quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

Caso deveria ter sido federalizado o quanto antes', diz Raquel Dodge sobre assassinato de Marielle e indícios sobre Brazão

 Ex-procuradora-geral da República, à frente do cargo na época do assassinato da vereadora, diz que novas suspeitas sobre Domingos Brazão não a surpreenderam
Por Mariana Muniz O GLOBO — Rio de Janeiro

02/10/2023 04h01 Atualizado há 3 meses

A ex-procuradora Geral da República Raquel Dodge, durante evento em agosto de 2019 — Foto: José Cruz/Agência Brasil

As novas suspeitas contra o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) Domingos Brazão não surpreenderam a ex-procuradora-geral da República Raquel Dodge, que ocupava o posto na época do assassinato da vereadora Marielle Franco, em março de 2018. Neste domingo, a coluna de Bernardo Mello Franco mostrou que o inquérito que apura o assassinato da vereadora e do motorista Anderson Gomes saiu do Rio de Janeiro e foi enviado ao STJ diante do surgimento de novas suspeitas sobre Brazão.

Ao GLOBO, a subprocuradora-geral da República, que denunciou Brazão ao STJ em 2019 por tentativa de embaraçar as investigações no caso Marielle, afirma que já naquela época havia indícios da participação do conselheiro do TCE-RJ no crime contra a vereadora.

— Naquela época já havia indícios de que ele (Brazão) participara do crime em si. E eu suspeito que agora é o que está voltando ao STJ — afirma.

De acordo com Dodge, com esse fato novo, o STJ irá, ao lado da Procuradoria-Geral da República (PGR), analisar os elementos apresentados para saber se, de fato, o caso deverá permanecer sob a competência da Corte.

Segundo o colunista Bernardo Mello Franco, Brazão voltou à mira da Justiça após a delação premiada do ex-PM Élcio Queiroz. Num trecho que já veio a público, ele confessou ter dirigido o carro usado no ataque e confirmou que Ronnie Lessa foi o autor dos disparos.

A Constituição Federal estipula que membros dos tribunais de contas dos estados sejam processados pelo STJ. Mas o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) determina que essa prerrogativa deve valer apenas quando os eventuais crimes tiverem sido cometidos no exercício do cargo. Por isso é que o tribunal irá decidir, ainda, se o caso deverá seguir sob a sua tutela — ou se deverá seguir para a primeira instância, como ocorreu com a denúncia apresentada por Dodge.

Em 21 de março deste ano, após o caso sair do STJ, a Justiça do Rio de Janeiro rejeitou a denúncia contra o conselheiro do Tribunal de Contas pelo crime de obstrução de Justiça na investigação das mortes da vereadora e do motorista. A decisão foi do juiz Andre Ricardo de Franciscis Ramos, da 28ª Vara Criminal.

— Quando estive à frente da PGR, tomei duas providências em relação ao caso Marielle: uma em decorrência de competência por prerrogativa de função, no caso do conselheiro do TCE, e outra em razão da federalização, por meio do incidente de deslocamento de competência. Na ocasião, a minha compreensão era a de que o sistema de Justiça do Rio de Janeiro não estava conseguindo processar e julgar o caso e, por isso, a federalização, ou seja, a ida para a Justiça Federal, era o melhor caminho — aponta.

A solicitação de Dodge, para a federalização, no entanto, foi negada pela Terceira Seção do STJ em maio de 2020. Na época, a relatora do caso, ministra Laurita Vaz, defendeu a manutenção do caso sob a competência da Justiça estadual, da Polícia Civil e do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ). Para ela, não era possível verificar “desídia” ou “desinteresse” por parte das autoridades estaduais nas investigações para solucionar o crime.

Quando o crime completou cinco anos, em março deste ano, o ministro da Justiça, Flávio Dino, anunciou a entrada da Polícia Federal nas investigações sobre o assassinato de Marielle e Anderson. A medida, no entanto, não configura formalmente a federalização, mas sim, segundo esclarece a ex-PGR, uma competência natural da PF para atuar em casos de repercussão nacional, mesmo que em se tratando de um crime “estadual”. A disposição está no artigo 144 da Constituição.

Passados cinco anos do crime ainda sem respostas, a subprocuradora-geral segue entendendo que a federalização da investigação sobre o assassinato de Marielle e Anderson teria sido a melhor solução.

— Minha avaliação segue a argumentação que defendi no incidente de deslocamento de competência perante o STJ. Esse caso deveria ter sido federalizado quanto antes. A federalização era a melhor saída para esse caso e a evidência era muito simples. Toda às vezes que comissionamos à Polícia Federal para atuar, o caso avançou — disse.

Dodge relata que enquanto esteve à frente da PGR enfrentou diversos obstáculos para obter acesso à investigação do caso Marielle e Anderson, mesmo tendo sido ela a requisitar os inquéritos. Após cinco anos dos assassinatos, e ainda sem uma conclusão sobre quem mandou matar a vereadora, a ex-PGR se diz “pessoalmente muito frustrada”.

— Eu pessoalmente fico muito frustrada. O crime contra Marielle foi e é um crime contra a democracia. Não assassinaram uma vereadora qualquer, ela era uma mulher que tinha uma pauta muto clara e eu mandei imediatamente preparar a portaria da federalização por isso. Minha ida ao Rio (no dia seguinte ao crime), como PGR, sinalizou muito claramente a importância do caso — relata.

O pedido de federalização do caso Marielle feito por Dodge ocorreu às vésperas do final de seu mandato à frente da PGR, em 2019. Segundo a subprocuradora, em razão das inúmeras dificuldades de acesso que ela teve aos documentos, o que incluiu uma fraude via Correios.

— Não se pode assassinar deputados, parlamentares e ao assassinar Marielle estavam assassinando e calando uma parte da população. Naquele dia percebi ser disso que se tratava. Não ver esse crime esclarecido, para mim, é uma evidência de que as forças que operam tudo isso estão prevalecendo — afirma.

Citado no relatório da CPI das Milícias, Brazão é chefe de um clã que inclui o deputado federal Chiquinho Brazão, o deputado estadual Manoel Brazão e o vereador Waldir Brazão, um agregado que adotou o sobrenome para fins eleitorais.

Eleita vereadora do Rio de Janeiro pelo PSOL em 2016, com 46 mil votos (a quinta candidata mais bem votada do município), Marielle Franco teve o mandato interrompido por 13 tiros na noite de 14 de março de 2018, num atentado que vitimou também seu motorista Anderson Gomes

terça-feira, 9 de janeiro de 2024

Tríade obscura: narcisismo, maquiavelismo e psicopatia


Aqueles que não têm a capacidade de se conectar com os outros ou têm a capacidade de se desconectar deliberadamente das suas emoções podem fazer parte dessa tríade obscura. Existe um conjunto de características de personalidade que definem o narcisismo, o maquiavelismo e a psicopatia.

Nos casos mais extremos, os indivíduos que compartilham as características dessa tríade chegam a se transformar em criminosos ou se perdem no amplo espectro das doenças mentais. No entanto, também há aqueles que não cumprem os critérios para um diagnóstico psiquiátrico e convivem diariamente conosco.

As pessoas que apresentam esses traços e formas de comportamento são chamadas de personalidades obscuras por causa das suas tendências insensíveis, egoístas e malévolas nos seus relacionamentos com os outros. Delroy Paulhus e Kevin-Williams, psicólogos da Universidade da Colúmbia Britânica, foram os responsáveis ​​por batizar como tríade obscura a parte mais negativa das relações humanas.


O narcisismo

“Tudo é permitido para mim” ou “Os outros só existem para me adorar”, são exemplos típicos de pensamentos dominados pelo narcisismo. São pessoas egoístas, com um sentido de direito egocêntrico e uma autoimagem positiva, embora pouco realistas se considerarmos a opinião das pessoas ao seu redor.

Os narcisistas são “encantadores de serpentes”. No início são muito queridos para os outros, seus comportamentos são agradáveis ​​e atraentes, mas com o passar do tempo, podem se tornar muito perigosos. Eles podem até, sem querer, mostrar quais são as suas verdadeiras intenções: obter mais admiração e poder.

Eles geralmente ficam entediados com a rotina, por isso procuram desafios difíceis. A maioria dos narcisistas procura uma posição de liderança, advocacia ou qualquer outra profissão que envolva altos níveis de estresse. De acordo com o psicanalista Michael Maccoby, o narcisismo é um distúrbio cada vez mais frequente nos níveis superiores do mundo empresarial e está diretamente relacionado com a competição, ao salário e o glamour.

Um dos seus pontos fortes é a grande capacidade de convencimento que possuem. Graças a isso, eles se cercam de um grande número de seguidores, são capazes de convencer sem fazer nenhum esforço. Em suma, conseguem sempre o que eles se propõem. Além disso, como não são empáticos, não são escrupulosos com os meios e as estratégias que utilizam para alcançar os seus objetivos.

O interesse e a preocupação dos narcisistas com os outros é zero, apesar da sua grande teatralidade. Eles não sentem remorso e são impassíveis às necessidades e sentimentos das pessoas ao seu redor.

Agora, o seu calcanhar de Aquiles é a sua autoestima. Os narcisistas, muitas vezes, têm uma autoestima muito baixa, que é acompanhada de uma vulnerabilidade interna e uma certa instabilidade. Por isso, geralmente procuram se relacionar com pessoas que consideram inferiores para exercerem o seu domínio e se sentirem poderosos.

O maquiavelismo

Para os “maquiavélicos”, o fim justifica os meios, independentemente das consequências que possam surgir. Geralmente são pessoas muito calculistas e frias, destruindo qualquer tipo de conexão emocional verdadeira com os outros. Embora possuam traços em comum com os narcisistas, como o egoísmo e o uso dos outros, há uma característica que os diferencia: são realistas nas percepções e estimativas que fazem das suas habilidades e dos relacionamentos que mantêm.

Os “maquiavélicos” não tentam impressionar ninguém, pelo contrário. Eles se mostram como são e preferem ver as coisas claramente, porque dessa maneira podem manipular melhor o outro. Na verdade, eles se concentram nas emoções das pessoas que querem manipular para obter o que querem. Se conhecerem os seus sentimentos, será mais fácil escolher a melhor estratégia para manipulá-lo.

De acordo com o psicólogo Daniel Goleman, as pessoas com características maquiavélicas podem ter uma menor empatia com os outros. A sua frieza parece derivar de uma falta no processamento tanto das próprias emoções quanto das dos outros.

Na verdade, para eles as emoções são tão desconcertantes que, quando sentem ansiedade, geralmente não sabem diferenciar se estão tristes, cansados ou simplesmente não estão se sentindo bem. No entanto, possuem uma grande capacidade de perceber o que os outros pensam. Mas, como diz Goleman, “mesmo que a sua cabeça saiba o que fazer, o seu coração não tem a menor ideia”.


A psicopatia, a personalidade mais perigosa da tríade obscura

Os psicopatas consideram as outras pessoas como objetos com os quais podem jogar e usar de acordo com a sua vontade. No entanto, ao contrário das outras personalidades da tríade obscura, quase nunca experimentam ansiedade e até mesmo parecem ignorar o que significa sentir medo.

A frieza do psicopata é extrema, por isso pode tornar-se muito mais perigoso do que as outras personalidades da tríade obscura.

Como não sentem medo, podem permanecer serenos mesmo em situações emocionalmente intensas, perigosas e aterrorizantes. Eles não se importam com as consequências das suas ações e são os melhores candidatos para se tornarem presidiários.
Os circuitos neuronais desse tipo de pessoas dessensibilizam o segmento do espectro emocional associado ao sofrimento. Por isso, a sua crueldade parece insensibilidade porque eles não conseguem detectá-lo. Além disso, o remorso e a vergonha não existem para eles.

No entanto, os psicopatas têm algumas facilidades para “se colocar no lugar do outro” e, assim, pressionar os botões apropriados para alcançar o seu objetivo. Eles são muito persuasivos. No entanto, esse tipo de pessoas, apesar de se destacarem na cognição social, caracterizam-se pela compreensão das relações e do comportamento dos outros apenas a partir de uma perspectiva lógica ou intelectual.


Como vemos, parece que o lado negro praticado pelos Sith em Star Wars não é tão irreal quanto pensávamos. A presença desta tríade obscura nos relacionamentos íntimos leva a maus-tratos através da violência psicológica. São personalidades tóxicas que estabelecem círculos de poder, controle, hostilidade e aprisionam mentalmente as suas vítimas.

A chave para não cair nas suas redes é trabalhar a nossa independência emocional. É preciso saber estabelecer limites claros nos nossos relacionamentos e não permitir que ninguém os ultrapasse. Sem dúvida, nos protegermos deve ser a nossa prioridade em todos os tipos de relacionamentos.

quarta-feira, 4 de outubro de 2023

Oito anos depois, Justiça torna réus funcionários de escola de SP após morte de aluna em excursão

Eles vão ser julgados por abandono de incapaz. Exames apontaram que Victoria Mafra Natalini morreu por 'asfixia mecânica, na modalidade de sufocação direta'. MP e Justiça entenderam que dois professores e três gestores fizeram a atividade com baixo número de monitores.

Por Carlos Henrique Dias, Valmir Salaro, g1 SP e Fantástico

26/09/2023 05h03 Atualizado há uma semana


Victoria Natalini foi encontrada morta no dia 17 de setembro de 2015: causa da morte foi asfixia — Foto: Reprodução / Facebook

A Justiça tornou réus dois professores e três gestores da escola Waldorf Rudofl Steiner, de São Paulo, por abandono de incapaz no caso da estudante Victoria Mafra Natalini, que desapareceu e foi encontrada morta durante uma excursão escolar em uma fazenda em Itatiba, no interior do estado.

Em 14 de setembro deste ano, o promotor ofereceu a denúncia contra os funcionários da escola. No mesmo dia, o juiz Ezaú Messias dos Santos, do Foro de Itatiba, considerou a acusação plausível para torná-los réus. O processo será digitalizado e as audiências, marcadas.

O juiz também arquivou o inquérito policial com relação ao crime de homicídio sem a identificação do autor da morte. O procedimento poderá ser reaberto se surgirem novas informações.

Em 10 de julho de 2023, o DHPP tinha indiciado os dois professores que estavam com os alunos, na época. A polícia entendeu que eles foram omissos com as obrigações e uma suposta negligência levou a estudante à morte.

O delegado Nilson Lucas Júnior tinha determinado o indiciamento por abandono de incapaz com resultado morte, com pena que varia entre quatro e doze anos de reclusão, se houver condenação.


Em nota, a escola informou que "reitera que segue comprometida em contribuir com as autoridades e a justiça desde o primeiro dia das investigações. A escola lamenta profundamente o falecimento da aluna Victoria Natalini e se mantém solidária aos seus familiares e colegas".

E complementa: "A instituição de ensino também reforça que todos os procedimentos de segurança necessários foram adotados durante a viagem de estudo do meio e que, após a constatação da ausência de Victoria, as autoridades competentes foram contatadas. Esclarece, ainda, que em todas as atividades pedagógicas desenvolvidas – sejam na escola ou em ambiente externo - disponibiliza equipes de profissionais capacitados para acompanhamento de seus alunos".

O g1 tenta contato com a defesa da fazenda.

Relembre o caso

Fazenda em Itatiba, no interior de São Paulo — Foto: Reprodução/TV Globo

Em 2015, a Victoria e mais cerca de 30 alunos faziam trabalho extracurricular na Fazenda Pereiras, na Rodovia Engenheiro Constância Cinta, em Itatiba, no interior de São Paulo, entre os dias 11 e 18 de setembro.

Antes de desaparecer, a estudante afirmou que iria ao banheiro e teria sido permitida a ida sozinha.

“Ocorre, que, no trajeto, por motivos ainda não esclarecidos, a vítima veio a óbito, tendo o seu corpo sido abandonado em meio a um matagal, em local totalmente ermo”, escreveu o promotor.

Segundo a denúncia, os professores continuaram nas atividades e não foram apurar onde estava a vítima. “Ninguém percebeu a ausência de Victória por horas”, detalhou. Ela foi achada sem vida, depois de uma força-tarefa na região.

O entendimento de abandono de incapaz ocorreu porque, para o promotor, o gestor-executivo, uma gestora pedagógica e a coordenadora do ensino médio permitiram a excursão com baixo número de professores e monitores para o acompanhamento de alunos.

O que apontam os laudos


Local onde seria o banheiro e onde o corpo foi encontrado em Itatiba — Foto: Reprodução/TV Globo

À época do caso, o laudo do Instituto Médico Legal (IML) de Jundiaí apontou morte por causa indeterminada. Segundo o pai dela, João Carlos Siqueira Natalini, a menina era saudável.

Os exames indicaram que Victória não tinha usado drogas nem tomado bebida alcoólica. Ela também não apresentava sinais de violência sexual.

O pai de Victória chegou a contratar peritos particulares para analisar o caso. A conclusão deles foi que a estudante realmente foi assassinada e que o criminoso carregou o corpo da menina até o local.

Com isso, o novo laudo do Centro de Perícias da Secretaria da Segurança Pública de São Paulo apontou que aluna poderia ter sido assassinada. A reviravolta do caso foi revelada pelo Fantástico.

O documento foi um pedido feito Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa de São Paulo (DHPP), que assumiu o caso em março de 2016. Os novos exames concluíram que Victoria morreu por "asfixia mecânica, na modalidade de sufocação direta".

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