quarta-feira, 13 de julho de 2016

“O xadrez é um jogo para a vida”


Jogador e professor, Daniel Brandão mostra que o xadrez oferece muito mais que pontos e troféus

Por Liziane Nathália Vicenzi


Tabuleiro da Vida – Nem mesmo a “Arte da Guerra”, de Sun Tzu seria capaz de explicar todos os passos para vencer uma partida de xadrez. Porém, pode ilustrar o quanto as artes marciais se aproximam do xadrez, e o quanto algumas determinações se encaixam na vida de algumas pessoas. Entre os preceitos, a disciplina e a interpretação de que as coisas são mais do que parecem ser, que transcendem o físico, o estático, para um universo artístico e infinito. Pessoas que veem o xadrez não somente como um jogo, mas como uma possibilidade de evolução pessoal.

Para iniciar esta guerra, não no sentido de luta, mas de aprendizado e descobertas, apresentamos Daniel Brandão Mariani, de 25 anos. Personagem de uma história em que o xadrez é o protagonista. Daniel começou a jogar xadrez na escola, observando a irmã dele jogar com as amigas. Nesta época tinha oito anos, e começou a jogar mesmo com apenas 15. A primeira experiência de Daniel foi em Matinhos – PR. Depois de jogar algumas partidas e perder “fácil”, decidiu que iria treinar, de forma engajada. Depois de três meses descobriu que existiam livros, torneios e softwares e que podia se dedicar muito mais ao esporte. “A verdade é que inicialmente eu só queria vencer. Depois passou a ter um caráter mais artístico. Comecei a querer entender o xadrez mais profundamente, independente de resultados”, explica.


Como na vida, encontros e desencontros são inevitáveis, Daniel estava prestes a conhecer outras coisas que o xadrez pode proporcionar –  como pessoas marcantes para toda a vida. Em um torneio de Joguinhos Abertos (competição estadual de até 19 anos), Daniel conheceu Amanda Paul Dull, (20).  Logo começaram a namorar, e depois decidiram morar juntos. Para Daniel, o xadrez foi o protagonista que os uniu. “Temos várias outras coisas em comum e outras atividades também, mas posso dizer que o xadrez esteve desde o começo no plano de fundo da nossa relação que acabou produzindo mais um possível enxadrista.” O possível enxadrista da declaração de Daniel é Kim Paul Mariani. O filho do
casal, de apenas três meses.

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.Daniel e o filho Kim Paul Mariani, nos Jogos Abertos de Santa Catarina – Jasc, (Novembro, 2014). Foto: Arquivo Pessoal

Conforme Daniel, a sua rotina hoje é totalmente focada nos tabuleiros: além de fazer parte da equipe de xadrez de Florianópolis (coordenada por Marcelo Pomar), ajuda o Clube de Florianópolis, e escreve para o blog Xadrez do Brasil – uma cobertura e crítica do xadrez brasileiro. Em parceria com o jogador e professor César Umetsubo e Marcelo Pomar desenvolve conteúdo e conduz as operações do Programa de Ensino Enxadrístico (Pense), uma cooperativa de professores que articula ensino-aprendizagem com material e método próprios.

Daniel considera ensinar mais difícil do que jogar.  Para ele, é necessária bastante sabedoria para lidar com as peculiaridades de cada aluno, pedagogia para que a troca com o aluno seja prazerosa e um conhecimento profundo do xadrez, que transcende a simples habilidade para vencer partidas.

Dificuldades batem à porta

Em relação a pensar em desistir do xadrez, Daniel destacou que já pensou nisso várias vezes. Para ele, ao longo de quase nove anos, alguns fracassos já o fizeram considerar parar tudo. Porém, a solução, segundo ele, é ter como foco ir além do ganhar ou perder. “Procuro buscar algum tipo de satisfação artística, como a criação e a superação. São os momentos de profunda concentração, a satisfação por resolver problemas e encontrar respostas, o prazer ao perceber uma maneira nova de ensinar uma velha técnica, que me motivam a continuar independente dos resultados sobre o tabuleiro”, destaca.

No sentindo financeiro, Daniel frisou que é possível viver de xadrez, porém com uma entrega intensa à atividade e desde que ensinando também, não apenas jogando. “Hoje não posso prescindir da bolsa municipal nem deixar de dar aulas particulares ou arbitrar, por exemplo, para apenas jogar. Creio que nem os Grandes Mestres podem ter esse luxo, o que ilustra um pouco da condição do enxadrista no Brasil”, reforça Daniel.

O xadrez vai além de um quadriculado preto e branco
Sobre as pessoas e os aprendizados mais marcantes nestes anos,  Daniel encara como uma “pergunta difícil”. Ele reforça a amizade com a Amanda, Pomar e Umetsubo. “Creio que essas foram às pessoas mais presentes e influentes na minha vida enxadrística, mas o xadrez também me presenteou com outras pessoas muito queridas. Os aprendizados não caberiam aqui, mas posso mencionar um dos principais, do qual vertem todos os outros ‘não há vitória sem luta’”, destaca.

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Daniel, e a namorada, também enxadrista, Amanda Paul Dull. (Foto: Arquivo Pessoal)
Ainda cabe tempo para explicar que o xadrez transcende o jogo e é encarado como uma verdadeira arte para Daniel. “Parece-me que o xadrez é, em essência, uma luta onde duas vontades opostas se confrontam e apenas uma pode vencer. Consciente disso ou não, o enxadrista tem que desenvolver habilidades e virtudes necessárias para se tornar mais apto a vencer. A própria evolução constitui uma luta também e resulta no grande benefício do xadrez, que é se tornar uma pessoa mais forte para enfrentar desafios e mais apta a tomar decisões”.
E o futuro?
Daniel estuda Economia na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e no momento não pôde continuar o curso, em função do nascimento de Kim. Ele destaca que pretende continuar a graduação, mas que atualmente a atividade principal é o xadrez e os planos implicam num envolvimento cada vez mais vigoroso com a atividade.
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Daniel disputa simultânea de xadrez (jogar ao mesmo tempo com vários adversários) em momento de descontração no Campeonato Mundial de Xadrez Escolar, em Juiz de Fora- MG


No quesito sonho como jogador, para Daniel o objetivos é ficar mais forte, contribuir para enriquecer o ambiente do xadrez, transmitir a magia do jogo, e ajudar outros competidores na busca por seus objetivos. “Acima de tudo, formar cidadãos capazes de pensar criticamente”, salienta. Em relação ao filho seguir este caminho, Daniel ressalta que “pode ser que ele queira tocar piano, estudar física ou dançar balé”. O professor e jogador explica que a expectativa é que o filho de dedique profundamente e se sinta pleno, independente da atividade que escolher, mesmo que não seja o xadrez.
Em relação aos jogadores que tomaram contato recentemente com o jogo, Daniel define que a vitória vem depois de um longo processo de erros e acertos. “O xadrez é um jogo para a vida. Não existem fórmulas mágicas, atalhos e raramente os resultados surgem em poucos meses. Há um mundo de conhecimento para adquirir, muitas habilidades para se treinar dia após dia e virtudes que só surgem depois de anos de experiências, muitas vezes dolorosas. O que posso dizer, com toda a honestidade, é que o xadrez oferece muito mais que pontos e troféus”, reforça Daniel.
Para finalizar, perguntei ao Brandão, se o xadrez sempre vale a pena. Nesta hora, lembrei que o jornalismo pede imparcialidade. Exige que o repórter não manifeste sua opinião, porém, jornalistas também têm sentimentos e opiniões. Então, se eu puder te dar um conselho, siga esta frase, e jogue ao menos uma partida na vida. “Sem dúvida. Triste é pensar quantas vidas serão vividas sem jamais desfrutar do prazer de uma boa partida”, responde Daniel Brandão.

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