"Não é possível acreditar que ele, sozinho, teria comprometido o PT com uma dívida da ordem de R$ 55 milhões e repassado metade disso aos partidos da base aliada. Seria necessário concluir que ele teria uma mente privilegiada, por ter realizado tudo sozinho e sem o conhecimento de mais ninguém, inclusive os envolvidos nas negociações políticas. Então concluo, com base em todos esses elementos, pela responsabilidade de José Dirceu nos repasses financeiros aos parlamentares, devendo responder por nove crimes de corrupção ativa, um para cada partido corrompido", justificou a ministra.
Ao contrário do revisor, Ricardo Lewandowski, que em seu voto desconstruiu o depoimento do ex-deputadoRoberto Jefferson, Rosa Weber consumiu boa parte de sua explanação para reafirmar as acusações do delator do mensalão. Para a ministra, tudo o que Jefferson revelou foi provado nos autos, não sendo justificável dizer que, apenas por seu inimigo de Dirceu, o ex-deputado tivesse criado uma história com riqueza de detalhes que, posteriormente, foram comprovados.
"Ficou evidente que o PT costumava alcançar dinheiro a outros partidos, entregando-o a parlamentares. Fez isso para obter apoio político no parlamento. Foi criado um esquema para pagar deputados federais em troca de seu apoio no Congresso Nacional. A minha convicção é essa. E não posso deixar de votar, não posso deitar a minha cabeça no travesseiro e dizer 'não vi'", disse.
Rosa também criticou a postura adotada por Lewandowski, que argumentou em plenário que os outrosministros teriam acabado com a necessidade do ato de ofício para condenar alguém por corrupção. Segundo a ministra, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) concordou que houve desvio de dinheiro público, que empréstimos fraudulentos foram firmados para que o dinheiro ilícito ganhasse ares de legalidade e que esse dinheiro serviu para comprar apoio político de deputados. O ato de ofício, ainda de acordo com Rosa Weber, estaria em todos os pontos dessa relação entre corruptores e corrompidos.
"A lógica autorizada pelo senso comum faz cumprir que, dependendo da espécie de criminalidade, a consumação sempre se dá fora do sistema de vigilância. Foi indicado, sim, o ato de oficio, configurado na compra de votos no Congresso Nacional. Houve um conluio para a compra de votos e apoio para votações a favor do governo. Esse dinheiro veio de recursos, pelo menos em parte públicos. Os parlamentares receberam o dinheiro ilicitamente, de forma contrária os pagamentos não teriam sido feito às escondidas", afirmou a ministra.
Após condenar Dirceu, Rosa, em tom emocional, fez uma espécie de desagravo histórico a José Genoino por sua luta contra a ditadura militar. A ministra lembrou a sustentação oral feita pelo advogado de Genoino, Luiz Fernando Pacheco, "que por sua história mereceu tudo que de bom foi dito sobre ele". Contudo, logo em seguida afirmou que também condenaria o ex-presidente do PT, assim como condenou Delúbio.
Rosa Weber também votou pela condenação de Marcos Valério, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach, Rogério Tolentino e Simone Vasconcelos. A ministra, no entanto, absolveu a ex-gerente financeira da SMP&B Geiza Dias e o ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto.
O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.
Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e do irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.
A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão. Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.
by G1