que o filho da lavadeira estude Medicina nem que os pobres viajem ao seu lado nos aviões.
A mudança no discurso oficial é insidiosa, sedutora. Cúmplice de toda a política que arruinou o país, num misto de incompetência e corrupção, o PMDB se dispõe a conduzi-lo a um porto seguro.
O lugar para onde as raposas sonham em nos conduzir é um oásis ameno, onde possam continuar enriquecendo, posando, ao mesmo tempo, de estimados líderes nacionais.
Assim como setores da esquerda toleram a corrupção sob o argumento de que a vida do povo melhorou, os liberais tendem a olhá-la com complacência desde que se façam as reformas sonhadas pelo mercado. Num livro sobre a tolerância na idade moderna, Wendy Brown lembra aos estudiosos que ela é uma descendente da superação das sangrentas guerras que separaram política e religião. Modernamente, existe um espaço maior para o indivíduo, diante do Estado e da Igreja. Mas existe também um certo cansaço diante das tramas políticas, uma vontade de se concentrar apenas na sua própria vida. O novo governo traz um perigo de natureza diferente. Ele não quer transformar o país num paraíso bolivariano. Nem se meter na liberdade individual, classificando as pessoas como reacionárias, progressistas ou preconceituosas. Quando Renan disse que a estupidez humana era infinita, concordei com ele pela primeira vez. Se estivesse no plenário, apenas acrescentaria: a malandragem humana também. O país apenas se livrou de um tipo de exploração. Por falar em tortura, tema que Dilma trouxe à tona, não se pode esquecer que uma boa equipe é sempre dividida entre os bons e os maus torturadores. Uns mordem, outros sopram.

Impeachment: Lewandowski praticara crime de responsabilidade? Como o STF enfrentará a nulidade articulada pelo Presidente do Supremo?



A decisão do ministro Lewandowski de induzir parcela dos senadores a prática de atos eivados da pecha de inconstitucionalidade, aprovando destaque tingido por incandescentes tintas inconstitucionais que atentam contra higidez da fase de julgamento do processo de impedimento, formatando nulidade arguível perante o STF com o fulcro de causar insegurança jurídica e política ao processo de impeachment, merece novas considerações, que somar-se-ão às já articuladas por nós e que disponibilizamos na sequência:
Resta clarividente que seu papel de articulador político extrapolou em muito as atribuições constitucionais do Presidente do Supremo Tribunal Federal, mas sua indução à erro de cognição de parcela dos senadores que funcionavam como julgadores, trabalhando claramente ao lado da defesa da impichada, deve ser responsabilizada?
Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
(...)
Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis. (grifos nossos)

Somaram-se 61 senadores concluíram que a petista cometeu crime de responsabilidade ao atrasar repasses aos bancos estatais, na prática conhecida como pedaladas fiscais, e ao assinar decretos autorizando a abertura de créditos suplementares sem a autorização do Congresso.
Inobstante condenada, Dilma não restou inabilitada para o exercício de funções públicas por oito anos nos plasmados termos constitucionais, tergiversou o excelso ministro Lewandowski com a Constituição. 42 senadores votaram por este impedimento, 36, contra, e houve três abstenções nesta parcial fatiada. Assim, não houve os dois terços necessários para a imposição dessa pena.
Nos termos do art. 52, parágrafo único, nos casos de julgamento do presidente da República nos crimes de responsabilidade, o Senado se limita a condenar ou não à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública. O Senado não poderia ter interpretado a Constituição e criado regra diversa daquela que expressamente diz otexto constitucional.
Que, como sempre defendemos, o STF não realize mais uma interpretação criativa, mas se atenha aos termos Constitucionais, que não são imutáveis vale dizer, bastando que se utilize dos meios constitucionais dispostos para alterações das normas constitucionais, que se faça por meio de uma competente PEC (proposta de emenda constitucional) em respeito aos princípios Republicano, da Bicameralidade, do Quorum Qualificado e da Separação dos Poderes.
Violou ainda o princípio da isonomia, não custando lembrar, que o processo de impedimento sofrido pelo ex-presidente Fernando Collor em 1993, quando ao julgar um Mandado de Segurança do ex-presidente, o STF decidiu que a condenação à perda do mandato é indissociável da inabilitação.
Realização do julgamento, em votação nominal, pelos Senadores desimpedidos, que responderão SIM ou NÃO à seguinte pergunta formulada pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal: “Cometeu o acusado FERNANDO COLLOR DE MELLO os crimes que lhe são imputados, e deve ser ele condenado à perda do seu cargo e à inabilitação temporária, por oito anos, para o desempenho de qualquer outra função pública, eletiva ou de nomeação?” (CF, art. 52parágrafo único; Lei nº1.079/50, art. 68)”. Uma pergunta, portanto. Não duas perguntas, como ocorreu com a ex-presidente impichada.
Já colacionamos em nosso artigo precedente, porém nada nos custa reprisar:
MS 21689/DF em que o STF em 1993 firmou precedente:
(...)
No sistema do direito anterior a Lei 1.079, de 1950, isto é, no sistema das Leis n. S 27 e 30, de 1892, era possível a aplicação tão somente da pena de perda do cargo, podendo esta ser agravada com a pena de inabilitação para exercer qualquer outro cargo (Constituição Federal de 1891, art. 33, par.3; Lei n. 30, de 1892, art. 2.), emprestando-se a pena de inabilitação o caráter de pena acessória (Lei n. 27, de 1892, artigos 23 e 24). No sistema atual, da Lei 1.079, de 1950, não e possível a aplicação da pena de perda do cargo, apenas, nem a pena de inabilitação assume caráter de acessoriedade (C. F., 1934, art. 58, par.7; C. F., 1946, art. 62, par.3. C. F., 1967, art. 44, parag. Único; EC n. 1/69, art. 42, parágrafo único; C. F., 1988, art. 52, parag. Único. Lei n. 1.079, de 1950, artigos 2., 31, 33e 34).
Este julgamento, entretanto, foi marcado por um empate de quatro votos contra quatro. Três ministros não participaram do julgamento. Sydney Sanches estava impedido de participar do julgamento por ter presidido o impeachment do presidente Fernando Collor. E os ministros Francisco Rezek e Marco Aurélio declararam-se suspeitos de participar do julgamento. Três ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) foram convocados para desempatar o julgamento. Com o votos dos três, o Supremo decidiu que a perda do cargo leva à inabilitação para o exercício de uma função pública.
“Portanto, a material era controvertida, no Supremo Tribunal Federal, foi desempatada com três magistrados estranhos ao corpo permanente do Supremo Tribunal Federal, que acabou desempatando”, prosseguiu. “Então a dúvida é saber – não quero me manifestar, eu tenho opinião sobre isso, se for instado a emiti-la, o farei no Supremo Tribunal Federal –, a questão é saber se esse julgamento do Mandado de Segurança nº 21.689 é um julgamento paradigmático, se pode ou não ser utilizado como referência, tendo em conta o empate havido e a inclusão de três membros estranhos à Suprema Corte. Portanto, vejam V. Exªs que a matéria não é pacífica”, firmou.
Lewandowski admitiu o destaque feito pela senadora Kátia Abreu para que o Senado decidisse em duas votações distintas a pena de perda do cargo e a inabilitação para função. Por 61 votos a 20, o Senado condenou Dilma Rousseff pelo crime de responsabilidade. Mas por 42 votos contra 36 – e 3 abstenções – os senadores decidiram não aplicar a pena de inabilitação para o exercício da função pública.
Lewandowski ao admitir o destaque que revela-se de indecente inconstitucionalidade esquarteja o art. 52, parágrafo único referido, que veio vilipendiar ainda duas decisões do Supremo sobre o tema, conferindo nitidamente tratamento processual e sancionador diferente aos impedimentos de Collor (mais rigoroso) e Dilma.
Passamos então a estudar, pesquisar e colher informações, de como teriam se sucedido os fatos em tela nos bastidores do processo de impedimento.
O tema foi ventilado pela primeira vez numa reunião de líderes que segundo informações foi realizada no dia 17 de agosto. Estavam presentes o presidente do STF Ricardo Lewandowski, o presidente do Senado Federal Renan Calheiros e senadores contra e a favor do impedimento.
O senador Lindbergh Farias perguntara se o próprio ministro Lewandowski poderia dividir o quesito do julgamento a ser votado no plenário. Propôs que o ministro separasse perguntas sobre os crimes cometidos por Dilma e suas consequências, como a inabilitação para função pública. Lewandowski teria lido trecho da Constituição que reúne os temas num só item – afirmando a inviabilidade da aceitação da proposta.
A possibilidade foi rediscutida cinco dias depois, em 22 de agosto, quando a senadora Kátia Abreu, em visita ao presidente do STF, questionou-o sobre o tema. Na mesma hora, Lewandowski telefonou a assessores, e sua equipe passou a se debruçar sobre o assunto.
Art. 39. São crimes de responsabilidade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal:
1- altera, por qualquer forma, exceto por via de recurso, a decisão ou voto já proferido em sessão do Tribunal;
2 - proferir julgamento, quando, por lei, seja suspeito na causa;
3 - exercer atividade político-partidária;
4 - ser patentemente desidioso no cumprimento dos deveres do cargo;
5 - proceder de modo incompatível com a honra dignidade e decôro de suas funções.
Em nossa perspectiva de cognição o presidente do STF Ricardo Lewandowski induziu, organizou, liderou, em combinação (optamos por eufemismo não utilizarmos do vocábulo “conluio”) com o presidente do Senado Renan Calheiros e senadores combatentes da causa de Dilma, boa parcela dos Senadores à erro de cognição ao aceitar um destaque que sabia da existência e de sua inconstitucionalidade alegando que a não aceitação poderia dar azo à futuras ações no Supremo Tribunal Federal por parte da defesa de Dilma Rousseff, e por isso aceitaria os destaque e fatiaria a votação para perda do cargo da votação quanto a inabilidade.
Em verdade Lewandowski permitiu o contrário, que no procedimento de impedimento se descumprisse o texto constitucional de forma aberrante e que se proferisse uma condenação teratológica a presidente Dilma Rousseff, quando foi condenada pelos crimes de responsabilidade perpetrados e a ela foi aplicada apenas parcela da sanção prevista. Permitiu-se uma condenação de perda do cargo sem que restasse inabilitada para o exercício de função pública na forma do mandamusconstitucional.
ratio decidendi quis firmar que a presidente Dilma praticou crimes de responsabilidade, por isso foi impichada, mas está habilitada para candidatar-se nas próximas eleições que desejar, ser nomeada Ministra de Estado, enfim, apta ao exercício da qualquer cargo público.
Por permitir, ou melhor, induzir a contaminação do processo de impedimento de Dilma com dolo com o evidente fito de judicializá-lo no STF ao abrir espaço para nulidade, o ministro Ricardo Lewandowski teria à nosso sentir agido na forma dos itens 4 e 5 do art. 39 da Lei do Crime de Responsabilidade – Lei 1079/50.
Finalizamos assentando, que com proteção da clareza meridiana do melhor direito não poderá o STF provocado eximir-se de seu dever maior de tutelar a Constituição, quando por absoluta consciência nutrimos que a decisão que tomou o ministro Lewandowski no tocante a votação em separado quanto a inabilitação para o exercício de cargos públicos revela-se absolutamente nula, pois possui uma única hermenêutica possível a partir de uma leitura que não se revele criativa.
Assim também não há de se falar em nulidade de todo julgamento presidido por Lewandowski, mas nos lindes do princípio do Aproveitamento dos Atos Processuais nulo será apenas o que se revelou acoimado pela inconstitucionalidade: a votação que permitiu que Dilma esteja habilitada para o exercício de cargos públicos.
Não há que se imaginar interpretação diversa, já que a votação que condenou a impichada pela pratica dos crimes de responsabilidade e consequentemente à perda do cargo correu nos termos constitucionais, decidida com ampla margem do percentual mínimo exigido de maioria absoluta, não sendo admissível por tocar ao mérito (crime de responsabilidade) intervenção do Supremo Tribunal Federal.
Deve assim apenas a partir da votação condenatória primeira que decretou o impedimento aplicar os seus efeitos constitucionais – perda do mandato e inabilitação para o exercício de função pública por 8 anos, e assim assegurar que o art. 52parágrafo único da Constituição de 1988 cumpra sua finalidade em respeito ao legislador constituinte. Imperioso que o Supremo Tribunal Federal decida atento ao princípio da Segurança Jurídica.
Esperamos por último, não nos depararmos com uma Constituição Federalescrita por minúsculas letras – cf –, mas sim que sua força normativa reste restabelecida na seara do princípio da Supremacia da Constituição. Esperamos do Supremo Tribunal Federal bem menos política e bem mais direito!
Leonardo Sarmento, Professor de Direito do Ensino Superior
Professor constitucionalista
Professor constitucionalista, consultor jurídico, palestrante, parecerista, colunista do jornal Brasil 247 e de diversas revistas e portais jurídicos. Pós graduado em Direito Público, Processual Civil, Empresarial e com MBA em Direito e Processo do Trabalho pela FGV. Autor de 3 obras jurídicas e algumas centenas de artigos publicados. Nossa última obra (2015) de mais de 1000 páginas intitulada "Controle de Constitucionalidades e Temáticas Afins", Lumen Juris.

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