terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Chávez, o rei fantasma


A situação venezuelana se assemelha a uma ópera-bufa, digna de uma república bananeira, o que a Venezuela não é, por mais que setores da oposição achem o contrário.

Começa pela adaptação da Constituição --obra exclusiva do chavismo, é bom lembrar-- às necessidades de turno dos herdeiros do caudilho doente. Achar que o juramento constitucional no dia 10 de janeiro é mero "formalismo" não passa de truque barato.
É cristalino o artigo 231, que reproduzo em espanhol porque é de facílima tradução e para não perder o sabor original: "El candidato elegido o candidata elegida tomará posesión del cargo de Presidente o Presidenta de la República el diez de enero del primer año de su período constitucional, mediante juramento ante la Asamblea Nacional. Si por cualquier motivo sobrevenido el Presidente o Presidenta de la República no pudiese tomar posesión ante la Asamblea Nacional, lo hará ante el Tribunal Supremo de Justicia".
Ou seja, a data é fixa e inamovível. Móvel pode ser apenas o local do juramento. A data é inamovível porque, em países democráticos sérios, a duração do mandato do governante é perfeitamente delimitada. Qualquer outra interpretação é chicana política.
Prorrogar o mandato de Chávez indefinidamente, como estão defendendo o vice-presidente Nicolás Maduro e o presidente da Assembleia, Diosdado Cabello, é transformar Chávez em rei. Reinados são para sempre, até a morte.
Ou, como prefere Antonio Pasquali, em "El País" de ontem: "O chavismo deve ter calculado o risco de uma rápida perda de carisma depois da eventual morte de seu líder e tenta blindá-lo com um salto atrás para a irracionalidade, criando uma atmosfera em que, mesmo morto, Chávez continue sendo o grande totem protetor presente em cada ato político".
Até entendo as razões dos chavistas: você já imaginou o que aconteceria se, no dia 10, Chávez fosse declarado permanentemente incapacitado para exercer o governo, novas eleições fossem convocadas e o eleito empossado, mas, daqui a digamos seis meses, o doente recuperado reaparecesse em Caracas?
O "totem" assombraria o sucessor, qualquer que fosse.
O razoável, portanto, seria declarar Chávez temporariamente incapacitado, o que abriria um período de 90 dias, prorrogáveis por mais 90, para verificar as condições físicas e mentais do presidente, para só então deslanchar o processo sucessório, se fosse o caso.
Hoje por hoje, nem há razões para que o chavismo tema perder a eventual nova eleição. O momento é chavista: duas vitórias eleitorais consecutivas (as presidenciais de outubro e as estaduais do mês passado), crescimento econômico robusto (5,2% no ano passado), desemprego em queda, pobreza idem. Manter tais condições por 180 dias não é missão impossível. Por mais tempo, é entrar no imponderável.
O problema é que os chavistas estão confessando, com suas chicanas constitucionais, que só Chávez tem o "software" da tal "revolução boliviariana". Temem, pois, o salto no vazio.
Clóvis Rossi
Clóvis Rossi é repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha, ganhador dos prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Assina coluna às terças, quintas e domingos no caderno "Mundo". É autor, entre outras obras, de "Enviado Especial: 25 Anos ao Redor do Mundo" e "O Que é Jornalismo". Escreve às terças, quintas e domingos na versão impressa do caderno "Mundo" e às sextas no site.

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